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Eleita entre as melhores do mundo, ela despertou para ciência com brinquedo

Suzana Pereira Nunes - Divulgação
Suzana Pereira Nunes Imagem: Divulgação

De Universa, em São Paulo

15/07/2023 04h05

Aos 64 anos, Suzana Pereira Nunes lembra até hoje de um presente que ganhou dos pais quando tinha 7: um kit de química com ingredientes que, misturados, transformavam-se num líquido espesso e avermelhado: um "sangue mágico", como ela gostava de acreditar. "Aquele brinquedo despertou em mim o gosto pela ciência", lembra.

Em junho, Suzana foi uma das cinco cientistas agraciadas com o prêmio de 100 mil euros concedido pelo programa L'Oréal-Unesco For Women in Science. Há 25 anos, a honraria é destinada a mulheres cientistas com pesquisas de destaque. Embora seja brasileira, ela recebeu o prêmio destinado à África e Estados Árabes —há 13 anos, Suzana Pereira Nunes ensina química na Universidade de Ciência e Tecnologia King Abdullah, na Arábia Saudita. A premiação ocorreu na sede da Unesco, em Paris.

Suzana foi premiada pelo desenvolvimento de membranas para separar substâncias —por meio de uma filtragem microscópica, como se a membrana fosse uma peneira de altíssima precisão—, resultando em um trabalho mais limpo na indústria, com menor consumo de energia e emissão de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. "Assim, contribuímos para um mundo com menos aumento de temperatura", explica a cientista.

"Aquilo não era para mim"

Ter o trabalho reconhecido como um dos cinco mais relevantes do mundo na ciência, para Suzana, funciona como incentivo. "Motiva a seguir em frente em um trabalho com o qual sou muito envolvida. E dá visibilidade à pesquisa", avalia.

O kit de química acompanhou boa parte da infância de Suzana. Fascinada com as experiências feitas com o brinquedo —e com as "mágicas" que as misturas possibilitavam—, ela decidiu, no começo da adolescência, tornar-se cientista. Aos 14, matriculou-se numa escola de ensino técnico em química. Depois, ingressou na mesma área na Universidade de Campinas (Unicamp), onde também cursou mestrado e doutorado.

Suzana Pereira Nunes - Divulgação - Divulgação
Suzana Pereira Nunes entre alunas na Universidade King Abdullah, na Arábia Saudita
Imagem: Divulgação

Depois de concluir um pós-doutorado na Alemanha, retornou ao Brasil para trabalhar no centro de pesquisas da fabricante de pneus Pirelli. "Confirmei que aquilo não era para mim", ela conta. Decidiu, então, voltar para a pesquisa acadêmica, sua grande paixão. Ingressou no quadro de professores da Unicamp e, após dez anos na função, retornou à Alemanha, para chefiar o departamento de membranas para energia sustentável no GKSS Research Centre.

Há 13 anos, decidiu dar uma nova sacudida na vida. Foi contratada pela então recém-fundada universidade árabe para ajudar a colocar de pé o departamento de química da instituição. Hoje, é uma estrela do quadro docente.

"Ter filho foi uma ótima decisão"

Casada com um cientista alemão e mãe de um biólogo marinho de 26, Suzana reconhece que, por ser mulher, enfrentou dificuldades específicas na trajetória como cientista.

Ela identifica um padrão no preconceito contra as mulheres. No começo da carreira, quando elas ainda são uma "promessa", costumam receber incentivos de profissionais mais experientes que se orgulham de ter, perto deles, uma pupila talentosa. Isso acaba por atribuir valor a esses profissionais, tidos como mentores.

À medida em que a "promessa" se torna realidade, no entanto, o apoio se transforma em competição, segundo afirma. "Muitos homens não se sentem à vontade de conviver com uma mulher na mesma posição que a dele, ou superior", diz.

Mas acredita que a maternidade não prejudicou sua trajetória de sucesso. Ela e o marido dividiam-se no cuidado com o filho —em determinados períodos, ele ficava em casa cuidando da criança— e, sempre que possível, levavam o menino com eles a congressos mundo afora. "Na verdade, ter filho foi uma ótima decisão", diz.

Inscrições encerram-se dia 17

No Brasil, um programa destinado especialmente a cientistas que vivem no país está com inscrições abertas até dia 17 de julho. O Programa L'Óreal Brasil-Unesco para Mulheres na Ciência vai contemplar sete jovens pesquisadoras das áreas de ciências da vida, física, química e matemática com uma bolsa de R$ 50 mil —é obrigatório que a candidata tenha concluído o doutorado até 1º de janeiro de 2015. O prazo se estende por mais um ano se a candidata tiver um filho; e por mais dois, caso tenha duas ou mais crianças. Mais informações estão disponíveis no site For Women in Science.