Na venda de Lili, elas iam comprar batom e relatavam violência do marido

Há sete anos, Lisiane Borges, finalista do Prêmio Inspiradoras na categoria Consultora de Beleza, administra um pequeno comércio na comunidade quilombola do Limoeiro, em Palmares do Sul (RS). A loja "Novidades da Lili" é resultado de um cuidado que tem consigo: se manter financeiramente independente de qualquer pessoa, sobretudo do parceiro.

Ali, ela vende de tudo: maquiagens, material escolar, pilhas e cabos, entre outros acessórios eletrônicos. Desde o início das atividades, porém, percebeu que nem sempre suas clientes vinham em busca só de algo para comprar.

Relacionadas

Vítima de assédio, agente de saúde ensina mulheres a enfrentar violência

Prêmio Inspiradoras: vote nas finalistas de cada categoria

Depois de câncer aos 29, consultora criou rede para troca de experiências

"As mulheres chegavam na loja e diziam que precisavam muito falar comigo, queriam desabafar", diz a gaúcha.

Nas conversas, surgiam, então, assuntos sobre filhos, família, dificuldades financeiras (principalmente a falta de autonomia sobre o próprio dinheiro), saúde, autoestima e violência doméstica. Logo ficou claro que essas mulheres precisavam de mais do que um bom ouvido.

Dessa forma nasceu o projeto Autoestima da Mulher. São encontros quinzenais com profissionais da área da saúde e estética, que ministram palestras sobre temas ligados ao empreendedorismo feminino e comandam rodas de diálogo sobre os mais diversos temas.

A primeira edição, em 2018, teve a participação de cinco mulheres, além da presença da psicóloga e da enfermeira. Hoje, a iniciativa atende 150 mulheres das comunidades quilombolas de sua região.

Prêmio Inspiradoras | Categoria: Consultora de Beleza

Enquete encerrada

Total de 6400 votos

Claudiana Ferreira imagem: Mariana Pekin/UOL

Lisiane Borges imagem: Mariana Pekin/UOL

Micheli Bocchi imagem: Mariana Pekin/UOL

Votar de novo

Total de 6400 votos

Um espaço de acolhimento e identificação

A trancista Elissandra Assis dos Santos, 44, mora na cidade de Palmares do Sul há 14 anos. Ela, que é de Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre, foi para a pequena cidade de 11 mil habitantes para trabalhar e porque lá vivia o hoje marido. "Abri mão do caos da cidade grande para vir para o interior", conta.

Longe da família e de amigos, ela se sentiu solitária. Foi quando conheceu o grupo Autoestima da Mulher. "Fui muito bem acolhida e reconheci um potencial em mim que nem eu mesma sabia que existia", conta.

Sandra, como gosta de ser chamada, recebeu o convite para conhecer o grupo e participar das oficinas de cuidado de beleza. Na primeira vez, assistiu à palestra de cuidados da saúde da mulher e fez as unhas. Pode parecer algo simples, mas já teve um efeito importante na vida dela.

"Me despertou não somente para cuidar da minha autoestima, mas para prestar mais atenção em outras mulheres ao meu redor, que de alguma forma estejam precisando desse mesmo cuidado", diz.

Hoje, a trancista já consegue identificar nas outras aquilo pelo que passou. Percebe que, muitas vezes, elas não se sentem à vontade para falar sobre seus problemas pessoais, mas se enxergam nas histórias de outras ou nos temas expostos pelos palestrantes. Daí a importância das trocas.

Após participar dos fóruns e oficinas, Sandra também contribuiu com o seu trabalho como trancista. "Fiz minha doação de trabalho para dar uma 'up' na autoestima das mulheres negras que ainda lutam com a autoestima e por identidade."

Empreender pede coragem

Vinda de uma família numerosa de seis irmãos, Lisiane ressalta como a presença de sua mãe foi forte em sua vida. A mulher criou os filhos sozinha enquanto trabalhava para sustentar a casa. Aos 7 anos, a filha viu o pai agredir a mãe fisicamente.

"Eles se separaram, mas a cena ficou para sempre marcada em mim. Decidi, ali, que não dependeria de ninguém, muito menos de marido", diz a empreendedora.

Foi por isso que, mesmo estando em um casamento saudável, nunca abriu mão de ter sua independência financeira. Mas resolver o próprio problema não era suficiente. Ao assistir a história de sua mãe se replicando nos depoimentos das clientes, teve certeza de que precisava ajudar a mudar outras vidas.