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'Vontade de socar a parede de dor': quando o fluxo menstrual vira um drama

Maira Manesco notou problema com seu fluxo menstrual após o parto Imagem: Arquivo pessoal

Glau Gasparetto e Thaís Lopes Aidar

Colaboração para Universa

14/10/2023 04h00

Até o nascimento do primeiro filho, a relações públicas Maira Manesco, 33, de São Caetano do Sul (SP), nunca teve problema com seu fluxo menstrual. Mas o cenário mudou depois do parto. Ela ficou um ano sem fluxo e, no terceiro ciclo pós-retomada, percebeu que havia algo errado.

Surgiram dores e sangramentos intensos. Eu vivia à base de remédios e tinha vontade de socar as pessoas de tanta dor. O absorvente não dava conta --passei a usar absorvente noturno com calcinha absorvente para conseguir sair de casa e não vazar tudo. Depois de três meses, fui ao médico, fiz ultrassom e ressonância, que confirmaram: era endometriose.
Maira Manesco

A endometriose pode aparecer em qualquer fase da idade reprodutiva e tem tratamento Imagem: (Sem crédito)

No retorno ao consultório, o ginecologista avisou que Maira deveria operar logo para a situação não piorar. Em busca de outras soluções, ela procurou o obstetra que a atendeu no parto.

"Não queria tomar anticoncepcional nem colocar DIU. Então, ele me deu um medicamento que atua no bloqueio do sangue. Hoje, tenho todo o ciclo, mas não menstruo mais na mesma intensidade", relata.

Se hoje o cenário é positivo, não foi assim desde o início do tratamento. "No primeiro mês, achei que teria de ir para o hospital: sangrei sete dias seguidos. Depois foi mais tranquilo, mas todo esse processo mexeu muito comigo e precisei ir atrás de ajuda psicológica", conta.

Afinal, o que é um fluxo intenso?

Eliminar bastante sangue pode parecer suficiente para determinar que o fluxo é intenso, porém, vale observar também a quantidade de absorventes usados.

A ginecologista Carla Iaconelli, especialista em medicina reprodutiva, explica que trocar o protetor a cada quatro horas ou usar, em média, quatro absorventes por dia é considerado normal.

Já para quem usa o copinho coletor, a troca deve durar cerca de seis horas. Nessa lógica, o "padrão" é sangrar de 50 a 80 ml por dia, podendo variar um pouco.

"Uma paciente que precisa utilizar mais de um pacote de absorvente por ciclo ou usar absorventes maiores por longos períodos têm fluxo menstrual aumentado", aponta o ginecologista e obstetra Alexandre Pupo, dos hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein.

Além disso, o médico indica outras variáveis, como a presença de coágulos no sangramento e a duração do período. Se essas "bolas de sangue" forem grandes, é sugestivo de um fluxo intenso, assim como sangrar por mais que sete dias. Em alguns casos, sangramento por mais de cinco dias já pede investigação.

Nem todo mês será igual

Embora se espere um padrão dos ciclos menstruais, Carla Iaconelli afirma que nem sempre o fluxo será o mesmo. "Se diminuir ou aumentar demais, é sinal de que alguma coisa está acontecendo fora desse parâmetro. Se, de repente, o fluxo começa a aumentar progressivamente e cada mês fica maior, tem que investigar a causa disso", exemplifica.

Já variações esporádicas podem ser motivadas pela qualidade de vida e estresse, entre outros contextos, como lembra Pupo. Ele ressalta ainda ser possível que a mulher apresente fluxos intensos sem necessariamente ter algum problema ou ser sintoma de patologias.

Endometriose não é única causa

A endometriose consiste na presença de implantes do endométrio —a camada interna do útero que é expulsa mensalmente na menstruação— alocados no útero, ovários ou até em outros órgãos, como bexiga e intestino. Assim, em vez de o tecido ser eliminado ao menstruar, alguns fragmentos permanecem na pelve, causando sangramento.

A endometriose pode ser uma das principais culpadas por um fluxo menstrual intenso, mas ela não é a única. Existem também outras condições, como detalham os especialistas:

Adenomiose: conhecida como "prima da endometriose", é uma doença que favorece a presença de tecido endometrial entre as fibras da parede uterina, causando inflamação no período menstrual, que aumenta o sangramento e provoca cólicas.

Pólipos ou miomas: crescem dentro do útero, na cavidade endometrial, gerando fluxo intenso e dor.

Coagulação sanguínea: problemas hematológicos e o uso de medicamentos que diminuem a coagulação aumentam o sangramento.

Aborto: nesse caso, não é raro registrar um ciclo com fluxo aumentado, em que houve atraso menstrual seguido de fluxo bem maior.

Uso de substâncias exógenas: caracteriza-se pelo excesso de estrogênio ou uso de doses altas de testosterona, hormônios capazes de alterar o ciclo menstrual pelo crescimento exagerado do endométrio, ocasionando, consequentemente, mais sangramento.

Atrofia do endométrio: é a causadora do sangramento uterino anormal, devido ao uso de anticoncepcionais hormonais contínuos ou utilização inadequada desses métodos contraceptivos.

Disfunções hormonais: quando ocorrem alterações do eixo de hipotálamo, hipófise e ovário.

Istmocele: também conhecida como nicho uterina ou divertículo uterino, a condição é mais rara e tende a aumentar o tempo de menstruação e não o fluxo em si.

Quando buscar o médico

É essencial ter em mente que cólicas fortes, acompanhadas de sangramento intenso, não são normais e sempre devem ser investigadas. Fora isso, a ginecologista Iaconelli indica que o mal-estar da mulher é motivo suficiente para ir ao hospital, já que sangrar em excesso pode resultar em anemia.

"Essa perda elevada de sangue pode levar à anemia com suas consequências clínicas, que são: cansaço e perda da motivação e da concentração. A pessoa precisa procurar ajuda de um profissional médico, porque a maioria dos sangramentos uterinos têm diagnóstico, tratamento e cura", observa a especialista.

Tratamentos são individuais

Como no caso de Maira, após a descoberta da endometriose, um médico quis operá-la, enquanto outro sugeriu o tratamento medicamentoso. Isso mostra que, ao ter o diagnóstico, é essencial buscar um ginecologista de confiança para conversar sobre as alternativas, que devem ser individualizadas, considerando-se caso a caso.

"De uma maneira genérica, o que temos inicialmente são tratamentos medicamentosos não hormonais, que diminuem o fluxo e o quadro de dor e de cólica. Em seguida, há o tratamento de medicamentos hormonais em que se bloqueia o eixo hormonal e, com isso, controla o momento e a maneira como acontece esse sangramento. E temos também os tratamentos cirúrgicos, quando necessários", explica Pupo.

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