'Entrou rindo e saiu com lábio roxo', diz pai de mulher morta ao tirar DIU
Simone Machado
Colaboração para o UOL, em São José do Rio Preto (SP)
10/11/2023 11h16Atualizada em 10/11/2023 14h18
"O médico dá a vida e não o contrário. Ele tirou a vida da minha filha e vamos buscar justiça."
O desabafo é do aposentado Lino Antônio Vieira, 64, pai de Jéssica Marques Vieira, de 32 anos, que morreu no sábado (4) quando foi fazer a retirada de um DIU (Dispositivo Intrauterino), em uma clínica em Matozinhos, na região metropolitana de Belo Horizonte. A Polícia Civil investiga o caso.
Segundo o aposentado, Jéssica nasceu com um sopro no coração e, por indicação de outros profissionais, passou a fazer acompanhamento cardiológico na Clínica Med, em 2011. A família é da cidade de Pedro Leopoldo, vizinha a Matozinhos.
"Com o passar do tempo, o médico também passou a fazer os procedimentos ginecológicos na Jéssica. Pedia exames e indicou que ela parasse de usar a pílula e colocasse DIU. Como a Jéssica já tem um filho de 9 anos, ela aceitou", conta o pai.
Lino conta que o procedimento para colocar o DIU foi no dia 20 de outubro e, nesse dia, o médico percebeu que havia uma vermelhidão no útero de Jéssica e pediu mais exames.
"Ele disse que poderia ser câncer. A Jéssica ficou muito assustada e fez todos os exames. No dia 1.º, saiu o resultado e deu que não era nada grave. Mesmo assim, o médico pediu para ela retornar ao consultório para retirar o DIU e fazer novos exames", diz o aposentado.
No dia 4 de novembro, Jéssica voltou à clínica, acompanhada do pai e do marido para fazer a retirada do dispositivo intrauterino, mas teria passado mal durante o procedimento.
Ela entrou no consultório 7h05, caminhando e rindo. E saiu de lá às 11h em uma maca, já com lábios roxos. Nesse tempo ninguém nos falou nada. Vimos que algo de errado estava acontecendo, vimos que duas funcionárias entravam e saíam da sala a todo tempo e dispensaram os demais pacientes que tinham atendimento naquele dia. Eu perguntava sobre a minha filha e ninguém parava para falar com a gente.
Ainda segundo o pai, Jéssica foi encaminhada para a UPA (Unidade de Pronto Atendimento). Ele diz que nem ele e nem o genro foram autorizados a acompanhar a mulher na ambulância e tiveram de ir para a unidade de carro.
"Eu perguntei para o médico o que havia acontecido com a minha filha e ele não respondeu. Foi quando eu disse: 'Você matou ela'. E ele disse que não, que havia feito manobras de ressuscitação 19 vezes", diz.
Carro do IML
O pai de Jéssica conta que ao chegar à UPA nenhuma informação sobre o estado de saúde da filha foi repassado. E que só soube que a filha havia morrido ao ver o carro do IML (Instituto Médico Legal) chegando.
"Tive a confirmação da morte pelo motorista do rabecão que disse que havia ido fazer a remoção do corpo de uma mulher de nome Jéssica", diz o aposentado.
Após a morte da filha, Lino procurou a Polícia Civil e registrou um boletim de ocorrência de "suspeita de erro médico". A família da mulher afirma que até o momento não recebeu nenhuma explicação do cardiologista sobre o que aconteceu com Jéssica.
"O meu sentimento maior é que ele fez isso com a minha filha e não nos deu nenhuma explicação. A minha filha não morreu em vão, vamos buscar por justiça", diz ele.
"No atestado de óbito não tem a causa e nem o horário da morte. Estamos aguardando o resultado da perícia", acrescenta o aposentado.
O UOL tenta contato com a Med Center, mas ainda não obteve um posicionamento. O espaço segue aberto para manifestação.
Em nota, a Polícia Civil de Minas Gerais informou que um inquérito para apurar a causa da morte de Jéssica foi instaurado.
"A PCMG instaurou inquérito policial e aguarda a finalização dos laudos periciais que subsidiarão as investigações que apuram as causas e as circunstâncias da morte da mulher, de 32 anos, ocorrida durante um procedimento em uma clínica médica, em Matozinhos. Mais informações serão repassadas após a conclusão do inquérito policial", disse.
Já a Prefeitura de Matozinhos, por meio da Secretaria de Saúde, disse que tomou conhecimento do fato ocorrido na Clínica Med Center, a partir da solicitação de atendimento à UPA 24 h.
"Como conduta usual, os profissionais da UPA seguiram para a ocorrência constatando, no local, que o fato não poderia ser atendido sem maiores recursos, sendo necessário, portanto, a transferência da paciente para a unidade de urgência e emergência", informou.
Segundo a prefeitura, após os procedimentos de reanimação cardiopulmonar, foi constatada a morte.
"Devido à inespecificidade do caso e desconhecimento dos procedimentos tomados na Clínica Med Center, o médico plantonista da Unidade de Pronto Atendimento de Matozinhos solicitou remoção e avaliação do Instituto Médico Legal."
A prefeitura acrescentou, ainda, que a Clínica Med Center não tem alvará para fazer procedimentos ginecológicos, apenas cardiológicos.