Vai ter PcD na passarela sim! Ela foi da sentença de morte à SPFW
Quando somos crianças, o tempo todo somos questionados sobre o que queremos ser quando crescer. Se, ainda bem, o mundo tem mudado, hoje as mulheres podem ser o que elas bem entenderem: astronautas, médicas, juízas, CEOs, economistas, presidentes da República, ministras, jornalistas, engenheiras, mecânicas, modelos e por aí vai.
Mas imagine o que é receber uma "sentença de morte" ainda criança, sem tempo para poder ser o que bem entendesse. Foi isso que aconteceu com a paraibana Laíssa Guerreira, 18, estudante com AME (atrofia muscular espinhal) tipo 3, dançarina de balé, jogadora de bocha e, agora, modelo. A jovem tem feito jus ao sobrenome que recebeu quando nasceu.
A mãe, Edna, começou a notar sinais da AME dando as caras quando Laíssa tinha dois anos. Um longo processo aconteceu até o diagnóstico correto da doença e, três meses depois, quando tinha cerca de 8 anos, ela parou de andar e precisou da cadeira de rodas, que usa até hoje para se movimentar e fazer as atividades do dia a dia. Mesmo com a realidade de sua condição, a jovem nunca deixou de fazer aquilo que sempre gostou: dançar balé. A cadeira foi introduzida em suas performances e ela faz fisioterapia respiratória para aperfeiçoar ainda mais a dança.
Além do balé, Laíssa é atleta de bocha, esporte que ela considera o mais inclusivo no mundo, pois pode praticar de sua cadeira e usar de inteligência e estratégia. E com um currículo vasto e apenas 18 anos —completados hoje— ela fez sua estreia na passarela da maior semana de moda do Brasil, a São Paulo Fashion Week, nesta quinta (9), no desfile da marca carioca The Paradise.
A estreia foi possível graças a uma parceria entre a farmacêutica Roche e a The Paradise. Além de sua participação no desfile, ela também estará presente no book da marca, com fotos exclusivas.
"É uma emoção não cabe no peito, porque está mostrando que quem tem AME e deficiência, também pode. A gente não é 'pregado' em um diagnóstico, temos vida além disso", contou Laíssa em entrevista a Universa pouco antes de desfilar.
Pra mim isso tudo é um momento de muita alegria, porque pra quem ia viver só até os 13 anos em cima de uma cama, estar nesse momento se preparando para desfilar em uma passarela, quebrando barreiras, mostrando que a gente vive e tem vida, é muito emocionante. Laíssa Guerreira
Essa parceria entre farmacêutica e marca também deu origem a uma estampa que não só carrega uma poderosa mensagem, mas também representa a força do cotidiano daqueles que vivem com AME. A estampa exclusiva está numa camiseta limitada. "Queremos que esta parceria seja mais do que uma peça de roupa; queremos que ela seja um símbolo de apoio, solidariedade e inclusão na moda", explicou Patrick Doering, um dos estilistas da The Paradise.
E o que disseram os estilistas, Patrick e Thomaz Azulay, em um vídeo antes do desfile: "A roupa é coadjuvante. Diversidade e inclusão não são modinha, tem que chegar pra ficar", pôde ser visto na prática.
Esqueça só as modelos magérrimas e fazendo carão na passarela, o desfile esteve recheado de gente de todas as cores, tamanhos, formatos, idades, sorrisos e cabelos. Além de Laíssa, Luiza Brunet —que abriu o desfile—, e Preta Gil —que encerrou— foram as grandes estrelas dessa tarde quente e memorável em São Paulo.
E sobre inclusão, a estudante disse:
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Quero receberCheguei e me senti acolhida como uma pessoa que está no universo da moda. É um momento ímpar, uma quebra de barreiras e um divisor de águas nas nossas vidas. Laíssa Guerreira
Ponto para a The Paradise.
"É uma emoção que não cabe no meu coração. A gente sai de um diagnóstico de morte, de perda, para um diagnóstico de vida, de passarela, de moda, de cores, de energia, de inclusão. Estou emocionada. Foi um desfile altamente inclusivo, em que vemos todas as pessoas, todas as formas, incluídas e inseridas, isso é o mais importante, eu estou sem palavras", celebrou Edna Guerreira, com lágrimas nos olhos, mãe de Laíssa, minutos após o fim do desfile ao falar com a reportagem de Universa.
Entenda mais a AME
A AME é uma doença genética rara, hereditária e sem cura que afeta os neurônios motores, que são células que controlam os músculos. Essas células precisam de uma proteína específica, chamada SMN, ou proteína de sobrevivência do neurônio motor.
Uma pessoa com AME nasce com uma condição genética que faz com que a produção da proteína seja menor do que o que as células precisam. Por causa disso, esses neurônios vão desaparecendo aos poucos, sem serem repostos pelo organismo.
A perda dos neurônios motores deixa os músculos do paciente cada vez mais fracos, levando à atrofia, o que prejudica funções básicas como caminhar, falar, engolir e até respirar.
Existem cinco tipos de atrofia muscular espinhal, classificados de acordo com a idade em que os sintomas aparecem e o maior marco motor alcançado pela criança:
TIPO 0: Os sintomas surgem ainda na gestação, com o feto se movimentando pouco. Nesse caso, o bebê já nasce com fraqueza muscular e insuficiência respiratória grave.
TIPO 1: Geralmente apresenta sintomas até o sexto mês de vida. O neném não consegue se sentar sem apoio e sustentar o pescoço. Cerca de 60% dos novos casos de AME são desse tipo.
TIPO 2: A doença costuma dar sinais entre 6 e 18 meses de vida. A criança é capaz de sentar sem apoio, porém não anda, e normalmente apresenta problemas respiratórios.
TIPO 3: Os sintomas surgem entre os 18 meses e a adolescência. O paciente consegue ficar em pé e andar de forma independente, mas pode perder essas habilidades com o tempo.
TIPO 4: Os sintomas começam a manifestar-se já na fase adulta do indivíduo. É um tipo raro com evolução lenta dos sintomas e geralmente não leva à perda de função motora.
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