Mãe, ex-adventista e praticante do swing: 'Tive medo de contar aos filhos'

Mãe de dois filhos, Marina Rotty, 46, frequentava a Igreja Adventista do Sétimo Dia quando decidiu experimentar uma nova modalidade no relacionamento com o marido: o swing. Ela e Márcio, 51, juntos há 25 anos, embarcaram em uma jornada que ficou por muito tempo às escondidas.

À Universa, Marina conta como foi revelar aos filhos adolescentes que os pais são adeptos do swing há sete anos: "Tive medo, achei que poderiam sair de casa."

'Voltamos com muito tesão'

O casal tinha curiosidade de experimentar o swing. "A gente achava que era um casal bem resolvido. Nosso filho mais novo tinha seis meses e estávamos em processo de retomada da intimidade do casal. Resolvemos testar uma casa de swing, por curiosidade, e na volta ficamos com muito tesão um pelo outro. Como teve benefício para o relacionamento, começamos a frequentar outras vezes. Com isso, conhecemos outras pessoas do meio liberal e entendemos que se tratava muito mais de uma filosofia de vida do que apenas sexo."

É sobre liberdade. Não privilegia nem a mulher e nem o homem. Dentro do swing, a mulher tem liberdade para ser quem ela quer ser. Me apaixonei por essa ideia.
Marina Rotty

Marina e Márcio começaram a viver uma "vida dupla". "Além de a gente ser tradicional, monogâmico, éramos religiosos. Frequentávamos a igreja Adventista de Sétimo Dia e trabalhávamos ali. Nunca falamos nada para ninguém porque tínhamos muito medo de perder o trabalho, perder a guarda dos nossos filhos, sofrer retaliação. Por isso, era como se estivéssemos vivendo uma vida dupla. Ficamos assim por mais de dez anos."

Marina criou um blog para falar sobre o tema. "Víamos a prática do amor e da bondade no meio liberal, e não tanto na igreja. Não demorou muito para que nos afastássemos. Começamos a escrever um blog sobre swing, em que eu respondia dúvidas das pessoas. Não podia entrar com meu nome normal, Eucilene, e inventei a Marina, um nome mais comum, para não ser identificada."

'Sempre falei de diversidade'

Marina conta que manteve conversa educativa com os filhos sobre o tema. "Começamos a preparar nossos filhos. Quando eram crianças, falava sobre a diversidade: que as pessoas eram variadas, tinham ideias diferentes e isso não fazia delas pessoas piores."

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Quando ficaram adolescentes, a mãe passou a conversar com os filhos, perguntando o que pensavam de relações não monogâmicas. '[Perguntava] se eles tinham preconceito, se gostavam ou não. Perguntava: 'o que vocês pensam de poliamor?' Não falava em swing porque a palavra é muito carregada de preconceito. Eles me respondiam que achavam normal."

Decisão de revelar o swing ocorreu na pandemia. "Decidimos contar em 2020. Nosso filho mais velho tinha 18 anos e o mais novo, 15, achávamos que era hora. E, naquela época, com a pandemia, nos questionávamos muito: 'será que vamos viver? Como será o futuro?' Isso potencializou o desejo de conversar com eles."

Casal foi reconhecido após uma reportagem. "No dia em que combinamos de falar, descobrimos que estávamos com covid e não deu para prosseguir o plano. Uma semana depois saiu uma reportagem em TAB UOL com nossa foto, falando sobre o assunto. Fomos reconhecidos por pessoas da família e começaram a nos ligar. A primeira coisa que fizemos foi comunicar logo nossos filhos."

Para mim, foi como tirar um peso. Respirei aliviada porque já estava nesse processo há muitos anos de me entender dentro do liberal, dessa filosofia. Mas tínhamos medo de sofrer algum preconceito, especialmente no trabalho.
Marina Rotty

Os filhos já sabiam sobre o modo de vida dos pais. "Nos reunimos na sala e disse que tinha uma notícia. O caçula logo respondeu dizendo que já sabia que tínhamos um blog de swing há muito tempo, porque tinha visto no meu computador. E o mais velho disse que desconfiava porque já tinha visto materiais em casa sobre o tema. Mas eles nunca questionaram ou vieram tirar satisfação."

A resposta que tive deles foi: 'Vocês sempre nos deram liberdade para sermos quem somos. Por que faremos algo diferente disso com vocês?'. Para mim, foi um alívio e um orgulho muito grandes. Quando somos mães, a gente se questiona como será esse filho no futuro, se vai ser uma pessoa do bem. E chega um momento crucial da vida em que é preciso uma prova para saber se eles foram bem educados. E para mim foi muito satisfatório essa resposta deles porque percebi ali que tinha bons filhos.
Marina Rotty

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Marina era Adventista do Sétimo Dia antes de experimentar o swing
Marina era Adventista do Sétimo Dia antes de experimentar o swing Imagem: Arquivo pessoal

'Falam coisas que não falariam'

Depois da revelação, a dinâmica da família mudou. "Continuamos na mesma casa e somos as mesmas pessoas, mas, pelo fato de termos uma relação aberta, sinto que eles começaram a falar coisas que jamais falariam. Tudo porque tivemos a coragem de seremos honestos com eles."

Antes tive medo, achei que poderiam sair de casa, morar com o avô. Medo de eles sofrerem represálias. E, é claro, é um direito deles, mas tinha esse medo do que poderia acontecer. E ter eles do nosso lado foi um alívio.
Marina Rotty

Marina diz que não sentiu preconceito na família ou no ambiente próximo. "Nunca fomos desrespeitados. A gente até tinha medo que tivesse alguma chacota na escola dos meninos, mas nada aconteceu. Morri de medo de ir à formatura do meu filho mais novo porque não sabia como seria. Entrei no salão tremendo, sentei no último banco e nada aconteceu. Na família, tem um ou outro que fala coisas desrespeitosas, mas nada que não soubéssemos lidar. Acredito que no futuro a gente não vai mais ter de passar por um grande medo de ter de se esconder por querer amar."

Para ela, ainda falta debate no Brasil sobre outras formas de relacionamento. "Tivemos muitos avanços no tema da diversidade sexual, mas se fala ainda muito pouco sobre a relacional. As informações sobre swing estão recheadas de preconceito. É muito voltado para práticas sexuais e não sobre a relação. Quando você entra numa comunidade de swing, o sexo deixa de ser importante. Não estamos pensando em transar com todos, queremos companhia, sermos aceitos na nossa diversidade."

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Swing é uma filosofia de vida. Existe uma comunidade séria de pessoas que acreditam no compartilhamento da vida, não apenas só com uma pessoa, com o casal, mas de casais com casais, com famílias. E, dentro desse compartilhamento de vida, por que não compartilhar também a vida sexual? A comunidade traz sensação de amizade, pertencimento e a possibilidade de relação sexual.
Marina Rotty

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