Pena pode ser maior que a do estuprador: veja o que muda com PL antiaborto
De Universa, em São Paulo*
13/06/2024 12h40Atualizada em 18/06/2024 16h47
Em votação-relâmpago, o plenário da Câmara dos Deputados aprovou ontem, quarta-feira (12), o pedido de urgência para votar o projeto de lei antiaborto, que equipara a interrupção da gestação acima de 22 semanas a homicídio no Brasil.
O PL 1904/24 pode agora ser votado sem precisar passar por comissões temáticas, nas quais poderiam ser feitas audiências públicas e outros ritos para analisar e debater a proposta. O texto ainda não tem data para ser votado no plenário.
Entenda o que mudaria com aprovação do PL
Hoje, aborto é permitido pela lei em três casos no país:
- para salvar a vida da mulher;
- em gestação resultante de estupro;
- quando o feto for anencefálico --com defeito na formação do tubo neural que resulta em bebê natimorto ou capaz de sobreviver apenas algumas horas.
Não há limite de tempo, atualmente, para a realização do procedimento nesses três casos legais.
Caso projeto entre em vigor, pessoas que fizerem aborto após a 22ª semana de gestação, incluindo vítimas de estupro, passarão a receber tratamento de homicídio simples. A punição é de seis a 20 anos de cadeia.
Médicos também poderão ser presos. Hoje, eles são considerados isentos de responder por qualquer tipo de crime. Pela proposta, poderão ser punidos se interromperem a gravidez de feto que não seja anencéfalo.
O projeto é uma demanda da bancada evangélica no Congresso e veio em resposta à decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares relacionados a casos de aborto derivados de resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina).
Casos de estupro
Punição para vítima de violência sexual que engravidou e decidiu abortar pode ser maior inclusive do que a aplicada ao próprio estuprador.
A pena para esses crimes sexuais vai de cinco a dez anos de reclusão, quando a vítima é adulta, e de oito a 12 anos quando a vítima é menor de idade, de acordo com o Código Penal.
No caso de estupro de vulnerável, quando a vítima tem menos de 14 anos ou não tem condições de reagir, a pena vai de oito a 15 anos.
Em situações em que o estupro é praticado contra vulnerável e resulta em lesão corporal grave, a pena pode chegar a 20 anos —tempo máximo de reclusão que o projeto de lei prevê para quem praticar o aborto.
Mudanças por artigo
O PL antiaborto propõe mudar quatro artigos do Código Penal. Veja abaixo como é hoje cada um e como fica se o projeto for aprovado no Congresso:
Artigo 124
Como é hoje: Proíbe a pessoa de fazer aborto ou consentir que alguém faça aborto nela, exceto em situações permitidas por lei.
Como ficaria: Quando houver viabilidade do feto em gestações acima de 22 semanas, as penas serão iguais ao crime de homicídio. A pena pode ser cancelada quando as consequências do aborto forem tão graves que a punição se torna desnecessária.
Artigo 125
Como é: Caracteriza como crime provocar aborto não legal sem consentimento da gestante. Pena de três a dez anos.
Como ficaria: Em casos de feto viável, a interrupção da gravidez feita após 22 semanas de gestação será crime com pena igual ao homicídio —de seis a 20 anos.
Artigo 126
Como é: Prevê pena de um a quatro anos de prisão para quem provocar aborto ilegal com consentimento da gestante depois de 22 semanas.
Como fica: Estipula punição igual ao crime de homicídio.
Artigo 128
Como é: Não pune o médico que interromper gravidez decorrente de estupro.
Como fica: Se a gestação resultante de estupro tiver viabilidade e passar das 22 semanas, o médico não estará isento de punição.
'Revitimização'
O projeto em tramitação na Câmara deve agravar casos de gravidez de meninas até 14 anos e "revitimiza" vítimas de estupro, segundo a ministra das Mulheres, Cida Gonçalves.
"Não é por acaso que os movimentos feministas e de mulheres vêm intitulando o Projeto de Lei 1.904/2024 de 'PL da Gravidez Infantil'", afirmou a ministra, em nota, em referência à campanha de ativistas e celebridades nas redes sociais contra o projeto.
Seja por desinformação sobre direitos e como acessá-los, exigências desnecessárias, como boletim de ocorrência ou autorização judicial, ou pela escassez de serviços de referência e profissionais capacitados, o Brasil delega a maternidade forçada a essas meninas vítimas de estupro, prejudicando não apenas o futuro social e econômico delas, como também a saúde física e psicológica. Ministra Cida Gonçalves