SP tem pelo menos uma ocorrência de estupro em unidades de saúde por dia

Casos como o do homem preso por suspeita de abusar sexualmente da filha de 17 anos, dentro de uma UTI de um hospital em São Bernardo do Campo (SP), são registrados pelo menos uma vez por dia, em São Paulo.

Dados coletados por Lei de Acesso à Informação com exclusividade por Universa indicam que, somente em 2023, a polícia contabilizou 381 boletins de ocorrência por estupro em locais de saúde como postos, clínicas e hospitais, privados ou públicos.

Ao enviar os dados, a Secretaria de Segurança Pública informa que o número total de boletins de ocorrências registrados sob uma natureza criminal não representa a estatística criminal do Estado ou de determinada área ou região - uma vez que há casos que não são notificados.

A pasta explica que a estatística em São Paulo é contabilizada de acordo com procedimentos estabelecidos no Sistema Estadual de Coleta de Estatísticas Criminais.

Mas os números não param de crescer. Em 2020, Universa já havia revelado que a cada 13 dias, um caso de estupro dentro de unidades de saúde de São Paulo foi registrado. Os dados de 82 BOs eram referentes ao período entre janeiro de 2018 e outubro de 2020.

Na época, as pastas de saúde municipal e estadual enviaram nota repudiando qualquer ato de violência contra pacientes, e informaram que os hospitais são orientados a tomar todas as medidas cabíveis a partir do conhecimento de algum caso, respeitando a confidencialidade da identidade dos envolvidos.

O que aconteceu em São Bernardo do Campo

O ocorrido foi divulgado inicialmente pelo programa Profissão Repórter, da TV Globo, e confirmado ao UOL pela Secretaria da Segurança Pública de São Paulo. A defesa do suspeito nega a acusação.

A ocorrência foi registrada no 2° Distrito Policial como estupro de vulnerável. Funcionários que trabalham no hospital desconfiaram de lesões que apareceram em partes íntimas da jovem, que estava internada há cerca de 40 dias.

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Uma câmera escondida foi colocada no quarto. Na gravação, o homem aparece apalpando os seios e outras partes do corpo da jovem. As imagens foram levadas para a polícia.

Em nota enviada ao UOL, o advogado Daniel Wallace, que faz a defesa do acusado, disse que as imagens foram feitas sem autorização judicial e que, portanto, elas não confirmam a prática do crime com exatidão.

A advogada Sueli Amoedo, líder jurídica da rede Justiceiras, explica, porém, que a defesa pode alegar tudo o que for necessário, mas quem vai decidir pela ilegalidade é o juiz.

O vídeo foi essencial para a prisão dele. De toda forma, tem os testemunhos dos profissionais de saúde. Sua utilização deve ter relevância probatória e contribuir efetivamente para o esclarecimento dos fatos, ela descreve.

E segue: "A prova ilícita só deve ser admitida caso não exista uma alternativa menos invasiva ou restritiva de direitos para se obter a mesma informação ou evidência. Na minha opinião, o testemunho dos profissionais da saúde são suficientes para a manutenção da prisão."

Sueli elogia ainda a equipe que fez a filmagem: "Foi extremamente corajosa em denunciar e principalmente em produzir provas necessárias para que ele fosse preso."

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Ela lembra que o caso só comprova o que as pesquisas mostram: a maioria dos abusadores é próxima ou convive com as vítimas.

"Mas eles reinam na impunidade, pois as políticas públicas de proteção às mulheres não chegam aos vulneráveis, não há fiscalização de como elas são tratadas dentro de casa, o Conselho Tutelar ou Creas não fazem visitas mensais para saber como estão, e nas escolas a temática é praticamente proibida", lamenta.

Em nota, a SSP informou que tem concentrado esforços para combater todos os crimes no estado, incluindo os casos de estupro e estupro de vulnerável que, de acordo com a pasta, recuaram 9% e 1,4%, respectivamente, nos primeiros quatros meses do ano em comparação com 2023.

Leia o restante da nota:

"A pasta tem desenvolvido campanhas para as vítimas denunciarem os agressores e atuado para ampliar os canais para comunicação deste tipo de crime. Atualmente, por exemplo, há 141 salas de Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) para atendimento ininterrupto, por videoconferência, em plantões policiais, além das 140 DDMs territoriais já existentes e a DDM On-line, que também está acessível 24 horas por dia para o registro de ocorrências e solicitação de medidas protetivas a partir de qualquer dispositivo conectado à internet. Além disso, a delegacia especializada está integrada em outras esferas governamentais, participa de operações nacionais e mantém parcerias com a Secretaria de Políticas para a Mulher, que tem, entre suas ações, o protocolo "Não se cale".

Vale esclarecer, ainda, que os crimes de estupro ocorrem em uma dinâmica na qual o autor é conhecido da vítima, muitas vezes dentro do ambiente familiar, o que dificulta não só a prevenção por parte da polícia, mas também a denúncia, fazendo com que esses crimes sejam subnotificados.

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As testemunhas são de extrema importância em casos de estupros, não só porque ajudam a provar o crime por meio do seu depoimento, mas porque auxiliam na comunicação do crime. Além das delegacias de polícia, as denúncias podem ser feitas por meio dos canais dique 100/180 e 190.

Vale destacar, ainda, que o crime não precisa de imagens para ser comprovado. Para isso, existem exames periciais.

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