Nunca mais vou dormir? Como o corpo da mãe lida com a privação de sono
Beatriz Zogaib
23/08/2024 04h00
"Aproveita para dormir agora?" É difícil encontrar uma gestante que não tenha escutado e se assustado com essa frase durante as 40 semanas de gestação. Calma, o sono vai bater, mas você não precisa se desesperar, basta entender como uma das reações do corpo de quem está gerando um bebê. Quer receber conteúdos semanais para te ajudar durante a gestação? Se inscreva na newsletter de Materna no box abaixo.
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De início, é bom lembrar que o sono é um dos principais sintomas da gravidez, então, se é um dos seus, durma sempre que for possível, o quanto puder, sem culpa. Só não é preciso se forçar a dormir mais do que você sente que é necessário. O descanso não é cumulativo, não é mesmo?
A necessidade do sono não é maior na mulher grávida do que na não grávida, mas é claro que isso é muito individual. Às vezes, o importante é conseguir analisar melhor os sintomas. A mulher confunde um pouco se é sono ou se é uma falta de energia.Márcia Pradella, neurologista e neuropediatra especialista em medicina do sono
Polêmico? Nem tanto se entendermos a fisiologia materna. Segundo a neurologista, tanto o sono quanto a falta de energia podem acontecer pela mudança hormonal. Mas, fisiologicamente, você não vai precisar dormir mais do que já era o seu hábito. Veja bem, estamos falando de necessidade versus vontade, e por mais que seja frustrante em alguns momentos, seu corpo saberá lidar com isso.
Lembre-se: seu corpo está gerando outro ser vivo e - portanto - seu organismo fará de tudo para equilibrar as coisas. O sono e a falta de energia aparecem para isso, sendo mais comuns logo no início da gestação, com o aumento da progesterona, que estimula o consumo de oxigênio, diminui a pressão arterial, entre outras coisas. Ambos os sintomas dão uma trégua no segundo semestre, e voltam com tudo no terceiro - quando o bebê já está maior e a grávida tem um barrigão e mais peso.
Mas como diferenciar sonolência de falta de energia? Quando se sentir cansada ou sonolenta, se pergunte: preciso de uma cama para dormir ou só descansar no sofá vendo uma série? As pálpebras pesam ou você só precisa sentar um pouco? Não quer sair da cama para trabalhar ou está com preguiça de se arrumar, pegar o carro e ir à luta? E tudo bem se for complexo saber se é um ou se é outro; o importante é respeitar o máximo possível o que o seu corpo pedir, seja deitando numa rede por meia hora depois do almoço ou indo dormir mais cedo do que o habitual.
"Você tem que tentar ficar tranquila por uns dias, para o seu corpo se recuperar, porque a gestação é um momento de mudança importante no metabolismo. E depois, o puerpério não deixa de ser um período de estresse para o corpo. A função do sono também é essa, reparar o cansaço", diz Márcia.
E falando do puerpério, depois que você voltar para casa com o bebê, a dica é, principalmente nos primeiros 30 dias de vida, dormir quando ele dormir - esse clichê faz sentido. Esqueça a lista de quinhentas coisas para fazer em casa, e descanse.
Ah, mas não vou ter oito horas de sono seguidas? Não vai. E não precisa, confie na biologia.
Como dormir no pós-parto?
Mais uma vez, respeite sua necessidade e realidade, com bom senso, equilíbrio e menos cobrança. Sabemos que as horas de sono vão fazer falta, que você vai querer muito que seu bebê emende mais de quatro ou cinco horas de sono, e é totalmente compreensível. Mas, a verdade é que, nesse período, nosso corpo sabe o que fazer com isso.
"A gente sabe que 10% das crianças vão dormir períodos grandes assim que chegam da maternidade, mas 90% dos bebês não são assim, então a mãe precisa saber que o bebê não vai entrar no ritmo dela, é o contrário", explica Márcia.
O sono da mãe não precisa ser de oito horas para ser reparador. Toda vez que amamenta, no pós-parto imediato, no período de extero gestação - que são os três primeiros meses após o nascimento - a mulher produz melatonina, que é o hormônio que induz o sono. Fisiologicamente, o volume de melatonina faz com que ela durma rápido, e ela consegue ter um sono reparador sem precisar de tantas horas seguidas.Viviane Bon Campos, especialista em pré, pós e parto, doula e consultora de amamentação
Uma verdadeira magia da natureza, afinal o bebê não consegue ficar tantas horas seguidas sem mamar, o que torna necessário essa mulher despertar em poucas horas, e se reestabelecer nessas poucas horas.
Precisamos alinhar as expectativas de sono e cansaço, porque às vezes o cansaço não é a falta de sono, é uma falta de rotina, de rede de apoio. Não é que ela precise dormir oito horas seguidas, isso é antifisiológico.Viviane Bon Campos, especialista em pré pós e parto, doula e consultora de amamentação
É importante lembrar que o impacto neurológico, físico e emocional desse sono picado varia de mulher para mulher, não apenas por conta da amamentação. A mãe que não amamenta produz menos melatonina, e tem mais dificuldade. Mas a mulher que tem a ajuda do par, da babá, da mãe, da sogra, por exemplo, tende a ficar mais tranquila para poder relaxar e dormir quando o bebê está quietinho, ou aproveitar as trocas de fraldas (realizadas por outro cuidador) para descansar um pouco mais.
De acordo com Márcia, neurologista e neuropediatra, o melhor a se fazer é encarar esses primeiros meses como passageiros e aproveitar os momentos entre as mamadas para se cuidar. A orientação é que a casa se adeque ao bebezinho; os barulhos, os horários para dormir, para fazer a refeição com seu par, tudo tem que se ajustar, porque isso vai se modificar relativamente rápido, e daqui a pouco entrará nos horários relativamente próximos aos de antes do bebê chegar.
Outras dicas para facilitar o sono do recém-nascido e o seu: de dia, só quebrar a entrada forte de luz no quarto, sem escurecer totalmente, e à noite deixar uma luz bem baixa. Isso vai estimular a maturação dos próprios mecanismos do sono do bebê que, entre três e seis meses, começa a liberar a melatonina, que vai estar mais robusta a partir do sexto mês de vida. Isso significa que, a partir desse momento, seu filhote começará a ter períodos maiores de sono.
Se alimente bem e se hidrate. Monitorar a sua condição física para saber se precisa de suplementos é essencial. A partir de um mês de vida do bebê, com a liberação do obstetra, comece a fazer atividade física. Isso tudo vai colaborar para a sua saúde e a saúde do bebê. Se ele está ganhando peso, está tudo bem, e assim as mamadas vão se espaçando e você vai pensando mais em si própria para, dessa forma, continuar cuidando de quem mais precisa de você.
Se desconfiar que o sono do seu filho (ou o seu) está muito aquém do esperado, procure um especialista.
Pode ser que haja alguma questão subjacente, como um problema respiratório, um refluxo que precise ser olhado com carinho, ou até mesmo um hábito que pode ser modificado. Uma vez tratada a questão de saúde ou instaurada uma higiene do sono, o soninho pode ser recuperado rapidamente.