Gabriela Prioli nega estar em cima do muro: 'Suavizo para alcançar mais'
Nesse mundo onde todo mundo acha que tem que entender de tudo, Gabriela Prioli faz o contrário: convida quem sabe para ensinar. Em "Sábia Ignorância", do GNT, ela abre o espaço para aquela boa e velha troca de conhecimento.
É importante a gente dar esse passinho atrás, entende? Não é porque temos espaço nas redes que, automaticamente, nos tornamos aptos para falar sobre todas as coisas, diz.
Para Gabi, não tem nenhuma pergunta burra. E abrir diálogos é algo revolucionário. "Excluir os que têm dúvida é uma ferramenta de manutenção de poder", diz.
Na conversa exclusiva para Universa, ela só se mostrou preocupada com um assunto: cobranças sobre como Ava, sua filha de 1 anos e meio com o músico Thiago Mansur, será no futuro. De resto, ela está sempre aberta ao debate.
UNIVERSA:Seu novo programa se chama "Sábia Ignorância". Quando a ignorância pode ser uma virtude?
Gabriela Prioli: A ignorância é uma virtude quando você tem consciência dela, quando ela é um portal. Quando a consciência daquilo que você não sabe te impulsiona a buscar a resposta. A ignorância sábia não é a ignorância soberba, é aquela que se abre para o conhecimento novo.
Por mais que a gente saiba muito, o tanto de coisas sobre as quais a gente não sabe nada é sempre maior.
O Marcelo Glazer, o físico brasileiro, tem uma alegoria que eu gosto muito, que é da ilha do conhecimento. O que a gente sabe é uma ilha que está cercada de água por todos os lados, e essa água é o oceano do desconhecido.
Conforme a gente vai aprendendo, a nossa ilha do conhecimento cresce. Consequentemente, a gente entra em contato com mais água, com mais oceano do desconhecido. Quanto mais a gente aprende, mais a gente percebe que tem muito mais coisa para aprender.
Atualmente, todo mundo tem que ter opinião sobre tudo e saber falar sobre todos os assuntos. Você vê isso como algo ruim para o diálogo? Às vezes vale mais ficar calado?
Ficar calado, não sei. Eu preciso fazer perguntas. Vou abrir meu espaço para uma pessoa que saiba mais.
Quando convido o especialista para ir no programa, o que eu estou dizendo, senão, que eu também preciso da ajuda dele? Claro, tenho a minha responsabilidade, construo o meu espaço, falo sobre diversos assuntos, mas preciso da ajuda para montar o meu conteúdo.
Vou buscar as pessoas que estudaram a vida inteira sobre aquilo para que a gente possa ter um conteúdo realmente de qualidade.
Acho que é importante a gente dar esse passinho atrás, entendeu? Não é porque a gente tem um espaço nas redes que automaticamente nos tornamos aptos para falar sobre todas as coisas. E não deveríamos ser cobrados pra isso.
Você acha que não existe nenhum tipo de pergunta boba?
Se a pessoa pergunta, ela genuinamente quer aprender aquilo. Todo mundo teve que começar de algum lugar.
Toda vez que você faz uma pergunta inicial sobre algum assunto, quem te ridiculariza não é quem estudou. Geralmente, é alguém que não sabe, não construiu nada, que está se escondendo atrás dessa máscara do sabe-tudo.
Sempre usei isso para política: virou um baile de máscaras. Ninguém pergunta nada e a gente fica fingindo que todo mundo sabe. Eleição é difícil. Entender o sistema eleitoral dos Estados Unidos é dificílimo.
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Quero receberSe a gente não assumir que é, vai continuar todo mundo fingindo que sabe e ninguém aprende nada. Se eu digo que você não pode perguntar, se ridicularizo a pergunta, excluo pessoas do debate. Esse é instrumento de manutenção do poder.
Viabilizar a pergunta e abrir diálogo é revolucionário.
Você ficou muito conhecida na internet por dar opiniões e explicar temas difíceis relacionados a política e direito de uma maneira mais simples e entender. Considera isso um dom?
Se eu disser para você que acredito que isso seja um dom, o que eu vou estar dizendo é que a gente vai ter que se conformar em ter nascido com ele ou não. Acho que isso é muito determinista e não gosto.
Acho que isso é um talento que pode ser trabalhado, todo mundo que quiser desenvolver essa habilidade pode desenvolver. E a gente começa se abrindo para o diálogo, escutando bastante, observando bastante e a partir daí pensando em como é que a gente pode colaborar para estabelecer essas conversas. É uma habilidade que a gente desenvolve.
Tem algum assunto que você não gosta de falar, que você foge?
Falo que na minha vida pessoal, às vezes, as pessoas me encontram e acham que eu vou falar um monte sobre política. E não falo nada.
Eu, aliás, falo muito menos sobre assuntos cabeçudos do que as pessoas imaginam.
Se você me chamar para essa conversa, tudo bem, mas eu não sou a pessoa que geralmente vai propor. Acho que tudo depende do ambiente. Agora, se me chamar para falar qualquer coisa sobre exatas, me dá um desesperozinho.
Fugiu completamente? Não. Eu preciso também me colocar nos lugares de desconforto.
A maternidade fez você mudar a maneira como se posiciona com o mundo? Pensa mais antes de entrar em embates?
Eu sempre pensei. Não entro nos embates por acaso. É muito deliberado. Fiz isso grávida e continuei fazendo.
Recentemente, eu me posicionei sobre a PL do aborto. Penso na melhor forma de fazer, no resultado que quero atingir, no tipo de debate que eu quero gerar, que tipo de reflexão quero incitar.Tenho muita responsabilidade por tudo que faço.
E conforme o meu espaço foi crescendo, me preocupo mais ainda com o tom correto, o que não significa que eu não vá errar. Mas eu sempre penso muito antes de fazer, sabe?
É muito difícil dialogar com quem pensa diferente, tem crenças diferentes? Você tem alguma dica para conduzir esse tipo de conversa?
Um dos meus truques é não me rotular com um posicionamento político. E já fui muito criticada por isso, por me acharem em cima do muro.
Acho que o rótulo afasta algumas pessoas. E tenho uma estratégia de tom. Sou uma mulher muito assertiva e objetiva.
Às vezes, suavizo o meu tom para conseguir alcançar mais ouvidos e penso muito no conteúdo, para ser algo que aproxima, que valida posições.
Para depois entrar, eventualmente, num debate um pouco mais difícil. Se eu puder, vou usar os meus canais para furar a bolha. A gente não precisa convencer a gostar de feijão quem já gosta de feijão.
Você é inspiração para muitas mulheres - e vi que até respondeu algumas DM´s. Te dá satisfação essa relação que o público desenvolveu com você? Se sente pressionada por isso?
Sou uma professora, sabe? Minha carreira tem várias coisas legais: falar para públicos enormes, ganhar dinheiro, ser reconhecida, ter acesso a um monte de coisas. Não minto.
Mas não tem nada mais legal do que cruzar com alguém que olha para você e fala: 'você mudou minha vida'. A sensação é de que você multiplicou o seu potencial de transformação. Não tem nada que se compare a isso.
Gosto da sensação que eu tinha na sala de aula quando você está explicando alguma coisa e percebe o clique, de agora aquilo faz sentido. Sinto, às vezes, a cobrança, mas vou continuar fazendo meu trabalho.
A Ava ainda é muito pequena, mas já dá para perceber pela personalidade dela se tem mais jeito para seguir seus passos ou lado músico do pai?
Eu acho que a melhor coisa que eu posso fazer por ela é não alimentar essas expectativas e deixá-la ser quem ela quiser de forma muito livre. Isso é uma coisa que me preocupa.
Às vezes, as pessoas olham para a minha filha e dizem que ela vai ser assim, assim, assado, só por ser minha filha. Ela não é a filha da Gabriela Prioli, ela é a Ava e precisa ser o que ela é.
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