Quer aumento? Perca o medo de pedir e confrontar, diz expert em liderança
Às vezes, é mais importante tomar um cafezinho no escritório do que dar conta de uma planilha que vai lhe tomar horas. Quem afirma é Hillary Sale, reitora da Universidade de Georgetown e presidente da Women's Leadership Initiative na Harvard Law School.
Ela esteve no Brasil em agosto para o Latin America Leadership Summit, promovido pelo Campos Mello Advogados em cooperação com o escritório americano DLA Piper. O grupo, presente em mais de 40 países, fez um ciclo de conversas sobre rumos de carreira feminina no Rio de Janeiro.
A ideia era promover a sororidade, debater e avançar em questões relacionadas à liderança, conversando sobre temas diversos em um tom de muita sinceridade.
Nessa conversa exclusiva com Universa, Hillary falou sobre a importância de a mulher dar visibilidade ao seu trabalho e às suas contribuições para ser valorizada, explicou como o networking pode ajudar e descreveu como vê as diferenças entre Brasil e EUA no que diz respeito às mulheres em cargos de chefia.
Hillary é diretora do DirectWomen Board Institute, organização sem fins lucrativos focada em aumentar a presença de mulheres advogadas nos conselhos de empresas públicas, sempre frisando que líderes devem assumir compromisso com o empoderamento e a representatividade das mulheres nas organizações para que trabalham.
Há retrocessos, claro, mas ela ainda vê tudo com um olhar positivo.
"Essas conversas são vitais, pois é assim que falamos sobre experiências compartilhadas e aprendemos sobre o que outras pessoas estão gerenciando e focando para que possamos compartilhar esse conhecimento e ampliá-lo", ela diz. Confira trechos da entrevista:
Apesar de termos falado tanto sobre o avanço das mulheres no mercado de trabalho e sobre como trabalhar melhor conosco mesmas, você vê retrocessos?
Acho que, como em muitas outras áreas, sempre que avançamos, damos alguns passos para trás. O objetivo é dar mais passos para frente e continuar avançando, sem se deixar desanimar ou frustrar pelo retrocesso. Não acredito que tudo seja perfeito. Mas acredito firmemente que sempre há mais que podemos fazer por nós mesmas. E, claro, as organizações também precisam fazer mudanças.
Em 2014, você ganhou o prêmio de Mulher de Negócios Influente. Como você esses 10 anos desde que recebeu o prêmio?
Fizemos progressos em muitos aspectos nos Estados Unidos, tanto para mulheres brancas quanto para mulheres pretas. Mas, ao mesmo tempo, no mesmo período, elegemos um presidente que foi condenado por agressão e tivemos muitas conversas complicadas sobre gênero.
Mas, quando olhamos para as estatísticas, vemos que fizemos alguns avanços. Temos uma porcentagem maior de mulheres em Conselhos de Administração nos Estados Unidos do que antes, na profissão jurídica, como parceiras, como sócias-gerentes, e estamos mais confortáveis em ter os tipos de conversas que tivemos no Brasil.
E você sente que estamos conversando sobre isso apenas entre mulheres ou que os homens estão tentando prestar atenção também?
Eu dou consultoria para CEOs e muitos deles são homens. No Brasil, participei do Latin America Leadership Summit, uma iniciativa do Fábio P. Campos Mello, sócio-administrador do Campos Mello Advogados em cooperação com DLA Piper, e com o apoio do Rafael Bussière, sócio do escritório na área de Direito Imobiliário. Ali, são considerados aliados no processo de reconhecimento e impulsionamento da carreira das mulheres.
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Quero receberAcho que isso é uma declaração poderosa sobre como querem conduzir o que gostariam de ver acontecer. A maioria dos CEOs com quem eu converso e trabalho nos Estados Unidos está comprometido em tentar abordar as questões quando surgem. Ainda acho que vamos avançar e retroceder porque somos todos diferentes, nossas experiências são diferentes, e leva tempo para juntar o conhecimento.
E quando falamos sobre essa receptividade, o que você aprendeu nesses dias no Brasil?
Estive no Brasil em 2023 e 2024. O Brasil é maravilhoso, diverso e mágico, e as mulheres são tão interessantes e tão interessadas em ter conversas! O que elas enfrentam é exatamente o que as americanas vivem, mas também diferente.
Quando há apenas mulheres na sala, o desejo pela conversa e o senso de comunidade, com profundidade e com honestidade, são empoderadores.
Explica melhor as diferenças entre o Brasil e os EUA sob o ponto de vista dos direitos das mulheres?
Em todo lugar, mulheres enfrentam desafios e oportunidades no local de trabalho para alcançar tudo o que são capazes. E, no Brasil, senti uma certa hesitação em ser franca sobre isso. Fiz um programa em Londres e alguém lá disse: "Vocês americanas são tão francas, eu adoro isso".
E acho que isso não é apenas no Brasil; é um pouco da cultura latina, uma comunicação um pouco mais indireta, que não confronta. Isso é uma bênção e uma carga e às vezes nos atrapalha.
E você acha que as pessoas têm entendido aqui a importância da interseccionalidade?
Nos Estados Unidos, a interseccionalidade é realmente importante. E pensamos sobre isso, mas frequentemente encontro mulheres (pretas, não-binárias ou com outras características demográficas) que não se identificam como um mesmo grupo. Se nos unirmos como mulheres e deixarmos de lado algumas dessas outras identidades, faremos mais progresso mais rápido. Porém, eu entendo que isso é complicado. Eu só tenho uma experiência vivida e é como uma mulher branca.
Você acha que tem acontecido uma banalização da sigla ESG? O que você sente que vem acontecendo com essa agenda?
Há retrocesso nos Estados Unidos também, o que é lamentável. Vejo a letra S do ESG como sustentabilidade, não no sentido ambiental, mas no sentido do capital humano.
Não podemos realmente funcionar no nosso nível mais alto, não podemos crescer tanto quanto gostaríamos como uma empresa, como um país, e nenhuma empresa pode crescer tão rápido e de forma eficaz quanto gostaria sem prestar atenção ao capital humano.
E acontece que, no mundo de hoje? O capital humano é muito mais diverso do que era há 50 ou 100 anos, e precisamos de toda essa diversidade, por várias razões. No sentido mais amplo do termo, é isso que produz inovação, e sem ela, não se continua crescendo.
No Brasil, assim como nos EUA, temos um percentual significativo de mulheres pretas, mas não as vemos em posições de liderança. O que mulheres brancas podem para resolver essa lacuna?
Preciso dizer novamente que eu só tenho uma experiência vivida: como uma mulher branca. A discriminação que algumas mulheres de cor e mulheres negras enfrentam é muito complicada de maneiras que eu posso tentar entender, mas talvez nunca compreenda completamente.
É frustrante ver que, por exemplo, no Brasil, vocês fizeram algumas mudanças nas universidades públicas para garantir que mais pessoas tenham oportunidade [ela se refere às cotas]. Isso está ainda muito embaixo e gostaríamos de ver mudanças lá em cima. Só que se leva muito tempo para avançar até lá.
A própria política de cotas incomoda muita gente. É como se no Brasil as pessoas tivessem lutado muito para chegar onde chegaram e agora ninguém entendesse a importância de ver o outro...
Acho que há algumas coisas que mulheres e homens podem fazer. Uma delas é serem melhores aliados. Quando alguém trata uma mulher de uma forma que parece inadequada, eu adoraria que um homem reclamasse em vez de só eu falar.
Precisamos trabalhar para sermos bons mentores uns para os outros. Quando você tem uma oportunidade de liderar, traz com você todas as pessoas que podem se beneficiar. Isso é crucial e eu sei que há resistência e é difícil, mas temos que ser resilientes.
Sobre as redes e programas de mentoria, o que você poderia me dizer? Como você trabalha com isso?
O bom trabalho é a base. As relações de trabalho são o que te fazem subir. Quanto mais forte for sua rede de colegas, mais rápido e melhor você conseguirá fazer seu trabalho. Mas se não desenvolver essas relações, não terá isso.
É preciso ter confiança, de longo prazo, que ajudam a avançar na carreira e que são vitais.
Mas quando são cinco homens ali tomando café, é difícil para a mulher entrar nesse grupo. Então, você escolhe a parte de fazer o trabalho e ninguém vai te demitir por isso... Exatamente, infelizmente é isso que acontece.
E como negociar o salário? Falar sobre dinheiro é difícil para todos, mas os homens têm sucesso e as mulheres nem sempre.
Bem, eu sempre digo que me importo com o dinheiro, e a razão pela qual sempre digo isso é porque acho que as mulheres não gostam de falar sobre dinheiro e realmente precisamos nos sentir mais confortáveis com isso. Saiba o quanto vale a pena negociar.
Se você não pedir, não recebe. Esteja preparada para explicar por que isso é bom para a organização, e não apenas para você.
E apesar de eu me importar com dinheiro, há outras coisas que podem ser negociadas às vezes. Talvez você possa se beneficiar com uma bolsa na graduação. Isso é dinheiro, só que de um tipo diferente. Nem sempre o reconhecimento vai no salário.
Você mencionou a frase: "Se você não pedir, não vai conseguir." E às vezes você pede e não consegue. Como você lida com isso?
Eu continuo tentando. Vou dar um exemplo pessoal: falei com várias empresas sobre estar em seus conselhos de administração. Nem todas essas conversas resultaram em uma oferta real para o conselho. Se eu tivesse desistido porque não consegui a primeira ou a segunda, não teria conseguido a terceira. E às vezes, não se trata de você; é sobre o timing, é sobre um conjunto diferente de habilidades.
Você pode fazer todo o trabalho e toda a preparação e ser supertalentosa, e ainda assim haverá uma parte de sorte. É preciso ter a oportunidade certa no momento certo. Se não continuar pedindo, acabará perdendo. Uma pesquisa sobre mulheres e desenvolvimento de negócios mostra que leva de 10 a 12 pedidos para conseguir montar um negócio.
Se você parar no primeiro ou segundo porque se sentiu mal por ter sido rejeitada, está se excluindo.
O que você diria aos líderes de 2024 para tornar esses ambientes um pouco mais úteis e para empoderar as mulheres?
Prestem atenção na inclusão. Estamos sempre trazendo diversidade, mas precisamos garantir que estamos criando uma atmosfera inclusiva. Vou dar alguns exemplos práticos.
Nós somos interrompidas mais do que nossos colegas homens. Então, precisamos ter reuniões onde a regra seja não interromper por que isso não é aceitável. Vamos bloquear isso e deixar as pessoas terminarem suas ideias.
Isso cria mais inclusão e mais disposição das pessoas para compartilhar pensamentos. Outro exemplo prático é: se você está em uma sessão de brainstorming ou trabalhando no início de uma reunião, todos falam uma vez antes que alguém fale duas vezes.
Vamos dar a volta na mesa e ouvir todas as vozes antes que alguém fale duas ou três vezes. Essa é uma boa regra de inclusão.
Eu não sei como aplicar isso em uma reunião, mas parece ótimo.
A melhor maneira de aplicar essas regras é ter alguém designado para a reunião, para ser o responsável pelas regras — o "policial" da reunião. Por exemplo: "Espere um pouco, Hillary. Vamos continuar ao redor da mesa e depois voltaremos para você."
Você mencionou que as mulheres são muito capazes, mas muitas vezes não confiam em si mesmas. Como você aconselharia as pessoas a aumentar essa autoconfiança?
As melhores oportunidades são as que nos desafiam, que nos tiram da zona de conforto. Você não precisa ser perfeita, só precisa ter um bom desempenho. É assim que você vai se destacar. E, claro, peça ajuda a outra pessoa se estiver preocupada.
Mas e quando você não confia em ninguém?
Eu gosto de ter um "conselho pessoal de diretores", pessoas com quem posso conversar e que me dizem: "Oh, por favor, você consegue fazer isso."
E no ambiente universitário, o que você vê sendo feito que é novo?
Os jovens têm muito a nos ensinar, porque alguns conceitos antigos podem estar ultrapassados. Devemos ouvi-los, mesmo que não estejam 100% certos.
Onde eles estão errados?
Eu acho que, tanto no Brasil quanto nos EUA, após a pandemia, muitas pessoas preferem trabalhar de casa mais frequentemente. A geração mais jovem está realmente pressionando por isso, e eu entendo o desejo por flexibilidade. Mas o que acho que eles não entendem é que nunca construirão as relações necessárias para o sucesso se não forem ao escritório regularmente.
E precisamos estar no escritório também. Não podemos esperar que eles sejam os únicos a ir ao escritório enquanto os mais seniores não vão. E é verdade que podemos ser mais flexíveis sobre essas escolhas do que fomos antes. Isso é algo que eles podem nos ensinar.
Ao mesmo tempo, pelo menos na minha experiência nos EUA, e eu perguntei sobre isso no Brasil e ouvi a mesma coisa, eles superestimam o que podem fazer à distância.
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