'Descobri câncer de mama no começo da minha gravidez, foi devastador'
Hysa Conrado
Colaboração para Universa
24/10/2024 05h30
A maternidade era um sonho constante na vida da fisioterapeuta Paola Passos, de 40 anos. Para conseguir engravidar da primeira filha, a Clara, ela recorreu à fertilização in vitro e, pouco tempo depois, engravidou naturalmente de Liz, sua caçula. O que ela não esperava é que teria de lidar com uma companhia indesejada nesta última gestação: um câncer de mama agressivo, já em fase de metástase - quando as células cancerígenas começam a se espalhar.
Grávida de três meses quando recebeu o diagnóstico, Paola conta que sua primeira reação foi a de se afundar.
Me senti impotente, fraca, frágil e incapaz. Pensei: eu vou morrer, como vou dar a vida para essa bebê que está no meu ventre sendo que meu corpo está doente? Fiquei duas semanas chorando, não conseguia dormir nem comer.Paola Passos, fisioterapeuta
A volta por cima veio depois que ela e o marido decidiram fazer uma viagem e ficaram hospedados por alguns dias em um hotel em meio à natureza, onde Paola conseguiu se reconectar consigo mesma e encontrar a força que precisava para seguir a jornada que se anunciou.
Decidi que ia curtir a gestação mesmo com tudo isso, que faria o chá revelação da minha filha, porque se eu não tivesse viva depois ela saberia que fui muito feliz com ela no meu ventre.Paola Passos, fisioterapeuta
Com um tumor de nove centímetros que preenchia toda a mama e já havia se estendido para os linfonodos da axila, Paola conciliou a gravidez com a quimioterapia e diz que não lidou com muitos desconfortos em função do tratamento.
"Passei bem pela quimio. Apesar de sentir uma fraqueza muito grande e precisar repor sangue, consegui sair com minhas amigas e com meu marido. Fui ao show da Marisa Monte de cadeira de rodas porque estava fraca para andar, mas eu me sentia com um astral bom", conta.
Sua filha Liz, que agora está com dois anos, nasceu no fim do oitavo mês da gestação, mas sem complicações. Para a mãe, foi fundamental o apoio que recebeu da equipe médica durante o período em que esteve grávida.
"Acho que ser acolhida é o mais importante, porque se fosse um médico que me alarmasse, eu não saberia como lidar com a situação. O meu médico sempre ia na quimio, passava a mão na minha barriga e dizia que a gente ia conseguir, que minha filha ia nascer linda e perfeita. A minha obstetra me chamava para conversar e me escutava, tive muito apoio", lembra.
Afora a frustração de não poder amamentar a filha por conta da quimioterapia, Paola deu seguimento ao tratamento após o parto, passou pela mastectomia e é considerada uma pessoa curada. No seu Instagram, ela fala sobre a importância da prevenção e do autoexame. "O câncer hoje em dia não é uma sentença de morte, a medicina está muito avançada. Se eu tivesse com esse câncer há dez anos seria outro cenário", afirma.
Gravidez não é obstáculo para o tratamento
Paola amamentava a primeira filha quando começou a sentir uma fisgada que ia até a ponta do seio e, ao se tocar, percebeu um nódulo ondulado. Mesmo estando com os exames em dia, voltou a fazê-los por indicação do médico e só recebeu o diagnóstico correto quando já estava grávida. O tumor se formou em menos de um ano desde sua última consulta de rotina até aquele momento.
Por isso, é fundamental que as gestantes tenham as mamas examinadas durante o pré-natal, segundo Laura Testa, oncologista da Rede D'Or e chefe do grupo de oncologia mamária do ICESP (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo). "As pacientes gestantes acabam chegando com a doença em um estágio mais avançado pela mama estar mais difícil de apalpar", afirma.
Apesar de alguns tratamentos não serem possíveis durante a gestação, a especialista explica que a gravidez não é um obstáculo para tratar o câncer. A hormonioterapia é contraindicada nesses casos, assim como a radioterapia que, salvo raras exceções, deve ser evitada. Mas há a possibilidade de realizar a mastectomia e a quimioterapia de maneira segura.
"A cirurgia pode ser feita a qualquer momento da gestação, mas é importante que seja rápida e realizada por uma equipe habilidosa, para reduzir o tempo de exposição da paciente ao anestésico. O risco da operação no final da gestação é induzir o trabalho de parto", explica. Esse também é o motivo pelo qual a reconstrução mamária costuma ser adiada para depois da gravidez.
Segundo a oncologista, a quimioterapia não pode ser feita no primeiro trimestre da gravidez, porque é nesse momento que o bebê está sendo formado. Depois disso, o tratamento é considerado seguro, com dados extensos que comprovam isso.
"Para a paciente, atrasar o início do tratamento para o bebê nascer pode fazer não só a situação dela piorar, como trazer consequências piores para o feto. Deixar uma doença sem tratamento durante a gestação costuma ser muito mais grave", afirma.
Ainda assim, ela alerta para a possibilidade de o bebê nascer prematuro por conta da condição da mãe. Também existem situações em que a equipe médica pode decidir por antecipar o parto, para que a paciente seja tratada como uma pessoa não gestante.
"Trazemos o obstetra para o nosso time e é preciso ter uma parceria muito grande. O obstetra é fundamental para garantir a idade gestacional, a melhor avaliação possível e decidir o momento de iniciar o tratamento da melhor forma", explica a especialista.
A atenção multidisciplinar com a mãe é importante também após o parto, momento em que ela pode passar por novas etapas do tratamento, como a possibilidade de fazer radioterapia e hormonioterapia a depender do seu quadro.
"Ela também vai ser cuidada pelo ginecologista. Para todas as mulheres, o puerpério é um momento de maior risco para trombose. Então, essa é uma questão em que vamos ficar muito atentos, porque isso pode se somar aos riscos do tratamento", destaca.