Puerpérios totalmente diferentes: após filho prematuro, adotei minha filha
Ao ficar hipertensa durante a gestação de Pedro, a pesquisadora Vanessa Olzon Zambelli, 43, não quis mais gestar e recorreu à adoção para ter o segundo filho. Após sete anos de espera, Emily chegou à família.
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Nesse depoimento, Vanessa conta a diferença do puerpério pós-gestação e pós-adoção, fala da experiência de ter tido uma doula de adoção e afirma que ambas as maternidades foram construídas com amor: "O amor é pelo indivíduo, independe de como ele chegou na sua vida". Conheça sua história:
"Em 2012, aos 31 anos, engravidei do meu primeiro filho, o Pedro. Minha gestação foi tranquila, mas na 30ª semana desenvolvi hipertensão. Tive que fazer repouso e antecipar o parto. A cesárea foi agendada de um dia para o outro porque Pedro não estava crescendo conforme o esperado por conta da minha pressão. Foi uma correria, tive que cancelar o chá de bebê e uma amiga fez um enfeite para a porta da maternidade de última hora.
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Pedro nasceu de 33 semanas e com 1,5 kg. Ele ficou 28 dias na UTI. Eu passava o dia no hospital com ele, chegava às 7h e ia embora às 22h. Meu marido, o Julio, só teve cinco dias de licença-paternidade.
O puerpério foi delicado, me preocupava com a prematuridade do Pedro e tinha medo de ele ficar com alguma sequela. Durante a internação, ele não teve nenhuma intercorrência grave, mas o ambiente de UTI é muito hostil, vi vários casos difíceis e algumas famílias perdendo seus bebês.
Quando o Pedro teve alta, foi desafiador ter um prematuro em casa, a parte mais difícil foi o ganho de peso. Ele não mamava bem, eu oferecia o peito e tirava o meu leite para dar na mamadeira. Na época, eu estava em fase inicial de carreira, era bolsista de pós-doutorado, mas como não tinha direito à licença-maternidade tive que interromper os estudos para cuidar dele.
Me cobrava para ser uma boa mãe e suprir as necessidades dele, mas também me cobrava para continuar produzindo e me sentia ficando para trás. Nos primeiros meses, minha mãe me ajudou com o bebê e com as tarefas de casa. Ele se desenvolveu bem e se tornou uma criança saudável.
Sete anos para adoção
Quando Pedro completou dois anos, senti vontade de ter um segundo filho, mas não estava disposta a engravidar novamente, porque fiquei hipertensa após o nascimento dele e não queria colocar minha vida e nem a do bebê em risco com uma nova gestação.
Antes do Pedro nascer, eu e o Julio já tínhamos conversado sobre a possibilidade de adotar, mas sem saber ao certo a real motivação por essa via de parentalidade. Quando decidimos aumentar a família, fomos até a Vara da Infância e demos entrada no processo de adoção em 2014.
Em uma das palestras entendi que adoção não é caridade e que não deveria ser o propósito pelo qual a gente adota um filho. Foi um choque de realidade, mas aos poucos fui amadurecendo a ideia e me sentindo segura com a minha escolha, eu queria adotar porque queria ter um segundo filho.
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Quero receberDa entrega dos documentos até a chegada da minha filha Emily foram sete anos. Nossa posição na fila era 181, toda vez que ia consultar para ver se havia mudado, eu voltava triste, parecia uma eternidade. Em 2019 fomos morar fora do Brasil a trabalho, e em 2020 começou a pandemia.
Nesse mesmo ano, recebemos um e-mail do serviço social e psicologia da Vara da Infância falando sobre a Emily. A equipe explicou que, por causa da pandemia, o processo estava ocorrendo de forma remota, o que nos permitiria iniciar a aproximação por videochamada ou vídeos gravados. Nós sempre aparecíamos com um coelhinho de pelúcia, pois achávamos que um objeto infantil poderia ajudar a criar um vínculo.
O primeiro contato físico da Emily com a nossa família foi com os meus pais. Um dia eles foram visitá-la no acolhimento, mas ela não demonstrou interesse em se aproximar. Conversei com a minha mãe, disse que eu entenderia se ela tivesse medo de lidar com uma aproximação difícil por parte da Emily e pelos riscos de contaminação de covid. Minha mãe disse: "Ela já é minha neta. O que não fazemos por um neto? Vou até o final com você custe o que custar". Foi assim que meus pais participaram do "parto" da minha filha.
Meu irmão, minha cunhada e minhas sobrinhas também se envolveram no processo. Eles levaram a Emily para passear, ela passou o Natal com eles. Eu, meu marido e o meu filho participávamos desses momentos por videochamada. Eu sentia um misto de alegria e de angústia por estar à distância. Durante o processo, algumas fronteiras foram fechadas e nosso voo para retornar ao Brasil foi alterado algumas vezes, mas no fim deu certo.
No começo, Emily me chamava de tia
Em janeiro de 2021 conhecemos nossa filha pessoalmente, ela nos recebeu super bem. Ela correu para os meus braços, gritou papai e grudou no Pedro. A adaptação com ela foi uma festa seguida de caos. Eu e o Pedro pegamos covid na volta da viagem, ficamos duas semanas confinados em uma casa cheia de malas, sem móveis e sem espaço para as crianças brincarem.
No início, Emily me chamava de tia, preferia o pai, e sempre que possível, me evitava e chamava o Julio para ajudá-la. Pedro ficou feliz com a chegada da irmã, mas passada a euforia, ele percebeu que após anos sendo filho único, teria que dividir a nossa atenção com uma outra criança. Emily tinha três anos, era carinhosa e engraçada, o que causava ciúmes nele. Foram três meses de ajustes até Pedro achar o espaço dele nessa nova configuração familiar, hoje ele não se imagina sem a irmã.
Doula de adoção me deu apoio emocional
Vivi dois puerpérios totalmente diferentes. Após o nascimento do Pedro, tive que lidar com um bebê prematuro que precisava de cuidados, ganhar peso e não ficar doente. No puerpério pós-adoção tive muitas alterações de humor e me vi diante de dois filhos com demandas diferentes.
Não tive uma doula no parto do Pedro, mas tive uma doula de adoção, a Mayra Aiello, que me deu apoio emocional, força e conhecimento para enfrentar as circunstâncias. Ela me ouviu, me ajudou com estratégias para lidar com a ansiedade, a distância, o ciúmes do Pedro, me deu sugestões de filmes, livros, brincadeiras, me auxiliou em questões envolvendo entraves jurídicos e trabalhistas relacionadas ao direito da mulher.
Gestação e adoção têm semelhanças e diferenças
Acredito que tanto o gestar quanto o adotar geram dúvidas e curiosidades sobre como será a criança. Claro que a gestação tem uma mudança física no corpo, os sintomas, a disposição. Gostei de gestar, não me arrependo de ter vivido essa experiência, mas também não me arrependo de não ter repetido.
Na adoção a espera é maior, quase desisti de esperar. Não tinha certeza se renovaria a documentação e se continuaria na fila para a adoção. Eu já estava com 39 anos e não me via mãe de um bebê pequeno.
Ao ver o Pedro com 12 anos, e a Emily com 7, aprendi que filhos são sempre diferentes uns dos outros, mesmo quando todos vêm por gestação. O amor é pelo indivíduo, independe de como ele chegou na sua vida, cada um tem a sua beleza e seus desafios.
No dia a dia esqueço que cada um chegou na família de um jeito, mas acho importante que a Emily não esqueça as suas origens e a sua história. Ambas maternidades foram planejadas, pensadas e construídas com amor com o Julio, meu companheiro de vida. Amo meus dois filhos incondicionalmente e cuido deles da melhor forma que sou capaz. Minha família é o meu porto seguro".
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