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Elas são praticantes de bruxaria: o que é paganismo e como chegou ao Brasil

Wiccas rezam ao redor de uma fogueira durante o Imbolc, o sabá sazonal em homenagem a Brigid, uma deusa celta de origem irlandesa, no Rio de Janeiro Imagem: Getty Images

De Universa

07/01/2025 05h30

Brenda, 23, nasceu em um lar católico em Uiraúna, interior da Paraíba e, ao mudar para São Paulo, se aproximou da igreja evangélica, mas foi no paganismo que ela conseguiu encontrar um caminho para viver a espiritualidade. Conhecida nas redes sociais como Artemísia, Brenda, que estuda ciências biológicas, se considera bruxa e é dona de uma loja online que vende produtos como ervas e cristais.

Brenda se convertou ao paganismo porque buscava mais conexão com a natureza Imagem: Arquivo pessoal

Quando conheci a bruxaria foi porque estava procurando uma religião com alguma prática que cultuasse a natureza. Pensei: será que existe uma religião que enxerga a natureza como divina? Aí pesquisei e a partir daí entrei em contato com a Wicca, a bruxaria e todo esse meio do paganismo. Tinha 15 anos e desde então venho aprendendo mais sobre isso com alguns mentores que estão me guiando. Atualmente, me considero praticante de bruxaria, conta ela a Universa.

Há cerca de 30 anos, Tânia Gori, 55, também buscava retomar uma prática que, segundo ela, remontava a própria ancestralidade.

"Minha bisavó era da Romênia e se mudou para o Brasil. Ela era cigana e tinha conhecimentos de ervas que vinham dessa tradição. A minha avó me introduziu a esse meio. Cresci com um pé no catolicismo por uma convenção social, mas no começo dos anos 1990 conheci a bruxaria e vi que esses conhecimentos de ervas, cristais e oráculos estavam muito associados a isso."

Desde 2003, Tânia está à frente da Convenção de Bruxas e Magos do Brasil em Paranapiacaba (SP). Além disso, ela é dona da Casa de Bruxa, em Santo André.

"Hoje já não acredito em uma religião única. Acredito em uma espiritualidade livre onde as pessoas acreditam no que faz sentido para cada uma, sem uma imposição de um líder religioso", diz ela, ressaltando que muitos deles aparecem envolvidos em escândalos.

"Acho que as pessoas estão procurando em uma filosofia, uma espiritualidade livre, uma regeneração de fé, de acreditar em energias da natureza, na força dessa Mãe, que leva um nome em cada cultura."

O que é paganismo?

Espiritualistas celebram o solstício de verão (meio do verão e dia mais longo) nas antigas pedras de Stonehenge Imagem: Getty Images

Paganismo é como foi chamado pelos cristãos o conjunto de crenças politeístas da Antiguidade. O conceito tem origem no latim "paganus", usado pelos romanos para designar os camponeses de forma pejorativa.

Mais adiante, foi apropriado pelos cristãos para designar qualquer pessoa que não estivesse seguindo os princípios cristãos. Por paganismo, entende-se o conjunto de crenças politeístas, como, por exemplo, o panteão da Grécia antiga, que cultuava deuses como Zeus e Atenas, ou ainda o egípcio antigo, com figuras como Ísis e Osíris.

Muitas crenças sofreram perseguição na Europa, mas ao longo do século 17 e, especialmente em 1960, houve um grande movimento de recuperação das práticas: o neopaganismo. O prefixo "neo" indica que essa corrente está ligada a um novo contexto. Segundo Raisa Sagredo, doutoranda em História e membro do Meridianum/UFSC (Núcleo Interdisciplinar de Estudos Medievais da USF), esse novo momento surge a partir de um desejo de reconstrução de paganismos antigos, especialmente os gregos e celtas.

O Neopaganismo tem um boom na década de 1960 nos EUA, mas não surge ali. Já no século 19 e 20 existem intelectuais que estão buscando mitologias antigas, como a celta, em um contexto de identidades nacionais europeias que estavam sendo geradas naquele momento. De toda forma, esse Neopaganismo pode ser descrito como um grande guarda-chuva onde existem várias vertentes ou tradições, ou seja, diversas religiosidades, como a Bruxaria Contemporânea, onde destaca-se a Wicca, que é o representante mais expressivo.
Raisa Sagredo, doutoranda em História e membro do Meridianum/UFSC

Raisa Sagredo é pesquisadora sobre o tema Imagem: Arquivo pessoal

No Brasil, essa expressão se mesclou com outras crenças e religiões. Diferentemente do que ocorre na Europa, por exemplo, onde surgem expressões como a Wicca, uma religião politeísta influenciada por crenças pagãs antigas, no Brasil o neopaganismo tem algumas especificidades.

A primeira é que datas importantes, como os solstícios, caem em momentos do ano diferentes do que no hemisfério norte, diferenciando datas do calendário de ritos para algumas dessas religiosidades em território brasileiro.

Além disso, algumas religiões - seja em práticas de grupo ou individuais - dialogam com outras expressões religiosas - como as de matriz africana, se expressando de forma sincrética.

Outro aspecto é que as festividades pagãs adaptam também às características climáticas de cada região do país, com seus frutos e alimentos típicos substituindo alimentos tradicionais das celebrações da realidade europeia.

No caso da Wicca, criada no início da década de 1950 pelo ocultista e folclorista Gerald Gardner, houve um grande desenvolvimento na literatura nos anos 1970, e a partir de 1980, a Wicca passou pelo momento de divulgação nos países de língua inglesa. A partir de 1990, essa religião passa por um processo de internacionalização, momento em que chega ao Brasil, tendo recebido diversas influências, como da cultura Nova Era, por exemplo. Autores bruxos foram então traduzidos, e as ideias disseminadas. Como resultado, em solo brasileiro, alguns grupos e algumas pessoas em suas práticas individuais englobam adaptações em diferentes níveis, desde a substituição de datas de ritos da Roda do Ano até diálogos com diferentes divindades de outras matrizes, como africana e indígena.
Raisa Sagredo, doutoranda em História e membro do Meridianum/UFSC

Ele está 'em alta'?

O neopaganismo sempre esteve presente na sociedade, mas agora há um novo fator: as redes sociais. No Tiktok, por exemplo, a #WitchTok - que mescla Bruxa, em inglês, com o nome da rede, tem mais de 6,9 milhões de publicações. A hashtag foi ainda mais forte na época da pandemia, em 2020, trazendo referências a diversas práticas esotéricas e ocultistas.

Raisa Sagredo acredita que essa visibilidade parte do contexto de um movimento global de se voltar para a natureza.

Há dois contextos [para essa maior visibilidade]. Um é o da pandemia da covid-19 e o outro o da crise climática. A morte parece mais próxima e se passa a repensar questões da condição humana, voltando-se para si, e para a Terra enquanto sistema, em meio aos crescentes impactos das mudanças climáticas. Esse pano de fundo de crise global traz a possibilidade das pessoas terem mais interesse nesses assuntos de cunho metafisico e transcendental. A #witchtok, que é uma forma viral de espiritualidade, engloba material audiovisual em torno de temas como Neopaganismos diversos, oráculos, medicinas alternativas, simpatias, sagrado feminino, astrologia, plantas medicinais, invocações e várias outras práticas.
Raisa Sagredo, doutoranda em História e membro do Meridianum/UFSC

Mas a viralização pode estar simplificando crenças complexas. Sagredo explica que muitos Neopaganismos se baseiam em cerimônias e em conjuntos de crenças complexas que não partem de simplificações nem dualidades.

Algumas religiões, como tradições de Bruxaria Contemporânea, por exemplo, envolvem uma jornada de estudos e iniciações em termos práticos. Assim, muitos dos conteúdos publicados dentro dessa lógica da rapidez midiática e viral podem estar esvaziando práticas complexas.

O que percebi ao analisar a #witchtok no TikTok, é que se acaba rompendo com o tempo de maturação das práticas e dos ritos de passagem, porque ali na internet, e principalmente em plataformas de vídeos de curtíssima duração, existe outro tempo, mais instantâneo. Isso atropela processos que são importantes no nível micro, ou seja, do ser humano e da psique. Em outras religiões você também tem essas etapas, não é algo exclusivo de religiões neopagãs. O que alguns praticantes estão comentando sobre essa forma viral de bruxaria no caso da #witchtok, é que há uma questão de responsabilidade para com certas práticas que demandam outro tempo de maturação, compreensão e imersão para se fazer operações mágicas, por exemplo, como na Bruxaria. Assim, essa viralização teria esse aspecto negativo, de acelerar e simplificar práticas complexas.
Raisa Sagredo, doutoranda em História e membro do Meridianum/UFSC

Foi inclusive no TikTok que Brenda encontrou as respostas que buscava para a espiritualidade. Segundo ela, o movimento das pessoas de falar e mostrar práticas incentivou ela a fazer uma imersão no tema — e também produzir conteúdo. Por meio da publicação de vídeos ela encontrou quem hoje chama de mentores na bruxaria.

Um dos meus mentores conheci depois que ele comentou em um vídeo que publiquei. Ele questionou algumas coisas que fiz e depois acabei virando aprendiz dele. Aconteceu por acaso. A outra pessoa me dá aulas sobre bruxaria folclórica de tradição eslava. Eles me apresentam práticas para depois eu seguir o meu caminho.
Brenda, 23

E como vivem os pagãos?

Para Brenda, a principal prática é buscar manter sempre o contato com a natureza.

"De manhã quando acordo e preciso ir para academia, por exemplo, faço um caminho a pé de 30 minutos que considero para me conectar com a natureza porque passo por lugares arborizados. Começo a desfrutar mais essa caminhada, coisa que antes não faria porque a rotina de uma pessoa adulta é corrida. Como sou estudante de ciências biológicas, também já vou aproveitando para fazer um mapeamento de plantas. Temos que aproveitar esses momentos da rotina."

Tânia Gori se identifica como bruxa há mais de 30 anos Imagem: Arquivo pessoal

E Tânia acredita que é trazer mais magia para o dia a dia. "Sempre tento colocar isso na rotina. Por exemplo, se um dia estou com uma garganta inflamada, faço um chá para isso. Se vou dar uma entrevista, vou usar uma roupa azul, para facilitar a comunicação. São coisas simples que vão acontecendo e acrescentando magia."

Estamos em uma sociedade com um foco patriarcal e temos rotulações demais. O ser humano é natureza e a natureza é o ser humano. Cada cultura e religião vai nomear aquela natureza, mas no final, todo ser humano, independente dessa rotulação, está em busca de amor, saúde, bem-estar e harmonia. E quando encontramos uma espiritualidade verdadeira, encontramos todas essas energias na vida.
Tânia Gori, 55

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