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Vítimas de abuso por Trump enfrentam retorno à Casa Branca: 'Será pior'

Amy Dorris com Trump no torneio de tênis US Open Imagem: Arquivo pessoal

Sofia Pilagallo

Colaboração para Universa

10/01/2025 05h30

"Incrédula", "enojada" e "desiludida": essas são algumas das palavras usadas por três mulheres para descrever como reagiram ao descobrir que Donald Trump retornaria à Casa Branca em 2025.

Amy Dorris, Natasha Stoynoff e Beatrice Keul contam que foram abusadas sexualmente por Trump décadas atrás. Os casos delas não foram a julgamento, mas seus relatos vieram a público em jornais americanos e britânicos.

A Universa, elas contam suas histórias e o que preveem para o futuro do país. Procurado por meio de sua assessoria, Trump não comentou.

'Me agarrou'

Amy Dorris, 52, de Michigan, conta ter sido agredida sexualmente por Trump na primeira semana de setembro de 1997. Seu relato se tornou público em 2020, no jornal The Guardian.

À época, ela trabalhava como modelo e foi convidada para assistir ao torneio de tênis US Open, em Nova York, no camarote de Trump. Ao sair do toalete, ela conta que teve uma surpresa nada agradável.

Trump me agarrou e tentou me beijar. Eu o empurrei para longe e ele continuou a me agarrar e me apalpou por todo o corpo. Tive de empurrar a língua dele para fora da minha boca com os dentes. Disse que estava no evento com meu namorado e pedi para que me deixasse em paz, até que finalmente consegui me soltar.
Amy Dorris

Amy afirma ter ficado "chocada" com a agressão e que, à época, se culpou pelo ocorrido. Acreditava que o episódio fora motivado por algo que ela havia feito. Hoje, acredita que esse é o modus operandi de Trump.

Esse entendimento veio após o vazamento de um vídeo, em 2016, em que Trump, sem saber que estava sendo gravado, se gaba de apalpar e assediar mulheres.

A imagem, de uma fita de vídeo gravada em 2005, foi divulgada pelo jornal americano The Washington Post um mês antes das eleições, em 2016. O material abalou a campanha de Trump, mas não o suficiente para derrotá-lo.

"Trump descreveu literalmente tudo o que fez comigo", diz ela. "Aquilo me fez perceber com mais profundidade o que tinha acontecido."

Amy Dorris com Trump no torneio de tênis US Open Imagem: Arquivo pessoal

Amy não denunciou Trump pelo que ocorreu. Ela acredita que, se tivesse tentado fazer isso, teria sido descredibilizada.

"Não me arrependo de não tê-lo denunciado à época, porque nada teria acontecido. Teria sido traumático. Você acha mesmo que eles [os policiais] teriam feito algo contra Trump, sendo que ele era o dono do camarote?"

'Será muito pior'

Desde a década de 1970, 28 mulheres foram a público para acusar Trump de agressão sexual. A única que ficou conhecida por ter denunciado formalmente o republicano foi a jornalista Elizabeth Jean Carroll.

Amy e as outras 27 mulheres formaram um grupo de apoio, o Trump Survivors Against Trump ("Sobreviventes de Trump contra Trump"). Em 2020, quando Trump perdeu as eleições, o grupo se reuniu pelo Zoom para celebrar.

"Em 2020, estávamos comemorando porque achávamos que ele não voltaria. Há uma espécie de irmandade entre nós", diz Amy, acrescentando que o grupo não sabe ao certo o que fazer agora.

Estamos apenas tentando manter um espaço seguro para as sobreviventes de Trump. Sinto que o retorno dele à presidência terá efeito sobre todas. Não será como da última vez. Será muito pior.
Amy Dorris

'Me empurrou contra a parede'

A jornalista Natasha Stoynoff, 59, de Toronto, também faz parte do grupo "sobreviventes de Trump". Ex-repórter da revista People, ela foi designada, no início dos anos 2000, para fazer a cobertura jornalística de assuntos relacionados ao magnata.

Ela conta que sofreu a agressão sexual em dezembro de 2005. À época, a esposa, Melania, estava grávida do primeiro e único filho do casal.

Natasha depôs em julgamento de outro caso que culminou na condenação de Trump Imagem: Arquivo pessoal

No dia da agressão, Natasha tinha ido à residência de Trump —o luxuoso resort Mar-a-Lago, na Flórida— para entrevistar o casal e fazer fotos para uma reportagem sobre o aniversário de casamento. Em dado momento, Melania subiu para trocar de roupa. Enquanto a esposa se arrumava, ele se ofereceu para mostrar a residência à jornalista.

Trump me disse que havia um cômodo em particular que eu tinha de conhecer. Entramos naquele quarto sozinhos, e então ele fechou a porta atrás de nós. Eu me virei e, em questão de segundos, ele estava me empurrando contra a parede e forçando sua língua na minha boca.
Natasha Stoynoff

"Fiquei atordoada. E grata quando o mordomo de longa data de Trump entrou na sala enquanto eu tentava me soltar. Ele nos informou que Melania desceria em breve", diz.

Após a agressão, Natasha relata ter ficado "em choque" e permanecido em silêncio enquanto ela e Trump seguiam o mordomo até o pátio externo. Naqueles poucos minutos a sós com ele, lembra, a autoestima dela "caiu a zero".

"Uma hora depois, de volta ao hotel, o choque deu lugar à raiva. Eu ficava pensando: 'Por que não dei um soco nele? Por que não consegui dizer nada? Por quê?'"

Assim que retornou à redação da People, Natasha foi falar com sua supervisora. Em lágrimas, contou o que ocorrera e pediu para ser trocada de editoria. Um colega sugeriu a ela que denunciasse o episódio ao editor-chefe da People, mas ela optou pelo silêncio para "não causar problemas".

"Estava em choque, e preocupada com o que Trump poderia fazer comigo e com minha carreira se isso se tornasse público", diz Natasha. "Também pensava em Melania. Ela estava tão feliz naquele dia, tão animada com a gravidez. Não queria estragar a alegria dela."

Assim como Amy, a jornalista nunca foi à polícia, mas seu relato veio a público na revista People em 2016. Em 2023, Natasha também testemunhou no julgamento de abuso sexual de Elizabeth Jean Carroll —e Trump foi condenado pelo caso.

'Pulou em mim como um animal'

A ex-modelo suíça Beatrice Keul, 53, foi a última a vir a público para denunciar o republicano por agressão sexual. O episódio ocorreu em novembro de 1993.

Naquele ano, Beatrice participou de um concurso de Miss Suíça e ficou em segundo lugar. Uma equipe dos EUA filmou o evento. Pouco depois, a modelo recebeu um convite de Trump para participar de um concurso de beleza promovido por ele, em Nova York, com tudo pago.

Beatrice com Trump; ela foi convidada para evento com o magnata e conta ter sido atacada por ele Imagem: Arquivo pessoal

"À época, me senti como uma menininha indo para a grande América. Fiquei com aquele sentimento de 'uau'! Todo mundo ficou com inveja."

Em Nova York, Trump e Beatrice se conheceram em um almoço para a imprensa. Eles conversaram por algum tempo e se despediram. De repente, uma pessoa da comitiva foi até ela dizer que Trump gostaria de vê-la e pediu à modelo que a acompanhasse até uma suíte.

Trump me pegou de surpresa. Quando me virei, ele pulou em mim como um animal selvagem. Eu não estava preparada. Fiquei em choque.
Beatrice Keul

"Ele ficou me agarrando, me beijando e tentando tirar meu vestido. Quase chorei, mas me segurei para não demonstrar fraqueza. Em dado momento, ele me olhou nos olhos e acho que pensou: 'Isso não vai dar certo'. E então me soltou. Depois, disse para mantermos aquilo entre nós", diz.

Assim como Amy e Natasha, Beatrice não foi à polícia e, durante muitos anos, evitou lembrar do episódio. A primeira vez que ela trouxe o incidente à tona foi no final de outubro de 2024 ao Daily Mail, cerca de uma semana antes das eleições.

'O sonho americano está morto'

"Ainda estou incrédula". Foi assim que Amy começou a responder à pergunta sobre como reagiu à vitória de Trump. Ela conta que, na noite das eleições, fez chamada de vídeo com algumas das "sobreviventes".

Em dado momento, elas perceberam que a apuração dos votos "não ia bem", e então Amy foi dormir. Quando acordou, o resultado já havia sido cravado.

"Eu simplesmente não podia acreditar. Realmente não esperava que ele fosse ganhar. Não estava preparada para isso", afirmou.

Sinto que os direitos das mulheres vão regredir no tempo. Acho que o sonho americano está morto.
Amy Dorris

Já para Natasha, o republicano venceu as eleições porque fez uma campanha baseada em mentiras.

Em 2016, quando Trump venceu pela primeira vez, Natasha relata ter ficado "chocada e enojada". Agora, a jornalista afirma que "o choque e o horror são mil vezes piores", porque a sociedade o conhece a fundo.

"Me sinto enojada. Desapontada, desiludida e preocupada com o país", diz. "Temo pelas mulheres e pelas meninas que se tornarão mulheres nos próximos quatro anos."

Beatrice afirma ter sorte por não ser cidadã americana e não estar fadada a viver nos EUA pelos próximos quatro anos.

"Vivemos em uma sociedade em que esses homens se juntam com outros homens semelhantes e governam o mundo."

Em discurso feito durante a campanha de 2016, Trump se referiu às mulheres que o haviam acusado de agressão sexual de "mentirosas horríveis". Em relação ao relato de Amy Dorris, a consultora jurídica da campanha de Trump disse à CBS News em 2020 que "as alegações são totalmente falsas". Procurada por Universa, a assessoria de Trump não comentou.

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