'Falam que pai só ajuda, mas mãe não pede favor', diz Bruna Spínola


Beatriz Zogaib
24/03/2025 05h30
É só abrir o perfil de Bruna Spínola no Instagram e já dá para ter ideia do tanto de pratos que precisa equilibrar. Atriz, arquiteta, apaixonada por comida, fotografia e arte, também é autora e apresenta o Receitas de Domingo, programa de Nossa no canal UOL.
Mãe de duas meninas, Maria Luísa, cinco anos, e Júlia, cinco meses, ainda se preocupa em ensiná-las a enfrentar o machismo. Bruna está sempre sorrindo, mas é categórica quanto ao desafio enfrentado por muitas mulheres: a falsa ideia de que os homens "ajudam" em tarefas domésticas e cuidados com filhos, quando na verdade deveriam ver a função como responsabilidade compartilhada.
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Pai só ajuda? Não, ele não ajuda. Ele é sócio nessa empresa chamada família, 50%. A mãe não está pedindo um favor.Bruna Spínola, apresentadora de Nossa
Ela reforça que a casa e as crianças não são apenas "coisas de mulher" e que o segredo para a dinâmica familiar funcionar é a contribuição de ambos. "Podemos atribuir papéis diferentes, o que cada um se sente mais confortável em fazer ou faz melhor, mas não significa que um faz tudo e o outro apenas complementa."
Ter filhos tem belezas e obstáculos diários, além de concessões importantes - e com a artista não foi diferente. Ela fala abertamente dos impactos da maternidade na carreira e na rotina à pressão sobre as mulheres. Tudo isso sem perder a leveza.
"Tem que haver mais empatia. Respeitar o tempo de cada mulher. Não são todas que vão estar ótimas em um mês. Algumas precisam de um ano. É muito difícil voltar a ser quem você era. Eu não sei se um dia vou conseguir voltar", observa.
A jornada materna da artista não foi tão fácil quanto parece. Depois da primeira filha, ela perdeu dois bebês, e descobriu que tem dois tipos de trombofilia. Mas não se abateu: queria muito um irmão ou irmã para Malu e, grávida de novo, passou a gestação tomando injeções.
Sentir culpa ou ser exemplo?
Muitas mulheres precisam ou desejam retomar a vida profissional após a maternidade, mas qualquer decisão vem acompanhada de culpa. "Se saio para filmar por dois meses, é um problema. Mas se um homem faz o mesmo, é normal. E eu nem quero tirar dois meses fora. Mas a pressão de todos os lados é muito grande. O que me deixa mais exausta são as pessoas dando opinião. Todo mundo sai de férias, a gente, mãe, não sai ", diz Bruna.
Bruna conta com uma rede de apoio, exaltando que está ciente que é privilégio de poucas no Brasil, e conta com o marido na divisão de tarefas. "Se não durmo bem à noite fico péssima. Quando a minha primeira filha nasceu, saia do teatro, dormia de madrugada, ficando com ela até umas quatro da manhã, e acordava mais tarde. Com um mês surtei, tive aquele baby blues, chorava, e a gente entendeu que não funcionaria assim. Passei a fazer uma divisão diferente, que a gente faz até hoje. A noite é sempre do pai", revela.
Não que tenha excluído todos os desafios, especialmente na fase das filhas recém-nascidas. Bruna enfrentou dificuldades na amamentação - tendo que complementar com mamadeira. Por outro lado, também entrou no ciclo de escutar choro e dar o peito, e precisou de ajuda de uma consultora para resolver tudo. Hoje, vê com naturalidade cada etapa.
Eu nunca tive o sonho de ser mãe, tinha muita vontade de casar e ter uma família. Demorei muito para ter filho. Se soubesse que era tão bom, teria tido antes, não romantizando, porque também tem um monte de perrengue.Bruna Spínola, apresentadora de Nossa
A mãe de Maria Luísa e Júlia não romantiza mesmo, e admite que demorou para desenvolver o amor materno. "Não foi à primeira vista. Eu aprendi a ser mãe", diz. A artista esperou a entressafra de trabalhos para engravidar a primeira vez, mas - inesperadamente - foi chamada para uma peça aos seis meses de gravidez, e topou. Hoje, a ideia é sempre encontrar trabalhos em que consiga estar perto das meninas.
"Para mim ser mãe é como atravessar um portal. Depois que virei uma, minha vida se curvou totalmente para isso. E hoje em dia eu busco projetos que eu consiga lidar bem com as duas coisas. Me chamaram pra fazer uma peça que eu tinha que viajar. Falei, gente, eu não posso sair de casa na quinta-feira e voltar na terça, ficar dois dias por semana com as minhas filhas."
A receita para não surtar
Bruna se diz muito feliz e realizada no papel de mãe. "Eu canso, fico exausta às vezes, como todas as mães. Quem não fica não sei como é que faz, se alguém não ficar que me ensine o truque." Ela se apoia na ideia de que a mulher, por natureza, é multitarefa, mas que, no seu caso, tem algo a mais: sua personalidade é inquieta, curiosa, não consegue ficar parada.
"Fiz a peça com a Malu na minha barriga, e comecei a planejar 'o que eu vou fazer no ano que vem, enquanto eu tiver com ela pequenininha?', e foi aí que resolvi entrar na faculdade de arquitetura", conta - como se não tivesse enfrentado um desafio e assistido aulas enquanto amamentava.
Para a artista, é gostoso encaixar uma coisa na outra: ter projetos para além das filhas acaba sendo uma maneira de esvaziar a cabeça. "Tive vários momentos de sobrecarga. Tem dias que eu estou em casa exausta, né? As meninas demandam muito, a mais velha principalmente. Outro dia a gente estava não sei onde, ela falou 'mamãe, mamãe, mamãe mamãe', aí eu até brinquei e falei 'filha, fala papai um pouco', e as pessoas em volta, começaram a rir. Aí ela falou 'papai e mamãe, papai e mamãe', lembra.
Prestes a rodar um novo longa em parceria com o marido, Juan, Bruna entendeu que não é mulher maravilha, e que não deixa de ser boa mãe por isso. Lembra que o momento mais desafiador da maternidade foi o primeiro mês com a mais velha, porque chegou em casa achando que seria mais fácil, que seria mamar, e dormir, e mamar, e dormir. "Ninguém fala que é difícil. E eu queria fazer tudo, ficava com medo de deixar ela, acho que tem a ver com a privação de sono também", recorda.
Independente do cansaço, existem prioridades, como ensinar as meninas a serem o que quiserem. "A mais velha não sabe sobre desigualdades de gênero, ainda não tive essa conversa com ela. Mas explico que nem tudo são flores, porque ela já tem alguns percalços no caminho. Quero tentar criá-la para ser uma mulher livre. Para ir atrás dos sonhos dela. Para saber se colocar nas situações. Para saber sobre limites e respeito, não deixar ninguém fazê-la de boba, não ir além do que quer, não fazer nada para agradar alguém, e se impor. Ao mesmo tempo, ensino que precisa ser educada com as pessoas e ser responsável pelas coisas dela".
É, definitivamente, Bruna sabe como equilibrar pratos, mesmo.