Vale o risco? Nova tendência de dates é expor até traumas no 1º encontro


Colaboração para Universa
26/03/2025 05h30
Considerada uma nova forma de tentar iniciar um relacionamento entre os jovens da geração Z —nascidos entre 1997 e 2012 e, portanto, com 13 a 28 anos—, o termo 'floodlighting' tem sido debatido nas redes sociais e levantado o debate: vale a pena abrir toda a sua história e até traumas logo no início da relação?
O que é floodlighting?
A nova tendência altera a dinâmica inicial de um relacionamento. Em um namoro nos moldes do floodlighting, detalhes pessoais são não só compartilhados, e sim escancarados, de uma forma rápida e intensa logo de cara.
Floodlight, em inglês, significa holofote. O uso do termo indica, de maneira figurada, que os praticantes da tendência colocam uma luz muito forte em direção a outra pessoa, sobrecarregando-a com suas informações.
O termo foi criado pela norte-americana Brené Brown. A pesquisadora, escritora e palestrante é especialista em relacionamentos e elaborou o nome do que seria conhecido como um "compartilhamento excessivo" que busca proteger os envolvidos da própria vulnerabilidade. O trabalho de Brené sobre coragem e vergonha se tornou tema de livros e de uma palestra de enorme sucesso: "O Poder da Vulnerabilidade", de 2010, tem mais de 67 milhões de visualizações.
Ao compartilhar detalhes profundos sobre sua história, a pessoa pode buscar sinais de uma eventual conexão. A intensa troca de informações entre um casal que está se conhecendo pode funcionar para aqueles que buscam, já de início, identificar se há uma real compatibilidade com o outro.
Apesar de a prática ter cada vez mais adeptos, despejar de uma vez seus detalhes íntimos, como traumas, por exemplo, pode ser prejudicial. Especialistas dos Estados Unidos, onde o termo é mais difundido, debatem que o "floodlighting" é considerado uma forma "tóxica" de se relacionar, já que, muitas vezes, pode funcionar mais como um teste do que com uma conexão genuína, podendo ter o efeito contrário ao desejo inicial, manipulando e afastando o outro.
['Floodlighting'] Envolve compartilhar muitos detalhes pessoais de uma só vez para 'testar as águas', acelerar a intimidade ou ver se a outra pessoa pode 'lidar' com essas partes de você
Jessica Alderson, cofundadora do aplicativo de namoro So Synced, à Glamour dos EUA
Os riscos do 'floodlighting'
Conforme a tendência ganha mais menções nas redes sociais como o TikTok, os especialistas alertam para os possíveis riscos do floodlighting. O estudo "Compartilhamento Excessivo nas Mídias Sociais: Ansiedade, Busca por Atenção e Vício em Mídias Sociais Preveem a Amplitude e a Profundidade do Compartilhamento", publicado em 2022 no portal Psychological Reports, estudou os hábitos digitais de mais de 350 adolescentes, buscando entender os resultados do floodlighting. Segundo a equipe responsável pela pesquisa, ao compartilhar informações pessoais de forma precipitada, é possível que haja o que os especialistas chamam de "roubo de identidade".
Quando o floodlighting é feito por meio das redes sociais, os riscos são ainda maiores. Neste cenário, pode haver uma possível humilhação online, conhecida como cyberbullying, caso a pessoa que recebeu o conteúdo decida não só expor os detalhes para os outros, como também debochar de quem compartilhou seus traumas e histórias.
O floodlighting pode criar uma dinâmica 'desequilibrada' no relacionamento, com uma pessoa compartilhando demais enquanto a outra pode não saber como reagir às informações. Jessica Alderson elenca outros possíveis riscos do floodlighting: a falsa sensação de intimidade, já que revelações profundas sem uma confiança verdadeira podem fazer com que os envolvidos pareçam mais próximos do que realmente são; e risco de exploração, pois, ao compartilhar seus detalhes com quem não conhece direito, você corre o risco de ser explorado ou chantageado caso a pessoa não tenha a melhor das intenções.
Como se precaver?
Caso você sinta que está compartilhando demais logo no início de uma relação, você pode analisar os motivos pelos quais está tendo essa atitude. Mark Travers, psicólogo formado pela Universidade Cornell e pela Universidade do Colorado, elencou para o portal da Forbes nos Estados Unidos alguns pontos a serem levados em consideração sobre o tema. Ao identificar essa postura, pense nos pontos abaixo:
- Por que estou compartilhando isso agora?
- Este é o momento certo na nossa conexão para esse nível de abertura?
- Estou esperando algo específico em troca, como validação ou tranquilidade?
Segundo Travers, um dos problemas principais da prática é a expectativa criada em relação ao outro. "Muitas pessoas que [praticam] floodlight não se abrem simplesmente; elas inconscientemente esperam que a outra pessoa corresponda ao seu nível de vulnerabilidade", escreveu. Sendo assim, caso você espere que a pessoa retribua não só com atenção, mas também com uma abertura ampla logo no início, este pode ser um sinal de alerta.
A pressa para garantir uma conexão ou o teste para checar se o outro está disposto a continuar não devem ser a principal forma de iniciar um relacionamento. A prática pode causar confusão tanto em quem compartilha, quanto em quem está ouvindo. O ideal, segundo os especialistas, é seguir com calma, identificando até onde você deseja abrir suas histórias —e seu coração.
Segundo a 'teoria da penetração social', os relacionamentos se desenvolvem por meio de camadas gradativas de autorrevelação, muitas vezes comparadas a descascar uma cebola. A intimidade se aprofunda lentamente ao longo do tempo, começando com detalhes mais superficiais, depois avançando para atitudes pessoais e, eventualmente, levando a emoções e experiências mais profundas
Mark Travers, à Forbes dos EUA