A casa Pepiguari mostra um tipo de arquitetura cuja origem está na junção das liberdades técnica e artística. Simples, em terreno inclinado e implantada em três níveis – a casa, o quintal e a edícula -, a residência é exemplo de como se pode ser original ao morar, sem frescura ou excesso. A construção, por exemplo, não possui os tradicionais corredores que vão da garagem aos fundos da casa e tornam obsoleta a área lateral de terreno. “Como a altura total não passaria dos seis metros, não foram necessários os recuos laterais impostos pela legislação”, explica Marcelo Ferraz, arquiteto do escritório Brasil Arquitetura.
Com carta branca para desenhar a Pepiguari, então, Ferraz distribuiu no térreo uma grande sala e a cozinha; no pavimento intermediário, os dormitórios, e no mais elevado o terraço verde sobre a cobertura, que pode ser acessado a partir de uma escada plissada metálica, em aço corten, que integra o desenho da fachada frontal.
Na horizontal a casa também é setorizada, desta vez pela parede estrutural de concreto moldado “in loco”, com 12 metros de comprimento, que se alonga desde a rua até o fundo da cozinha e do living. O corpo da casa fica, assim, dividido em dois: um lado social, com 2/3 do volume da casa, tem salas de estar e jantar integradas no térreo e os dormitórios no piso superior; a outra terça parte abriga área de serviços protegida por um muro e cozinha ao rés do chão e um estúdio de distribuição para os quartos no pavimento íntimo.
Espinha concreta
Como é a "espinha" estrutural da casa que separa as funções do morar, o desenho arquitetônico buscou deixar todos os demais elementos de suporte – lajes, vigas e paredes – em concreto exposto e rústico, sem lixamento ou acabamento resinado. As lajes foram moldadas em loco e nervuradas, com aplicação de poliestireno expandido (EPS ou isopor). Além de mais leve, a solução aumentou sensivelmente os isolamentos térmico e acústico.
O conforto térmico também foi importante para determinar a cobertura: um telhado verde plantado sobre espelho d’água. O processo teve início logo que foi terminada a concretagem da laje, imediatamente coberta por uma lâmina d’água permanente antes mesmo que ocorresse a cura do material. Essa técnica dispensou que a base do telhado verde recebesse camada impermeabilizante, uma vez que a cura se deu em ambiente encharcado. O espelho d’água foi então preenchido com pedra sinasita (argila expandida) e coberto, finalmente, por manta geotêxtil, dreno, areia e terra para plantio.
“Assim que terminou a obra, tivemos que ajustar algumas goteiras que apareceram na laje sob o telhado verde. Fizemos os reparos com aditivos para massa cimentícia (Sika 2), pelo lado de dentro da casa (forro dos quartos). A massa penetrou na fissura e se cristalizou, bloqueando a infiltração”, explica o arquiteto.
Verde em pequenas doses
A horta implantada sobre o telhado verde, que também se tornou um terraço para a contemplação da cidade, não demanda a irrigação diária, já que o espelho d'água é mantido sempre cheio e em circulação, como se fosse um lençol freático, por meio de um sistema com boia flutuante (como nas caixas d'água).
Mas a grande estrela da obra, sem dúvida, é pé de mexerica que está há mais de 40 anos no terreno. Frondosa, a árvore pode ser vista da sala, da cozinha e mesmo da edícula, nos fundos, onde fica o escritório-biblioteca, sempre por meio de portas corrediças de vidro, com ou sem caixilhos, a separar os interiores do amplo quintal.
Mas, o traço mais marcante de que a liberdade para criar a arquitetura foi a premissa do projeto é o desenho da varanda do quarto de dormir, na altura exata e que os moradores pudessem apanhar e comer tangerinas diretamente da copa da árvore.