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Quase um parque particular

16/06/2010 07h30Atualizada em 26/02/2016 20h35

Um espaço de descompressão, uma válvula de escape para a tensão diária que se vive na cidade grande. Essa é a definição do próprio paisagista, Benedito Abbud, sobre o projeto que desenvolveu para uma casa de campo, em São Roque, a 62 quilômetros da capital.

O verde ocupa a maior parte do terreno – a casa de dois pavimentos tem 300 m² em uma área de 3.000 m². A escolha do terreno foi relativamente fácil: existia uma clareira no meio da mata nativa. “Com isso, priorizei um conceito de paisagismo que fosse o prolongamento desse contexto, favorecendo uma soma de verdes. Como se o jardim fosse a mata e, a mata, um jardim”, explica Abbud. De fato, não há cercas nem muros dividindo áreas e é nítida a sensação de continuidade.

O mais curioso é que para chegar a esse resultado, além das espécies nativas que permaneceram intocadas, algumas foram plantadas e outras foram reaproveitadas dentre o que foi descartado pelos vizinhos. “Montei os jardins com diversas plantas que seriam jogadas fora”, diz Abbud.

O paisagista conta que, quando compram um terreno, as pessoas tendem a considerar que a vegetação existente é “mato” e deve ser substituída por plantas compradas – essas sim de valor. “Mas todo mato é planta, basta ser trabalhado”, argumenta Abbud, que ressalta a importância de se aproveitar a mata nativa, adaptada às condições locais. A região de São Roque, por exemplo, é sujeita a geadas que queimam e matam as plantas numa única noite. Espécies exóticas, que não suportam esse clima, podem por um projeto a perder.

Outro ponto de grande importância: na hora de desenvolver ou solicitar um projeto com paisagem é preciso conhecer o tamanho dos arbustos, a resistência e o desenvolvimento da raiz entre outros fatores. “Só assim é possível plantar as espécies mais altas no fundo, as mais baixas na frente, aquelas com raiz muito volumosa longe da casa, e procurar dosar porções de vegetação com formas interessantes próximas a gramados, para evitar a monotonia”, ensina o paisagista, revelando truques da profissão.

Ambientes integrados

O projeto determinou a criação de cinco jardins, com personalidade e estilo próprios, mas com um objetivo comum: despertar sensações em quem usufrui dos espaços. “O projeto da casa foi desenvolvido a partir dos jardins”, diz Abbud.

  • A planta ilustrada mostra que os diversos jardins que compõem o projeto são todos integrados, livres de cercas e muros. A transição é marcada pela própria vegetação

No jardim da entrada da casa, que dá para a rua, a idéia foi escolher espécies de baixo a médio porte, para permitir a entrada de sol nos quartos, como as palmeiras triângulo (Dypsis Decari), que têm um altura perfeita para dar privacidade à casa e deixar os raios de sol entrarem. “Sol é saudável, evita mofo e umidade e não deixa que o ambiente fique insalubre”, define Abbud.

O jardim dos peixes e pássaros – composto por um mini-lago, um deck e uma “parede” de mata nativa – se liga visualmente à sala da lareira, permitindo uma vista serena para quem está se aquecendo lá dentro. Outra possibilidade é descansar nas espreguiçadeiras do deck ouvindo os sons da natureza ou simplesmente contemplando os lírios d’água que boiam na superfície do lago.

O jardim dos jogos é um imenso gramado rodeado por espécies frutíferas que, além de ser uma opção de alimento para os atletas amadores, ainda produz sombra, amenizando o calor, que é intenso sob o sol. Para complementar a ideia, o paisagista forrou a base dos pés de frutas com singônio (Syngonium).

Na parte de trás da casa, o jardim dos dormitórios é uma extensão da varanda íntima, comum a todos os quartos. O cenário é de filme. Mais altas, as quaresmeiras roxas aparecem imponentes. Um pouco abaixo, o azul singular da Bela Emilia (Plumbago). O contraste das cores fortes das árvores com o verde das cercas vivas de jasmin e camélia, que delimitam o espaço gramado central, formam um conjunto de perfeita harmonia.

Por fim, há o jardim privativo do quarto do casal. O pequeno espaço é aconchegante, com um deck de tijolos rústicos, sofá de madeira, cantinho com seixos e piras para iluminar e aquecer no frio. Entre as espécies que estão em torno do deck, há palmeiras (Phoenix Roebelini), samambaias (Nephrolepis Exaltata) que cresceram nos troncos das palmeiras, e uma cerca de bambu mossô – um toque oriental, apropriado para este ambiente de interiorização.

Para manter as espécies viçosas, todo lixo orgânico é guardado em composteiras e se transforma em adubo usado na nutrição das plantas. Além de eficiente, o sistema é correto do ponto de vista ambiental. A iluminação combina velas e piras, com pouca luz artificial. “Pensei em um efeito aconchegante e quente, já que o lugar é tão frio”, explica o paisagista.

O projeto paisagístico desta residência de lazer no interior paulista se destaca entre os 3.500 projetos executados pelo arquiteto paisagista Benedito Abbud, de São Paulo. Já são 36 anos de profissão e esta casa é uma bela mostra dessa trajetória, que começou em 1974, quando Abbud se formou pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo. (Isabela Leal, colaboração para o UOL)

Ficha técnica

Casa de Campo, São Roque (SP)

Projeto de Benedito Abbud

Detalhes do projeto
  • Área do Terreno 2.700 m²
  • Projeto Benedito Abbud
  • Construção Ar Terra Paisagismo