Filha de um casal de retirantes nordestinos, Fernanda Moura, 45, ficava intrigada, durante a infância, em descobrir como o iogurte que comia chegava até a mesa de sua família, no bairro Cidade Patriarca, na zona leste de São Paulo. "Queria saber exatamente como eles haviam fechado aquele pote", conta para Universa.
A curiosidade a fez entrar para a indústria alimentícia, onde começou a trabalhar na linha de produção. Estudante de engenharia química, ela usava botina e macacão branco. Como qualquer funcionário do chão de fábrica. "Meu pai não compreendia as minhas decisões de carreira. Não entendia como uma filha super bem encaminhada podia ser funcionária em uma fábrica."
Única mulher entre quatro irmãos, Fernanda cresceu em um ambiente machista, apesar de amoroso. "Tirei minha carteira de motorista aos 21 anos porque meu pai achava que era desperdício de dinheiro, que dirigir era coisa de homem. Balada? Nem pensar." Por isso, casou relativamente cedo e levava uma vida "dentro dos padrões." Mas isso não era o bastante para a engenheira.
"Eu tinha sonhos, queria investir na minha carreira." Do chão de fábrica, ela vislumbrava o topo. Foi quando decidiu parar de tentar "caber" no que a sociedade e a família esperavam dela. "Virei mulher aos 34 anos, quando me separei."
No caminho até o cargo de diretora de qualidade global da BRF, a gigante empresa de carnes, dona das marcas Sadia e Perdigão, Fernanda já chorou no banheiro por causa de assédio sexual e chegou a abriu mão de usar saia para alçar voos mais altos. "Tive que me masculinizar. Achava que uma calça era o segredo para conquistar tudo o que conquistei." No início deste ano, a executiva assumiu a liderança de uma equipe composta por mulheres. Apesar de ter tido problemas com chefes do sexo feminino, a engenheira espera fazer diferente. "Quero acolher. Porque uma mulher acolhida rende muito e bem."