Elas querem dominar o Rio

Com pacto de não agressão, pré-candidatas disputam a prefeitura carioca, que nunca teve uma mulher no comando

Luiza Souto De Universa

O Rio está de olho nas mulheres. Pela primeira vez, a cidade tem seis pré-candidatas para disputar a prefeitura, posto hoje ocupado por Marcelo Crivella (Republicanos), que busca a reeleição. Entre elas, há apenas uma estreante na política: a ex-juíza Glória Heloiza, que pediu exoneração neste ano para se filiar ao PSC e concorrer à vaga. A capital carioca nunca teve uma mulher no comando.

Uma eleição marcada por tantas figuras femininas já começou de um jeito diferente. Benedita da Silva (PT), Clarissa Garotinho (PROS), Glória Heloiza (PSC), Martha Rocha (PDT) e Renata Souza (PSOL) assumiram manter o respeito mútuo durante a campanha eleitoral, que começa em setembro. Numa reunião por videoconferência, em julho, as cinco pré-candidatas combinaram que irão pontuar as diferenças nos debates e entrevistas, mas sem agressões. A também pré-candidata Cristiane Brasil (PTB) não participou do encontro virtual, mas assinou a carta firmada entre elas.

"Como mulher, posso garantir que é natural nossa disposição para ouvir e, principalmente, ter empatia", diz a ex-juíza Glória Heloiza. "As mulheres na política demonstram mais cuidado com a situação de desigualdade e de violência doméstica em que elas vivem", complementa a deputada federal Benedita da Silva. "Quem sabe, pela primeira vez, o Rio não terá uma prefeita mulher?", levanta a bola a também deputada federal Clarissa Garotinho, filha de dois ex-governadores do estado.

Levantamento do Instituto VER Pesquisa e Comunicação, feito em maio, aponta que o ex-prefeito Eduardo Paes, pré-candidato pelo DEM, aparece com 31,3% das intenções de voto. Crivella vem em seguida, com 10,8%, e a deputada estadual Martha Rocha é a terceira melhor posicionada, com 6,8%.

De credos, times de futebol e personalidades distintas, as candidatas, com idades entre 37 e 78 anos, garantem que o embate será saudável e que não ficará restrito ao campo do gênero. Até porque o Rio de Janeiro é hoje uma das capitais mais endividadas do país —dados do Compara Brasil, baseados nos números da Secretaria do Tesouro Nacional e do Sistema de Coleta de Dados Contábeis dos Entes da Federação, apontam uma dívida consolidada de cerca de R$ 15 bilhões.

"A prefeitura tem hoje cerca R$ 50 bilhões nas mãos de ricos devedores. Vamos cobrar essa dívida. Pelo menos 20% desse dinheiro é recuperável rapidamente, segundo estudo da própria prefeitura", afirma Renata como possível solução.

Além disso, as milícias seguem dominando comunidades por toda a capital. "A prefeitura precisa desempenhar um papel ativo, oferecendo suporte às ações policiais e ampliando a fiscalização de obras e serviços prestados por grupos criminosos", sugere Martha, única mulher a comandar a polícia civil do Rio de Janeiro, entre 2011 e 2014. A ex-deputada Cristiane Brasil sugere ajuda do governo federal no combate à violência:

"Vou pedir muita ajuda ao presidente [Jair] Bolsonaro, com as forças especiais".

E em meio à crise provocada pelo novo coronavírus e cientes de que o Carnaval gera bilhões para a economia da cidade, as seis concordam que a capital só poderá promover a festa quando o país tiver uma vacina contra a doença.

Confira abaixo os destaques das entrevistas com cada candidata, feitas por e-mail e telefone, e apresentadas em ordem alfabética. Ao final de cada uma delas, o link "leia mais" leva para a conversa completa.

  • Benedita da Silva (PT)

    Deputada Federal, 78 anos, da favela da Praia do Pinto, Leblon, zona sul do Rio de Janeiro. É pré-candidata pelo PT, casada e tem dois filhos. Se eleita, quer adotar o recorte de gênero em cada política pública, sobretudo relativo à mulher negra, "que é a mais oprimida e discriminada", para o combate ao racismo e à desigualdade. Diz que vai priorizar a renda mínima, a inclusão social e a geração de empregos. Sobre o Carnaval, afirma que a festa só acontecerá na cidade após aval de um comitê científico que pretende criar logo no início de sua gestão, para avaliar a ameaça do novo coronavírus.

    Leia mais
  • Clarissa Garotinho (PROS)

    Deputada Federal, 38 anos, de Campos (RJ). Pré-candidata pelo PROS, é casada e tem um filho. Nos seus planos para a cidade, pretende tornar a população fiscal dos serviços como o transporte, incentivando usuários, por exemplo, a reclamar de atrasos nos horários dos ônibus. Quer também terminar obras inacabadas, como a da avenida Brasil, via expressa mais importante da capital. Pretende criar amplo programa de cooperativas nas favelas e comunidades do Rio para gerar trabalho e armar grupamentos da Guarda Municipal para ajudar no combate à violência.

    Leia mais
  • Cristiane Brasil (PTB)

    Advogada, 45 anos, de Petrópolis, na região serrana. Pré-candidata pelo PTB, é divorciada e mãe de dois filhos. Tem como objetivos gerar emprego e dar segurança jurídica e pública para as empresas não saírem do Rio. Quer investir na atenção básica da saúde, desde a puberdade até a menopausa, passando pelo parto, na capacitação de mães de adolescentes nas comunidades, para prevenção da gravidez precoce, e na rede de proteção à vitima de violência doméstica, envolvendo a Guarda Municipal, a saúde e a assistência social. Diz que quer oferecer cursos de defesa pessoal para as mulheres aprenderem a se defender.

    Leia mais
  • Glória Heloiza (PSC)

    Ex-juíza, 51 anos, de Jacarepaguá, zona oeste do Rio. Pré-candidata pelo PSC, é divorciada e não tem filhos. Entre os projetos para a cidade, planeja usar a tecnologia para ampliar o controle sobre o orçamento e a manutenção da arrecadação, sem reajustar ou criar impostos, e apoiar o empreendedorismo das famílias, principalmente as de renda média e baixa, para gerar emprego e estimular o consumo nos bairros. Para combater as milícias, quer promover a união entre os governos federal, estadual e municipal, além do Ministério Público e do Poder Judiciário. E investir em educação para enfrentar a violência contra a mulher.

    Leia mais
  • Martha Rocha (PDT)

    Deputada estadual, 61 anos, da Penha, zona norte do Rio de Janeiro. É pré-candidata pelo PDT, solteira e não tem filhos. Cita a asfixia financeira das milícias como plano para combater a criminalidade do Rio, além da intolerância com a corrupção. Planeja oferta qualificada e especializada de serviços em saúde da mulher e atendimento humanizado pelos órgãos de segurança às vítimas de violência. Quer parcerias com as polícias civil e militar para melhorar o policiamento e a investigação em situações de ameaças e agressões. Propõe investimento para a redução das disparidades entre homens e mulheres no mercado de trabalho.

    Leia mais
  • Renata Souza (PSOL)

    Deputada estadual, 37 anos, da Maré, zona norte do Rio de Janeiro. Pré-candidata pelo PSOL, é solteira e não tem filhos. Entre suas propostas para a cidade está organizar um pacto municipal pela igualdade salarial entre mulheres e homens. Quer, inclusive, um secretariado com paridade entre os gêneros e estimular as empresas que recebem incentivos fiscais a adotarem políticas salariais que levem em conta o tema. Outra prioridade é a criação de um fundo para as creches, que crie mais vagas para filhos de mães que moram distante do trabalho. Diz que quer assumir o compromisso de ouvir a voz de quem é silenciado: mulheres pretas, trabalhadores e pobres.

    Leia mais

Leia também

Reprodução

Karina Kufa: "Não há ilegalidade em presidente ir para a rua"

Primeira advogada mulher de um presidente da República, ela fala dos machismos pelos quais passou até chegar ao posto que ocupa

Ler mais

Cristão, ele coordena "departamento mais gay" da prefeitura de Crivella

Nélio Georgini é chefe da Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual, e entre outras ações ajudou a elaborar o atendimento às mulheres trans na Delegacia da Mulher

Ler mais

Líder dos professores e deputada do PT em SP: "Volta às aulas é genocídio"

A presidente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), a Professora Bebel diz que manter os estudantes em casa é uma questão de escolha pela vida

Ler mais
Topo