"Meu nome é Agatha. Eu sou uma menina de pipi." Com pouco mais de 4 anos, a criança, explicou aos pais como queria ser chamada. "Minha filha começou a mostrar o desconforto de gênero no segundo ano de vida", conta Thamirys Nunes, a mãe da garotinha trans que hoje tem 7.
Apesar da certeza da menina, a transição foi um caminho difícil e cheio de desafios —para ela e para os pais. Orientada por uma psicóloga, a mãe ficou dois anos reforçando o masculino na filha. "Vivemos um inferno", relembra. Ela e o marido, Fábio Cassali, chegaram ao ponto de não sair mais de casa para passear.
Roupas e brinquedos eram os principais problemas. Ela queria vestido e bonecas. O pai tem uma filha de outro casamento, e o quarto da irmã mais velha, todo rosa e feminino, era onde a menina se sentia feliz.
Com 3 anos, Agatha pediu para a mãe chamá-la de filha e perguntou se poderia morrer e nascer menina. "Isso fez aumentar ainda mais minha angústia. Ela tinha um quadro de tristeza profunda e percebi que estávamos fazendo tudo errado." Thamirys resolveu liberar, só em casa, as roupas que a filha quisesse usar e os brinquedos com os quais ela preferisse brincar. "Não queria ser mãe de uma criança triste", explica.
Nessa época, o casal encontrou uma outra psicóloga em Curitiba, onde vive, que começou a esclarecer a condição de transgeneridade de sua filha. Pouco depois, descobriram o Amtigos (Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual) do IPq (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas de São Paulo. "Foi aí que aconteceu esse processo de transição da minha criança", conta a mãe.
Para Agatha, as coisas começaram a entrar nos eixos. Para Thamirys, foi o oposto. Ao ver o sonho de ser mãe de um menino ir por terra, desabou. "Entrei numa depressão profunda." Ela explica que, quando a criança nasceu, pediu para o marido fazer vasectomia. "Tive que lidar depois com a minha tristeza por saber que não teria mais o meu filho menino."
Os pais também precisaram lidar com ataques, questionamentos e críticas de familiares e amigos. "Mudamos de casa, de escola, fui fazer terapia e começamos uma nova vida", diz Thamirys. Após alguns meses, passado o luto pelo filho, ela percebeu que estava pronta e aberta para amar sua nova filha, Agatha.
Em seu processo, descobriu ainda que poderia ajudar outras mães na mesma situação. Em 40 dias, escreveu o livro "Minha Criança Trans", publicado em 2020 de forma independente e comercializado pelas redes sociais. "Nele, conto o que eu vi e senti na convivência com minha filha e quais fatores me convenceram de aquilo que não se tratava de uma fantasia, e, sim, de um processo natural dela."