Eu arrisquei minha vida para poder comemorar o Dia Internacional da Mulher. Não é figura de linguagem. Em 2016, pedi à Justiça o direito à morte assistida caso não pudesse mudar de nome e gênero. E impus uma condição, me recusava a ser diagnosticada com uma patologia, como acontecia até então com mulheres trans.
Eu poderia ter me tornado um cadáver, mas me tornei Neon Cunha.
Sou mulher. Não tenho doença alguma. E quando perguntam se eu estava disposta a morrer, digo um sonoro "É claro". Estava com 46 anos e havia experimentado de tudo. Sofri ameaças, surras, tive arma apontada para cabeça, trabalhei de olheira de cafetina, fiz boquete em policial para evitar espancamento e fui estuprada por bandidos.
Mas nunca deixei de querer viver. E quando você tem certeza da vida, não tem medo da morte.
E eu solicitei alteração do meu registro civil. Dos meus documentos também. Falei várias vezes naquele período, nome social não vai para lápide. Conheci várias mães de mulheres trans tentando mudar o nome nos cemitérios porque a filha nunca usou aquele nome masculino que aparecia na lápide. A resposta era sempre um indiferente "não posso fazer nada".
Eu procurei a Justiça para pedir um direito, mas não buscava somente abrir um processo. Foi um ato político. Eu e meu advogado conseguimos romper com um procedimento. Com meu ganho de causa, fui a primeira mulher trans a mudar de nome sem diagnóstico de patologia. Agora existe uma jurisprudência, um caminho para todas.
E eu não quero aplausos. Quero compromisso com mais mudanças.