Desde pequena, eu convivo com o abuso. Meu pai era alcoólatra e tinha uma arma. Chegava bêbado em casa praticamente todos os dias e tinha muito ciúme da minha mãe. Tinha dias em que ele a encostava na parede e atirava na direção dela.
Lembro que minha mãe gritava: "Quer me matar? Me mata". Eu e meus cinco irmãos ficávamos em pânico.
A casa onde morávamos era de madeira e, quando abria o sol, dava para ver as luzes entrando pelos buracos da parede.
Para fugir dessa violência, eu, minha mãe e meus irmãos saímos da roça, em Itaporã, no Mato Grosso do Sul, para uma favela em Inhaúma, na zona norte do Rio de Janeiro. Mas meu pai veio atrás.
Eles seguiram juntos e minha mãe só separou dele após 22 anos de casada. Meu pai nunca deixou de beber nem de violar a minha mãe. Existia nela uma dependência emocional muito grande.
Como éramos pobres, minha mãe precisou colocar as filhas mais velhas para trabalhar em casas de família, como domésticas. Fomos eu, que tinha 12, e minha irmã, de 13 anos. Comecei cuidando de criança, mas depois assumi todos os afazeres domésticos. Trabalhava pesado. Foi uma infância que eu considero interrompida.