Fui criada na Cidade de Deus, comunidade do Rio de Janeiro. Lembro que, quando eu era criança, sempre rolava tiro — por isso, às vezes, não dava para ir à escola. Meus pais não queriam ver a gente na rua, correndo risco. Por isso, levaram eu e minha irmã para treinar na Associação de Moradores, quando eu tinha uns 8 anos.
Quando comecei no judô, nunca tinha visto uma Olimpíada. Dentro da comunidade, a gente não tem acesso a nada. Assim que meu treinador falou para o meu pai que um dia ia me colocar na seleção brasileira, pensei: "Esse velho tá é doido!".
Eu não tinha dinheiro da passagem do ônibus para ir à escola, nunca imaginei competir nem fora do Rio de Janeiro. Que dirá ir para uma Olimpíada em Londres.
O judô transformou a minha vida e a vida da minha família. Consegui comprar minha casa, sair da comunidade, reformar a casa dos meus pais
Um dia, depois de alguns anos fora da Cidade de Deus, fui visitar meus tios. Eu tinha uma Captiva [SUV de luxo] e, quando entrei no beco para estacionar, vi uns meninos sentados na esquina, não deveriam ter mais de 12 anos. Um deles falou: "Caraca, quando eu crescer é um desse que vou querer roubar para mim". Ele não almejou comprar, ele pensou em roubar, porque é o único caminho que ele vê como possível. Fiquei em choque, porque percebi que poderia ter sido esse meu destino.