Do lado de fora do Templo de Salomão, em São Paulo, um homem assiste na tela de um celular à transmissão de um culto evangélico. Uma garoa fina cai e embaça as lentes do aparelho e dos óculos de aro grosso usados por ele. "Aqui é grande porque Deus é grande", classifica o produtor de vídeo e escritor de livros de autoajuda Itamar Fernandes, 40.
A estrutura imensa construída pela Igreja Universal, que costuma reunir milhares a cada domingo, está de portas fechadas. A pandemia de coronavírus fez com que, por dois domingos seguidos, um culto deixasse de ser celebrado com seus fiéis na igreja, inaugurada em 2014.
Apesar do decreto do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), classificar as manifestações religiosas como essenciais e permitir que elas permaneçam abertas, a direção da Igreja Universal do Reino de Deus manteve os próprios planos para combater o vírus.
Universa visitou a igreja no último domingo (29), no final da tarde. Naquele dia, pouco mais de dez pessoas em meia hora passaram pelas portas douradas da construção colossal construída no bairro do Brás antes horário que antecederia a cerimônia. Lá dentro, o pastor indicava que o culto seria transmitido pelas redes sociais ou poderia ser acompanhado pela televisão. Há pastores de plantão, mas a oração é feita sem dar as mãos e só entra um por vez.
A pregação transmitida ao vivo é feita dali mesmo, a portas fechadas. Um pastor solitário prega para 10 mil cadeiras vazias; o som de um passo pode ser ouvido a muitos metros de distância e o pé direito alto, cerca de 18 metros de altura, facilita emiti-lo.
A área total do Templo é quatro vezes maior que o Santuário Nacional de Nossa Senhora de Aparecida. As proporções impõem reverência. "É a igreja mais mal falada de todas, não é? Mas você vê: quem a crítica também nunca está feliz", pontua Itamar, antes de ser perguntado.
"Eu mesmo xingava um amigo que vinha a ela, dizia para ele parar de dar dinheiro para o [fundador da igreja, Edir] Macedo. Até que pedi para ele me levar na igreja. Eu chorava e já tinha problemas com minha ex-esposa", diz.
Itamar conta que doou um Corolla quase zero quilômetro para a igreja. A contribuição, diz, deu certo: curou uma filha de 26 anos da leucemia, já deu 474 palestras para empresas país afora e mora no Morumbi, bairro nobre da capital paulista. Todo domingo, ele cumpre o compromisso de trazer ofertas e assistir ao culto, mesmo que online.
"A porcaria do coronavírus é uma amostra de que o mundo não está bem", reflete. Mas diz que não tem medo, afinal, acredita "em um Deus vivo" que vai continuar trabalhando mesmo sem um culto para adorá-lo pelas próximas semanas.