Faixa preta

Cristiane Brasil promete aumentar arrecadação da cidade e quer curso de defesa pessoal para as mulheres

Luiza Souto De Universa

Formada em Direito, Cristiane é a mais velha de três filhos do ex-deputado e pivô do escândalo do mensalão Roberto Jefferson, condenado —e perdoado pelo STF em 2016— por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ela escolheu usar o nome da mãe, a artista plástica Ecila Brasil. "Ela é meu grande amor", declara-se.

Foi eleita vereadora em 2004 e voltou a atenção para a terceira idade. Entre os feitos, implantou as Academias da Terceira Idade (ATIs) em áreas públicas do Rio. Enquanto deputada federal, em 2018, teve o nome indicado pelo pai, que é presidente do PTB, ao então presidente Michel Temer para comandar o Ministério do Trabalho. Mas foi impedida de assumir após aparecerem duas ações trabalhistas contra ela, feitas por ex-funcionários. Para se defender, gravou um vídeo em que aparecia a bordo de uma lancha, na companhia de quatro amigos, afirmando que iria aprovar sua inocência. A repercussão negativa do vídeo minou de vez as intenções para o posto. Naquele ano, ela também não se reelegeu.

Apoiadora do presidente Bolsonaro, se identifica nas redes como mulher de direita e anticomunista. Presidente do PTB Mulher por sete anos, diz que sua chapa será 100% feminina —mas não entrega o nome da candidata à vice. Em 2015, após passeata de mulheres contra o projeto de lei que previa dificultar o aborto mesmo nos casos previstos por lei —estupro, anencefalia e risco para a mãe—, do então deputado Eduardo Cunha, escreveu numa rede social: "Orgulho das mulheres do Rio que se mobilizaram para combater a escalada conservadora que ameaça direitos e conquistas femininas no estado e em todo país!" Em agosto último, afirmou na mesma rede que abortar é crime.

Flamenguista, a pré-candidata é cristã e adora correr. "Amo você pela audácia, bravura e coragem. Podia ter escolhido o nome Cristiane Jefferson, que era mais fácil ganhar nas eleições, mas fez a escolha [pelo nome Cristiane Brasil] pelo seu valor", declarou o pai numa entrevista publicada em sua rede social.

As candidatas à prefeitura do Rio firmaram compromisso de manter o respeito mútuo durante a corrida eleitoral, sem agressões. Qual a sua avaliação sobre esse acordo?

Eu não participei da reunião porque não soube dela. Mas a Benedita [da Silva, também pré-candidata] me ligou depois, foi supergentil, falou do documento, olhei e assinei. Isso mostra como nós, mulheres, temos essa visão estratégica e o espírito de colaboração mais apurado, qualidades essenciais tanto na gestão pública como na privada.

Apoiaria qualquer outra candidata se ela chegasse ao segundo turno?

Não posso dizer, por um simples motivo. Tenho projeto para a cidade. Se a candidata não for eu, e ela não compartilhar essa mesma visão que a minha, que é de uma política de direita, transparente, com redução de custos, uma gestão efetiva, não tem como ter meu apoio. Há pilares que considero fundamentais para qualquer candidato ou candidata que queira administrar o Rio de Janeiro. Antes de falar da questão de ser mulher, sou gestora pública e isso tem que prevalecer sobre a questão de gênero. Se for uma mulher com ideias malucas, com as quais eu não concorde, não tem como apoiar.

Acredita que candidatas mulheres à prefeitura do Rio têm objetivos e entraves comuns, independentemente do partido em que atuam?

Sim, temos objetivos e entraves comuns, mas diferimos na forma como lidamos com as questões para atingir nossos objetivos. Quanto aos entraves, por sermos mulheres, é mais difícil sermos ouvidas num ambiente ainda predominantemente masculino, mas estou acostumada por causa da minha experiência na administração pública. E já vi muito discurso vitimista de algumas políticas. Vejo os políticos como iguais e sempre derrubei barreiras. Todas as vezes que portas estavam fechadas para mim —e às vezes os homens fecham mesmo ela na sua cara, porque querem demonstrar poder—, eu ia lá, abria e participava das reuniões. Quando não conseguia, entrava pela janela. Por isso, estou no lugar onde estou. Sempre busquei ocupar espaços dentro da política pelos meus méritos. Já aconteceu de, numa reunião, na sala do presidente da República, um colega praticar assédio sexual e moral comigo. Falei: "Ou você para com a piada, ou vamos para a Corregedoria da Câmara". É importante ter atitude.

Quais são suas principais propostas e o que pretende propor especificamente para melhorar a vida das mulheres?

A cidade precisa de uma mudança drástica para dar uma guinada, e tenho como objetivos a geração de emprego e a segurança jurídica e pública, para que as empresas não corram daqui, vítimas da burocracia da prefeitura e do achaque do tráfico. Se esses dois temas forem bem conduzidos, a vida das mulheres será impactada de forma positiva. Além disso, vou investir na atenção básica na saúde, desde a puberdade até a menopausa, passando pelo parto, capacitação de mães de adolescentes nas comunidades, para prevenção da gravidez precoce, e pela rede de proteção à vitima de violência doméstica, envolvendo a Guarda Municipal, a saúde e a assistência social. Todos os projetos para a cidade têm que responder a uma pergunta: "Isso gera emprego e renda?" E trabalhar com o que gera emprego de imediato na cidade é investir no turismo, na cultura, em evento, coisa que o atual prefeito [Marcelo Crivella] não gosta nem incentiva.

O fato de haver seis pré-candidatas mulheres é louvável, mas você não teme que isso possa pulverizar o voto das mulheres e acabar ajudando a eleger um homem?

Não. Essa é uma grande vitória feminina. O mais importante é termos uma prefeita capaz de fazer uma boa gestão. Características como determinação, empatia e humildade não são exclusivas das mulheres, mas muitas vezes são desprezadas pelas lideranças masculinas. Eles matam as candidaturas femininas. Está na hora desses espaços de poder serem ocupados por pessoas que estudem e valorizem quem eles representam. Com tantas opções femininas, o Rio poderá, enfim, se beneficiar em ter a sua primeira prefeita. Estou me colocando à disposição.

Como pretende colocar as contas da cidade em dia, caso seja eleita?

Vamos combater a evasão fiscal, levando maciçamente a tecnologia para melhorar a cobrança da dívida ativa, que tem um estoque de mais de R$ 50 bilhões para receber, e diminuir despesas, que é o que toda mulher dona de casa faz. Porque Crivella só fez aumentar gastos com pessoal desnecessários. E ampliar a arrecadação, mas com ideias criativas e inovadoras que melhorem a eficiência, sem aumentar imposto. O brasileiro, de uma maneira geral, não tolera mais aumento de impostos. A gente consegue aumentar arrecadação resolvendo problemas que Crivella criou.

Como acredita que a crise do coronavírus pode vir a afetar um futuro governo seu?

Ela não vai afetar nenhum governo no ano que vem. Estou otimista que, em breve, teremos uma vacina. Agora, a pandemia ensinou que uma boa gestão técnica na área da saúde é imprescindível para lidar melhor com qualquer adversidade que surgir. Politizar a área da saúde é criminoso. Olha o que aconteceu com o governo do estado, que usou dinheiro público desnecessariamente para montar hospital de campanha. O grande desafio para a gestão é econômico, e isso vem antes da pandemia.

Vai ter Carnaval em 2021?

A princípio, sim. Carnaval gera toda uma cadeia produtiva na cidade, faz com que milhares de pessoas tenham a sua vida dependente disso. São mais de 60 anos de história. Estou otimista de que, até lá, a pandemia estará totalmente controlada, e até com vacina. Não acabo com o Carnaval, não, nem que se diminua o número de pessoas nas arquibancadas, durante os desfiles [das escolas de samba, na Sapucaí]. E esses podem acontecer em mais dias. No ano passado, o Carnaval movimentou R$ 8 bilhões.

Como pretende tirar a cidade do domínio das milícias?

Hoje, o grande problema da cidade não é mais o tráfico de drogas, e sim o roubo de cargas. E nossa proposta para a segurança terá a colaboração do Rodrigo Pimentel [ex-capitão do Bope e especialista em segurança pública], que tem experiência muito grande. Tenho conversado com ele sobre como a prefeitura, apesar de não ter a PM, pode interromper o contrabando na cidade, porque é isso que enche os cofres dessas organizações criminosas. São as mercadorias roubadas e vendidas. Vamos fiscalizar estabelecimentos que trabalham com mercadoria roubada e premiar quem trabalha honestamente, criar uma guarda municipal eficiente, com poder para interferir nessas atividades irregulares e criar canais de denúncias mais ágeis. A gente pode melhorar o sistema de monitoramento da cidade para controlar esses criminosos dentro de sua área de atuação. Vamos trabalhar junto com o governo do estado, e vou pedir muita ajuda ao presidente Bolsonaro, com as forças especiais no combate à violência do Rio.

Como pretende diminuir os altos índices de violência contra a mulher?

Transformando a guarda municipal em agentes de segurança. Vamos criar uma patrulha Maria da Penha na corporação e focar num equipamento fundamental para proteger as vítimas de violência, que são as casas de passagem. Outra medida fundamental é permitir a troca imediata de escola onde os filhos de vítimas de violência estudam. Eles têm que ter prioridade nas vagas. Vamos procurar auxílio e parceria com ONGs para preparar essas mulheres para o mercado de trabalho, para a primeira renda, e priorizar a contratação dessas mulheres na rede pública. E homens condenados por violência contra a mulher não serão admitidos em cargos públicos.

A mulher que mais marcou a política carioca nos anos recentes foi a vereadora Marielle Franco, assassinada em 2018. Você teme por sua segurança?

Nunca tive problema com ameaça, nem achei que tinha que andar com segurança. Porém, vou tirar um porte de arma, porque farei curso de tiro esportivo. Já tinha essa vontade, e espero nunca ter que usar. Mas estarei preparada. Além disso, sou faixa preta de caratê. Medo, não tenho não. Se as mulheres tivessem acesso ao porte de arma e fizessem defesa pessoal... Preciso oferecer curso de defesa pessoal para elas no Rio de Janeiro inteiro. As mulheres vão aprender a se defender, sim.

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