Amor e sexo

A dúvidas e dilemas mais populares do último ano, comentados por Regina Navarro

De Universa, com Regina Navarro Caio Borges/UOL

As dúvidas de um leitor ou leitora podem ser a angústia de outro, não é? Todas as segundas-feiras, a psicanalista, escritora e blogueira de Universa Regina Navarro Lins analisa perguntas enviadas por leitores sobre sexo, casamento, relacionamento e prazer. Para começar 2020 sem neuras na sua cama, selecionamos os sete textos mais clicados desde dezembro de 2018 para compartilhar dúvidas e análises.

O tema mais lido do ano na seção "Se eu fosse você" foi "Meu marido insiste em me ver transar com outro homem", seguido por "Sexo com minha colega foi muito melhor do que com minha esposa" e "Sexo para mim é sofrimento, sempre ejaculo rápido". Releia a análise de Regina para esses e outras quatro dúvidas enviadas por leitores.

Caio Borges/UOL

"Meu marido insiste em me ver transar com outro homem"

"Tenho 12 anos de casada e dois filhos. De uns tempos para cá, meu marido começou a insistir que quer me ver transando com outros homens. Já tentei algumas vezes por causa da insistência dele, mas não me sinto à vontade. Sinto que isso é tão importante para ele que tenho dificuldade de recusar."

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Há homens que são adeptos do "cuckold". Traduzindo para a linguagem objetiva, trata-se de homens que se excitam ao ver suas mulheres fazendo sexo com outro homem. E isso é bem mais comum do que se pensa.

O termo cuckold vem do inglês cuckoo, que é uma referência ao pássaro cuco, a mesma ave que inspirou o relógio cuco, pois o macho dessa espécie abriga em seu ninho uma fêmea que também se relaciona com outros pássaros.

O pesquisador da sexualidade Alfred Kinsey afirma que, entre os mamíferos, quase todos os machos e algumas fêmeas ficam excitados ao observarem animais copulando, o que também ocorre com os humanos.

Segundo suas pesquisas sobre voyeurismo, a observação do sexo oposto em atividade sexual é considerada erótica mais por homens do que por mulheres na proporção de 72% a 58%. Outro pesquisador verificou que 16% das mulheres e 83% dos homens adultos sentem desejo de observar pessoas nuas ou fazendo sexo, sendo que 20% das mulheres e 65% dos homens já realizaram isso.

O cuckold é uma espécie de voyeur. A diferença é que o voyeur se excita ao ver qualquer pessoa transando. Já no caso do cuckold, o que excita é assistir especificamente à relação sexual de sua namorada ou esposa com outro homem.

Colocar em prática uma fantasia que não é aceita socialmente -- no caso, o cuckold -- causa algum temor. Afinal, ninguém sabe o que vai acontecer depois.
De qualquer forma, é importante que o casal avalie bem a fantasia e o desejo de realizá-la que se apresenta no momento e procure se certificar de que ela está exclusivamente a serviço do prazer de ambos.

Qualquer coisa que se faça no sexo só para agradar ou satisfazer o outro pode ter um preço tão alto que acaba inviabilizando a própria relação.

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"Sexo com minha colega foi muito melhor do que com minha esposa"

"Estou casado há 15 anos e tive pouquíssima experiência sexual antes disso. Achei que durante todos esses anos o sexo com a minha mulher era bom, como o de todos os casais. Há dois meses me senti muito atraído por uma mulher que começou a trabalhar na mesma empresa que eu. Acabei não resistindo e, na semana passada, fomos para um motel na hora do almoço. Agora, não sei o que fazer. O sexo com a colega foi infinitamente melhor do que o sexo com a minha esposa! Será que passei esses anos todos sem saber o que é um bom sexo?"

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O psicanalista austríaco Wilhelm Reich (1897-1957) falava na miséria sexual das pessoas. Para ele existe em quase todos uma carência fundamental de sexo, tanto em quantidade como em qualidade. As dificuldades sexuais são tantas que quando ocorre uma descarga sexual acham que foi tudo bem.

Quando se pergunta se algumas pessoas fazem sexo melhor do que outras, muita gente responde que não. É comum ouvirmos que uma boa relação sexual depende exclusivamente do amor entre os parceiros. Mas isso não é verdade. Por mais que duas pessoas se amem, a relação sexual pode ser de baixa qualidade, com pouco prazer e nenhuma emoção.

Homens e mulheres, por conta de tantos preconceitos, tiveram inibidas a capacidade para o prazer sexual. As mulheres tiveram sua sexualidade reprimida e distorcida, a ponto de até hoje muitas serem incapazes de se expressar sexualmente, muito menos atingir o orgasmo. Os homens, por sua vez, também tiveram a sexualidade bloqueada. A preocupação em não perder a ereção é tanta que fazem um sexo apressado, com o único objetivo de ejacular.

Quem considera o sexo natural, e não tem preconceitos ou vergonha, está mais apto a um sexo de bastante qualidade. Quando a busca do prazer é livre, sem estar condicionada a qualquer afirmação pessoal, pode-se criar o tempo todo junto com o parceiro, até muito depois do orgasmo.

O único objetivo é a descoberta de si e do outro, numa troca contínua de sensações, em que cada movimento é acompanhado de nova emoção. Sendo assim, o sexo deixa de ser a busca de um prazer individual para se tornar um poderoso meio de transformar as pessoas.

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"Sexo para mim é sofrimento, sempre ejaculo rápido"

"Tenho 27 anos e vivo de forma totalmente insatisfatória a minha sexualidade. Ejaculo sempre fora de hora. Isso significa que não consigo satisfazer uma mulher. Muitas vezes ejaculo antes da penetração. É terrível, porque vou sempre tenso pra cama. Para mim, sexo é um sofrimento. Não tenho namorada há bastante tempo e nem procuro por isso. As quatro tentativas anteriores de manter um relacionamento fracassaram. E sempre pelo mesmo motivo. Nunca conversei com ninguém sobre essa questão, pois sinto muita vergonha."

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Embora o grande terror masculino seja a disfunção erétil (impotência), não é o único problema que atormenta o homem, deixando-o inseguro e, também, frustrando a mulher. A mais comum das disfunções sexuais masculinas é a ejaculação precoce: quando o orgasmo chega rápido demais para o homem.

Mas as situações são variadas. Alguns homens ejaculam logo que se iniciam as carícias ou simplesmente ao ver a parceira se despindo. Muitos ejaculam antes ou imediatamente depois de introduzir o pênis na vagina da mulher, mas outros são capazes de alguns movimentos antes de atingir o orgasmo.

O aspecto fundamental é a ausência de controle voluntário sobre o reflexo ejaculatório. Por alguma razão um homem pode nunca ter aprendido a perceber as sensações que anunciam o orgasmo e por isso o controle voluntário adequado não foi adquirido.

Nesse caso, o orgasmo ocorre como um reflexo quando é atingido um nível intenso de excitação sexual. Frequentemente, isso cria muita tensão entre os parceiros, principalmente quando a mulher fica ressentida, acreditando que o homem não se preocupa com ela nem com suas necessidades sexuais. Ele, por sua vez, se sente um fracasso e fica deprimido. A partir daí, passa a evitar relações sexuais.

Contudo, a ejaculação precoce pode ser tratada. Dentre os diversos métodos utilizados, destacam-se os exercícios para controlar a ejaculação — respiração e contração dos músculos que circundam a próstata —, que são os mesmos que permitem ao homem ter orgasmos múltiplos sem ejacular. E para o homem aprender como fazê-los sugiro o livro "O Orgasmo Múltiplo do Homem", de Mantak Chia e Douglas Arava, da Editora Objetiva.

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Caio Borges/UOL

"Tenho imaginado minha namorada e sua melhor amiga na cama comigo"

"Tenho 34 anos, sou professor universitário e namoro há três anos. Nossa relação é ótima, tanto afetiva como sexual. Mas ando preocupado com minhas fantasias na hora em que estamos transando. Tenho imaginado que minha namorada e sua melhor amiga estão na cama comigo. Como nunca contei isso para ela, às vezes, me sinto culpado."

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Num estudo da universidade americana de Colúmbia, o psicanalista G. Fogel afirma que virtualmente todos têm fantasias sexuais aberrantes, embora nem sempre conscientes do fato. Ele também admite que elas são tão frequentes nas mulheres como nos homens. A questão é que como ninguém tem coragem de contar suas fantasias, todos se assustam, pensando que são os únicos a tê-las.

Estudos mostram que um entre quatro entrevistados tem fortes sentimentos de culpa por suas fantasias. Muitos tentam reprimir suas fantasias. As mais comuns são sexo grupal, incluindo a ideia de ser observado, fantasias de dominação — ser amarrado e subjugado durante o sexo —, inversão de papéis, relação com pessoas do mesmo sexo, principalmente em lugares inusitados, e parecem existir na mesma proporção para homens e mulheres.

Mas o fato é que quase todas as pessoas têm fantasias sexuais. Existem as que não sentem muito prazer, e até mesmo são incapazes de atingir o orgasmo, sem recorrer a elas. Por mais que exista grande atração entre um casal, a excitação não se dá sempre da mesma forma, tem altos e baixos.

Acredito que as fantasias pertencem justamente a uma área de repouso da experiência humana, livre de explicações racionais. E, na maioria das vezes, muito mais prejudicial do que acontecerem na realidade é o sentimento de culpa que provocam.

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"Cheguei em casa e peguei meu marido beijando nosso amigo"

"Estou casada há cinco anos e amo meu marido. Desde o início de nossa relação nos encontramos com um casal amigo com bastante frequência. Há alguns meses, eles se separaram e a nossa amiga foi morar em outro país. Seu ex-marido continuou frequentando nossa casa com mais constância que antes. Sempre é bom estarmos os três juntos. Considero-o um homem atraente, mas nunca tive coragem de deixar isso claro. Até que um dia cheguei em casa e peguei os dois — meu marido e nosso amigo — se beijando. Conversamos e a proposta é de que eu aceite fazer parte de uma tríade, ou seja, viver uma experiência de amor a três."

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Leonie Linssen e Stephan Wik abordam em seu livro a relação amorosa entre três pessoas. Eles acreditam que um dos maiores problemas dos casais, a dualidade, se resolve pela tríade. Por isso é possível acreditar que um relacionamento em que três pessoas se amam intimamente pode ser muito gratificante.

No relacionamento monogâmico, o nível de intimidade pode levar a tipos de interação certo/errado, será/não será, ter/não ter. Mesmo com as melhores intenções pode ser difícil não cair nesses padrões, que muitas vezes podem levar a rigidez e a falhas na comunicação, pois defendemos posições fixas. A tríade, acreditam eles, oferece uma dinâmica completamente diferente. Por exemplo, durante uma interação interpessoal difícil, um terceiro parceiro pode atuar como observador amoroso.

O terceiro, como testemunha, pode ajudar os parceiros que estão interagindo a tomar consciência de suas ações e reações. Essa autoconsciência pode produzir interações mais flexíveis, abertas e receptivas. Quando não procuramos mais ter intimidade com apenas uma pessoa pode nos ajudar a relaxar e a simplesmente nos deixarmos amar. Podemos nos sentir mais reconhecidos e valorizados e a nossa própria energia vital pode fluir mais livremente e beneficiar a todos os que estão envolvidos conosco.

Uma das vantagens da tríade, segundo os autores, é que muitos se sentem mais independentes e livres do que quando formam um casal. Isso acontece tanto no nível prático quanto num nível mais sutil. Na prática, se uma pessoa quer passar algum tempo sozinha ou com amigos, ela pode relaxar, pois sabe que os outros dois parceiros dispõem de mais tempo para ficarem juntos.

Sem dúvida, muitos discordam desse texto. Na nossa cultura estar amando alguém pressupõe total exclusividade. Quase todos acreditam que o "natural" é formar um par que seja estável e duradouro. "A lógica e a linguagem sugerem que os casais, sejam eles heterossexuais, homossexuais ou até mesmo bissexuais, surgem na narrativa do amor e do desejo - como os animais na Arca de Noé - dois a dois.", diz Marjorie Garber, professora da Universidade de Harvard, EUA.

Mas cada vez mais obervamos que nem sempre é assim. E você....concorda com Leonie Linssen e Stephan Wik?

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Caio Borges/UOL

"Amo meu marido, mas imaginei estar com outro"

"Sou casada há 12 anos e amo muito meu marido. Nossa convivência é ótima e o sexo maravilhoso. Sempre acreditei que quando a mulher está satisfeita nunca vai desejar outro homem. Só que estou sentindo um tesão absurdo por um novo colega de trabalho. As últimas vezes que transei com meu marido imaginei estar com ele. Ele também está a fim de mim. Não sei o que fazer. Imaginar que estou com outro na hora do sexo com meu marido pode ser uma fase....Não quero perdê-lo de jeito nenhum."

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Sentir desejo por alguém que não seja o parceiro fixo é comum. Viver ou não uma experiência sexual com essa pessoa, depende da visão que cada um tem do amor e do sexo. No entanto, contar ao parceiro que está com desejo por outro é eliminar totalmente a privacidade e transformar uma relação amorosa em confessionário.

Há os que se sentem muito culpados quando percebem sentir desejo sexual por outra pessoa. Contam para o parceiro, tentando expiar o pecado e, depois de "perdoados", se sentirem novamente protegidos. Entretanto, pode acontecer de o parceiro que recebe a confissão se aproveitar disso para torturar o outro, afirmando não poder nunca mais confiar. A maioria dos que se calam não deixam de se culpar e, com medo de que o parceiro também sinta desejo por outra pessoa, se tornam inseguros. Ameaçados, começam a controlar tudo.

Não é tão simples viver uma relação amorosa saudável, que contribua para o próprio crescimento emocional. É necessário aprender primeiro a lidar de outra forma com as questões da vida. Você pode amar muito uma pessoa, estar namorando ou casado com ela, e ao mesmo tempo não ter dúvida de que é mais do que natural sentir desejo por outras pessoas. E saber que qualquer atitude que tomar diz respeito somente a você.

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Caio Borges/Arte

"Minha mulher transou com outro homem, mas diz que foi só sexo"

"Tenho 42 anos, sou casado há 11, e estou péssimo desde que descobri que minha mulher transou com outro homem. Nunca pensei que me sentiria assim. Conversamos e fiquei mais inseguro ainda. Ela diz que continua me amando do mesmo jeito de sempre e que não tem envolvimento amoroso nenhum com o cara. Fico na dúvida porque sempre acreditei que é fácil a mulher se envolver quando faz sexo com um homem."

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Apesar de no século 19 muitas teorias terem sido criadas afirmando que a mulher não se interessa por sexo, que seu único prazer seria cuidar dos filhos, isso não corresponde à visão predominante na história da sexualidade humana.

A antropóloga americana Helen Fisher acredita que se tivéssemos perguntado a Clellan Ford e a Frank Beach, pesquisadores sexuais dos anos 50, qual dos dois sexos era mais interessado na variedade sexual, eles teriam respondido: "Naquelas sociedades que não têm padrões duplos nas questões sexuais, e em que é permitida uma variedade de ligações, as mulheres utilizam tão ansiosamente suas oportunidades quanto os homens."

Kinsey concordava dizendo: "Mesmo naquelas culturas que tentam com mais rigor controlar o coito extraconjugal feminino, está absolutamente claro que tal atividade ocorre, e em muitos casos ocorre com considerável regularidade."

O duplo padrão do adultério - homem pode, mulher não - está desaparecendo. Durante cinco mil anos os homens acreditaram ser somente deles esse direito. Mas começam a pensar diferente. A pílula anticoncepcional, possibilitando o movimento de emancipação feminina e a revolução sexual, foi fundamental para a mudança das mentalidades.

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