Universo particular

Em casa com o marido e o filho recém-nascido,Titi Müller vive o isolamento descobrindo a maternidade

Bárbara dos Anjos Lima da Universa, em São Paulo Jorge Bispo/UOL

A câmera do zoom abre e vejo uma Titi Muller sorridente e plena. Arrisco dizer — e digo isso a ela — que essa sua fase mãe é a melhor na qual já a vi. Ela me parece calma, plena e conectada consigo mesma. Falo isso com conhecimento de causa: conheço a Titi desde que somos crianças — fui colega da atriz Tainá Müller, sua irmã mais velha, na primeira série do ensino fundamental, e somos amigas de infância. Algumas das nossas lembranças mais antigas envolve uma e a outra. Titi sempre foi agitada, elétrica, cheia de energia. Não que essas características sejam ruins, longe disso. Mas a Titi que vejo me parece mais em paz.

No meio de uma pandemia mundial, Titi passou por um dos momentos mais transformadores que alguém pode passar: uma gravidez e o nascimento do primeiro filho. E existe um mundo particular que nasce junto com uma criança. O período pós-parto, conhecido como puerpério, geralmente é cheio de grandes ondas hormonais e emocionais para a mãe. Para completar, costuma ser um momento de solidão, já que não se pode sair muito de casa com um bebê recém-nascido - qualquer semelhança com esses dias de distanciamento social são uma irônica coincidência.

Conversei com Titi dias antes do nascimento do Benjamin — quando falamos sobre as expectativas da chegada do menino e como ela estava lidando com a ansiedade do momento, catalisada pelo coronavírus. Benja chegou um pouco antes da hora, quando a mãe completava 37 semanas de gestação. E quando ele completou uma semana de vida, conversei com Titi novamente e conheci o (fofíssimo) bebê via webcam. Nesse segundo papo, ela me contou os detalhes do trabalho de parto — que durou mais de 30 horas — e como sua vida e a do marido Tomás Bertoni, guitarrista da banda Scalene, já tinha mudado em tão pouco tempo.

Quem já passou por esse momento na vida sabe que cada dia é um universo de acontecimentos e emoções. Mulheres no pós-parto ficam mais choronas, mas também muito mais fortes. E é sobre essa nova Titi Müller que nasce junto com a gestação e nascimento do Benjamin que você lê a seguir.

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Grávida no meio a pandemia

Quando Titi estava com 26 semanas de gestação, no começo de março, o distanciamento social passou a ser fortemente recomendado no Brasil pela Organização Mundial de Saúde. De uma hora para outra ela, assim como milhões de brasileiros — se viu presa em casa, tendo que rever planos e adaptar rotinas. Na parte prática, significou que o chá de bebê de Benjamin foi virtual e que, depois de nascer, ele está demorando um pouco mais do que o esperado para conhecer a família e amigos. Na parte emocional, estar grávida num momento tão único e preocupante para a humanidade foi tenso. "Quando a pandemia foi declarada, tive muita crise de ansiedade. Não consegui controlar a respiração. Foi muito difícil", lembra a apresentadora.

O sentimento não é novidade para Titi e, justamente por isso, talvez tenha lidado melhor com a situação. Antes de engravidar, ela já estava com acompanhamento médico e terapêutico para lidar com as crises de ansiedade. "Só que uma das coisas que se tem que fazer quando engravida é parar todo tipo de medicação, né? Eu estava indo bem, o começo da gestação foi muito tranquilo, trabalhei muito, gravei mais uma temporada do 'Anota Aí' [seu programa de viagens no Multishow] na África do Sul, mas quando veio a pandemia deu uma bagunçada."

Nesse cenário único até então, dezenas de coisas passaram pela cabeça dela — e de muitas grávidas. "Comecei a ficar com medo de hospital e me questionei se deveria fazer o parto em casa." Ela então acionou amigas que estavam em outros países, onde o pico do vírus já tinha passado, conversou com sua equipe médica e decidiu seguir com os planos de ter o filho no hospital. "Nunca foi meu sonho ter parto em casa. É uma parada que precisa de muito comprometimento e o medo não pode ser uma motivação, sabe?"

Aos poucos, a gravidez deixou de ser uma preocupação e passou a ser o que salvou sua cabeça de pensamentos mais tristes. "Ao mesmo tempo que preocupa, ter uma criança dá uma uma força muito grande, traz a certeza de que vai ficar tudo bem, porque tem que ficar bem", diz. Ela seguiu uma dica de ouro: foi ocupando a cabeça e os dias com atividades longe do celular e das notícias. Pintou as paredes do quarto do filho, viu séries com a irmã mais nova, a atriz Tuti Müller, e voltou a tentar a ficar mais otimista. "Não é possível que depois desse tapa na cara nada aconteça com a humanidade. Não que seja uma grande transformação. Mas microrrevoluções a gente já está conseguindo ver."

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A maternidade pode ser leve

Essa é a segunda gestação de Titi. Em fevereiro de 2019, ela sofreu um aborto espontâneo, com pouco mais de 2 meses de gravidez. Hoje, ela consegue ver como a experiência, mesmo tão triste, a preparou para a segunda gravidez. "Na primeira gravidez eu fiquei muito ansiosa, durou pouco tempo, menos de três meses, mas foi uma das experiências mais loucas e intensas da minha vida. Mergulhei de cabeça, li tudo quanto é livro sobre maternidade, puerpério, amamentação, ouvia podcasts sobre o assunto, me coloquei um peso muito grande." As preocupações se estendiam para a relação com o então namorado, hoje marido. "Eu olhava para o Tomás e pensava 'esse cara vai me largar'. Por outro lado, ele começava a roncar no meio da noite e eu pensava "como EU vou fazer para largar esse cara agora?"

E aí veio a perda gestacional. "Eu me culpei muito. Achava que tinha perdido o bebê porque eu deveria ter ficado mais tranquila. Era uma gravidez planejada, que eu queria tanto e, no momento que rolou, eu fui para esse lugar sombrio. Pensava que o bebê não quis ficar dentro de mim." Apesar de dolorosa, na terapia ela conseguiu entender que a perda teve um papel importante na sua vida. "Eu tinha colocado um peso muito grande e agora vejo como a maternidade pode ser leve."

Quando engravidou de Benjamin, já estava em outro momento. Tanto no relacionamento (Titi e Tomás casaram em setembro de 2019) quanto em relação à maternidade. "Em nenhum momento tive sentimentos tão contraditórios como tive na primeira gestação".

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30 horas de trabalho de parto ativo

Titi sentiu a bolsa romper às 4 da manhã do dia 10 de junho, enquanto assistia TV ao lado da irmã — com 11 quilos a mais e uma barriga considerável, ela já não encontrava posição confortável para dormir e as noites em claro já eram uma realidade, antes mesmo do bebê nascer. Dali até as 11 horas da manhã do dia 11, quando finalmente Benjamin daria seu primeiro chorinho, foram cerca de 30 horas de trabalho de parto (veja o relato completo no vídeo no começo desta reportagem).

Ela optou por um parto humanizado e foi acompanhada por uma equipe formada por uma doula, uma obstetriz e uma obstetra. Durante o período de trabalho de parto, recebeu, ainda em casa, sessões de acupuntura e duas visitas da doula e da obstetriz antes de ir para o hospital. Mas mesmo ao chegar na maternidade, ainda enfrentou boas horas e dores de parto. Quando finalmente, depois de muitos puxos de força, Benjamin começou a vir ao mundo, Titi se entregou à chamada "partolândia". "Nesse momento final, fiquei sentada em uma baqueta, de mãos dadas com o Tomás e fazendo força. A minha doula, a Mariana Moradas, ficou atrás de mim dando comandos".

Nessa hora, de muita energia e emoção, rola uma conexão quase mágica com todas as mulheres que já pariram. Titi falou um pouco sobre isso em suas redes sociais. Lembrei de como me senti quando minha filha nasceu, e comentei com Titi sobre isso. Juntas, nos emocionamos ao lembrar da sensação. É de arrepiar. "Pensei na minha mãe que teve duas filhas de parto normal sem anestesia. Lembrei até da minha gata de estimação que eu vi ter os filhotes em casa quando eu era criança". E foi no meio de toda essa emoção que Benjamin chegou ao mundo. "Esse momento é muito lindo. A gente fica se sentindo tão foda de conseguir parir. Assim que peguei meu filho, olhei para ele e pensei: se eu consegui passar por isso não vai ter uma demanda dele que eu não vou conseguir atender", diz a apresentadora.

Passado um mês do nascimento de Benja, os novos pais seguem desbravando um novo mundo e tentando entrar em sintonia, entre trocas de fraldas, mamadas e noites mal dormidas. "O Tomás fala que ficou muito mais puérpero do que eu. Mas eu também, todos os dias às 7 horas da noite, dou uma choradinha de amor, sabe? De medo de tanto amor assim."

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"Meu filho vai ter muito menos medo de situações comuns do que a minha filha"

No começo da gestação, antes de descobrir o sexo do bebê, o casal estava dividido: Titi queria uma menina, Tomás torcia por um menino. Apesar do seu desejo, a mãe diz que ficou aliviada ao ler o resultado do exame de sexagem fetal, que indica o sexo do bebê. "Quando vi que era menino, me deu um alívio muito grande pois pensei que meu filho provavelmente vai ter muito menos medo de situações banais, tipo descer do ônibus e caminhar até a nossa casa, do que uma filha. E vai passar muito menos tempo da existência dele odiando o próprio corpo. E sendo muito menos julgado", avalia.

Não que criar um homem branco e privilegiado não tenha seus desafios. Titi já tem algumas ideias de como fazer isso. "O mínimo que a gente pode fazer é não poupar esforços para ele entender o privilégio que ocupa. E orientar para que não seja um babaca. Se ele não for um babaca, já está ótimo." Mas a apresentadora espera que muita coisa mude na sociedade nos próximos 20 anos e que sua filha e filho estejam em pé de igualdade. Ah, sim. Esse desejo não desapareceu. "Quero muito ser mãe de menina. Estávamos entrando na fila da adoção e engravidei. Mas se adotarmos, quero uma menina".

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