Simplesmente Angélica

Aos 46, ela diz que marca namoro na agenda --com vibrador como aliado-- e jura que política não é tema em casa

Luiza Souto De Universa Julia Rodrigues/UOL
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"Eu falo pra caramba, desculpa", ri Angélica ao fim da entrevista de pouco mais de uma hora com Universa, feita por vídeo, de sua casa no Rio. Após um hiato de dois anos sem apresentar um programa, a artista de 46 anos parece ansiosa para estrear o "Simples Assim", com temas do cotidiano como felicidade, família e fé, no dia 10 de outubro, e para falar sobre o projeto —e também sobre política, bem-estar ou sexo.

"O vibrador pode ser um algo a mais no autoconhecimento da mulher, e no conhecimento do homem com você. E hoje a mulher está tendo muito mais voz para exigir prazer", diz ela ao comentar o uso de brinquedos sexuais.

Mas, apesar de se indagar constantemente sobre o papel da mulher na sociedade, principalmente após o nascimento da terceira filha Eva, 8, Angélica, que também é mãe de Joaquim, 15, e Benício, 12, de seu casamento com o apresentador Luciano Huck, diz que não leva debates políticos para seu espaço.

Sempre questionada sobre a possibilidade de o marido se candidatar à presidência (primeiro, em 2018, e agora, para as eleições de 2022), e, portanto, de se tornar primeira-dama, ela explica logo que não tem nenhuma pretensão na política.

"A minha cabeça hoje está voltada para o ser humano que sou. Essa questão política é muito do Luciano. Não é uma questão que a gente discute."

Esse ser humano que Angélica aponta é uma mulher que assume ter fios brancos e falhas hormonais e que marca na agenda uma noite mais íntima com o parceiro para manter a libido em dia. E tudo bem.

"Tem dia em que acordo me achando bem linda e tem dia em que acordo me achando um lixo. Os hormônios fazem a gente achar isso também, a cada dia estar de um jeito. Aí a gente medita duas vezes naquele dia, em vez de uma só, e vai embora."

Então, vamos!

Papo namastê

Demorou para Angélica assimilar que tinha chegado aos 40 anos. Até então, tudo parecia estar no lugar, consequência de uma vida em que nunca faltaram malhação, visitas à dermatologista e alimentação saudável. Foi aos 43, quando começaram a aparecer as falhas hormonais e os sintomas da pré-menopausa, que chegou também a percepção de que o tônus muscular, o cabelo e outras partes do corpo não eram mais os mesmos.

"O fato de ter o cabelo branco e tudo mais não é um problema. Claro que eu queria estar um pouco mais firminha. A gente vai perdendo o colágeno, e isso não tem muito jeito. Faz parte do amadurecimento. Não me incomoda porque sempre me cuidei. Nunca fiz plástica, mas, se tiver que fazer, não vejo problema."

Adepta da meditação e da ioga, ela conta que as mudanças físicas coincidiram com o momento em que estava se desligando do "Estrelas", programa que ficou 13 anos no ar e terminou em 2018, para ficar mais em casa e trabalhar esse período de redescobertas.

"Quando você descobre que está bem por dentro, em paz, as pessoas começam a te achar maravilhosa. Parece um papo meio namastê demais. Não estou 100% satisfeita, mas, quando me olho no espelho, fico feliz com tudo."

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Namorar dá trabalho

Mesmo com a pausa que havia feito nos programas de TV, a mãe de três tem uma agenda tão cheia que mal cabe tempo para curtir o marido.

"Com três filhos, é complicado. Manter a libido, o namoro, é um trabalho. E, se você já tem outro trabalho, que te dá muito trabalho, isso vai ficando de lado", diz.

"Conversamos muito e nos divertimos até com a falta de tempo. Mas, com 43 anos, quando começou essa coisa hormonal, a pré-menopausa, a libido também... desaparece. É que nem quando você tem filho. Logo depois que nasce, você fica um tempo sem saber que existe o homem. Só quer saber do bebê. E eu passei por isso três vezes na minha vida."

O segredo, ela diz, está no esforço e na organização.

"É um trabalho de namorar, marcar na agenda para jantar na varanda. E falar: 'Hoje as crianças já sabem que a gente vai namorar, então fecha a porta e vamos ver um filme'. Tem que organizar senão fica solto. É um esforço, dos dois, para melhorar. O negócio é que as pessoas desistem, veem que o relacionamento não está dando certo e partem para outra. E aí você perde a oportunidade de viver coisas incríveis, com pessoas incríveis, porque estava com pressa. A gente sempre achou que valia a pena."

É falta de informação acharem que vibrador é pra quem não tem marido

Angélica, Apresentadora

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O bonde feminista

"Claro!", disse Angélica em um bate-papo recente com a apresentadora Sabrina Sato, em seu canal no YouTube, após ser indagada sobre se usava vibrador. Na conversa, Angélica ainda defendeu a masturbação para o conhecimento do próprio prazer. A repercussão nas redes foi enorme e envolveu elogios, mas também muito machismo, com frases como "Você quer é se livrar do seu marido que não dá no couro".

A apresentadora leu tudo. E se assustou.

"Fiquei vendo o preconceito das pessoas e a falta de informação por acharem que vibrador é pra quem não tem marido. Ou, se tem, você usa porque não está satisfeita com ele. E não é nada disso. O vibrador é só um aliado no relacionamento. Ele faz parte da intimidade do casal. Pode ser um algo a mais, na verdade, não só no autoconhecimento da mulher, mas no conhecimento do homem com você", diz.

"Hoje, a mulher está tendo muito mais voz para exigir prazer, para não ter vergonha de falar o que dá prazer a ela. Tem um bonde feminista passando aí e a gente tem que montar nele e sair falando mesmo, para ver se abre um pouco essas cabeças."

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Primeira-dama, eu?

Nascida em Santo André (SP) e desde os 12 anos trabalhando na televisão, Angélica não se recorda de já ter assistido a tantas discussões sobre os direitos da mulher no meio quanto hoje. E se diz aliviada e feliz por ver uma geração de artistas falando o que pensa e mais politizada.

Nem por isso, avisa, tem pretensões políticas como o marido. Depois de muitas especulações envolvendo o seu nome nas eleições presidenciais de 2018, Luciano Huck ainda é considerado um potencial candidato ao cargo para 2022. No início de 2020, enquanto participava do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, Huck não negou quando perguntado sobre a possibilidade de uma futura candidatura à Presidência.

"Claro que o fato de o Luciano estar mais envolvido com isso acaba me influenciando como cidadã. Eu estou ao lado dele: ouço, vejo, participo e me indigno também. Ele vem com pautas, e eu falo: 'Caramba, esse não é o mundo que a gente quer deixar para nossos filhos', mas nada que eu queira viver politicamente", diz a apresentadora, que, por consequência, tem de lidar constantemente com as especulações alheias sobre se tornar primeira-dama.

"Nunca pensei em que primeira-dama eu seria. A minha cabeça hoje é [pensar] que ser humano eu sou e o que posso ser para outra pessoa, o que posso fazer de melhor. Essa questão política é muito do Luciano. Eu não tenho nenhuma. A gente brinca, ri, mas não é uma questão que a gente discute. Não é um assunto aqui dentro de casa."

Para educar crianças feministas

Reprodução Instagram

"Meus filhos sempre conviveram com o diverso. Eles veem o pai se caracterizando, se travestindo de mulher, ou de monstro. Quando eu não tinha a Eva e chegava da gravação tirando a roupa, Joaquim e Benício vinham andando com o sapato de salto atrás de mim no closet, e a gente morria de rir. Sempre tive essa coisa muito livre no sentido de deixar eles se expressarem como queriam."

Reprodução Instagram

"Quando a Eva nasceu, comecei a me policiar muito para não ter aquela coisa que todo pai e mãe fazem, de dizer: 'Fecha a perna porque você é menina'. É automático. Fomos criados assim. O máximo que eu falo para os meninos, que são maiores, é: 'Não faz isso porque ela é pequena', porque a gente tem a tendência de falar 'porque ela é menina'. É um exercício que a gente tem que fazer diariamente."

Privilégio sem culpa

Angélica diz que entender os privilégios é uma prática dentro de casa, onde mostra aos filhos, por exemplo, que enquanto eles têm acesso à educação domiciliar, muitos não têm nem conexão de internet. Mas sem culpá-los, no entanto, por seus privilégios.

"A gente não tem que ter culpa por ter privilégio, por poder ter 'homeschooling' enquanto muita gente não tem computador e nem acesso à aula. Não dá para passar essa culpa para crianças."

E destaca como faz os filhos refletirem sobre o assunto.

"A gente sempre fez doações, e as crianças sempre foram com a gente [nos locais onde ajudamos], e mostramos as desigualdades. A gente fala: 'Olha, somos brancos, privilegiados, temos tudo isso graças ao nosso trabalho, nosso esforço extremo. Porque a gente teve que deixar vocês muitas vezes aqui para trabalhar, e por isso a gente tem isso [seus bens]. E a maioria das pessoas não tem oportunidade, seja por causa da cor da pele, porque é mulher, ou porque existem várias camadas de preconceito. Isso a gente tem conversado muito com eles."

Do programa infantil à busca da felicidade

Reprodução/Instagram

Angélica estreou na TV, na Rede Manchete, no comando do programa Nave da Fantasia, aos 12. Logo depois, passou a apresentar uma versão do Clube da Criança, antes comandado por Xuxa, e o juvenil Milk Shake

Reprodução/Instagram

Aos 20, a apresentadora mudou de canal. No SBT, comandou o Casa da Angélica, o TV Animal e o Passa ou Repassa. Em 1996, foi para a Globo para conduzir o Angel Mix e ainda fez novelas infantis como "Caça Talentos"

Reprodução/Instagram

Na música, lançou o primeiro álbum, em 1988, e chegou às paradas com o hit "Vou de Táxi". Gravou 13 álbuns de estúdio. Já no cinema, também fez 13 participações em filmes, como atriz e também como dubladora

João Miguel Jr. / TV Globo / Divulgação

Após um hiato de dois anos, desde a despedida do Estrelas, Angélica agora volta ao ar com Simples Assim, em que focará em soluções de dilemas e a busca da felicidade, com histórias de anônimos e famosos

Geladeira, que nada

Ao contabilizar o tempo de carreira, que começou quando, aos quatro anos, em 1978, ganhou o concurso Criança Mais Bonita do Brasil, do programa do apresentador Chacrinha, na Rede Bandeirantes, Angélica diz que a vantagem desse início precoce foi ter adquirido segurança em tudo que faz.

Por isso, diz com firmeza que não se sentiu baqueada quando leu notícias de que foi posta na geladeira assim que saiu do ar, na Globo, em 2018. A expressão é usada para dizer que um artista está sem função, ou "encostado", na emissora. "Ninguém estava na geladeira. Foi tudo de comum acordo", ela garante. "Queria mudar um pouco o que eu vinha fazendo e é importante quando a pessoa para um tempo para criar. E a gente não se permite isso".

O trato era buscar a paz interior e mudar um pouco o foco da carreira —que começou junto com um trauma. A casa onde morava com a família, em Santo André, no ABC Paulista, foi assaltada quando ela tinha 4 anos, e o pai ferido a bala na presença da então pequena Angélica. A cena a fez se isolar naquele ano, e ela só saiu de casa após a mãe levá-la ao programa do Chacrinha, seu único passatempo à época.

Em 2015, Angélica sofreu outro trauma: o avião particular que levava ela, sua família e duas babás teve que fazer um pouso forçado numa fazenda no Mato Grosso do Sul. Huck sofreu pequenas fraturas em uma vértebra e Angélica teve lesões musculares. Um ano depois, a síndrome do pânico, que conheceu pela primeira vez aos 28 anos, voltou. E ela, que faz análise desde os 23, buscou na meditação uma resposta para o problema. Era essa pausa de que precisava, e é essa experiência que ela quer levar, também, para o novo programa, que estreia no dia 10.

"Quando tive pânico, nessa segunda vez [após o acidente], fui buscar a meditação. Voltei a fazer ioga, conheci várias terapias alternativas e me espiritualizei um pouco mais, coisas que começaram a me trazer paz. Não só para mim, mas para a minha família, porque, quando você está em paz, acho que tudo em volta se ilumina e conspira para ficar em paz também."

Julia Rodrigues/UOL Julia Rodrigues/UOL

Angélica radical

Angélica credita a companhia inseparável da mãe em todos os seus trabalhos, até que ela completou 20 anos, o fato de não ter sofrido nenhum episódio de assédio na carreira. Mas não escapou de isso acontecer com um namorado, durante uma viagem para Nova York.

"Estava viajando com um namoradinho e ele tentou me agarrar no carro. Parei, empurrei ele e fui embora. Foi instintivo, numa época em que, inclusive, não se falava disso, né? Tinha 19 anos. Hoje, as meninas têm muito mais acesso, brigam muito mais. Se um garoto chega e ela fala 'não' é não."

Hoje, ao refletir sobre sua trajetória e o meio em que trabalha, Angélica se tornou uma defensora de medidas radicais contra a violência de gênero.

"Quando aparecem movimentos como o Me Too [em que mulheres lideraram as primeiras denúncias de assédio contra o ex-produtor norte-americano Harvey Weinstein] você começa a ver, no seu entorno, no seu ambiente de trabalho, que ouvia coisinhas, que existia um assédio, mas passava como natural. A gente foi criada nessa onda do 'Ah, tudo bem'". Acho que hoje tem que ser radical", diz a apresentadora.

"É muito radical você não poder elogiar uma mulher no trabalho? Eu acho que tem que ser, porque é tão enraizada essa coisa do machismo, de a mulher ser inferiorizada no trabalho, que, se você não for lá pro extremo, para depois voltar a equilibrar a energia, não sei se vai funcionar."

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