Sexoterapia #39: "Fui estuprada durante oito anos pelo meu marido"
C*, 44, foi forçada a fazer sexo com o ex-marido durante os oito anos em que ficou casada. "Logo no primeiro ano de casamento, fiquei grávida e tive um aborto espontâneo. Precisava ficar alguns meses me recuperando, mas ele não me respeitou: me forçava a fazer sexo e era violento quando eu recusava", contou ao podcast Sexoterapia. Como resultado do abuso, C engravidou de novo, e acabou se sentindo presa ao relacionamento. "Sentia-me totalmente dominada, eu tinha nojo, mas ao mesmo tempo eu aceitava aquela situação, achando que ele ia mudar algum dia, mas não mudou. Ele me forçou a transar nas mais diversas situações, até quando eu dormia", relembra (veja o depoimento completo a partir do minuto 1:03 ).
A violência sexual cometida contra a mulher pelo parceiro é chamada de estupro marital ou conjugal. No Brasil, ela é considerada crime e está descrita na Lei Maria da Penha. Mas isso é recente: até 2003, o código penal brasileiro tratava como "débito conjugal" a recusa feminina na hora do sexo. E isso bastava para que um homem pedisse separação por justa causa. A falta de punição e o conceito imposto culturalmente pela sociedade machista de que mulher deve satisfazer seu parceiro estão entre as principais explicações para que esse tipo de violência seja o mais difícil de detectar, inclusive pelas próprias vítimas.
O sociólogo Túlio Custódio lembra que o casamento ainda está pautado nessa lógica do contrato, onde partes cedem e ganham alguma coisa. "Mas em uma sociedade machista e misógina, quem esta cedendo mais e ganhando menos é a mulher", afirma. Ana Canosa, sexóloga e apresentadora do podcast, acrescenta que a ideia do consentimento dentro do matrimônio fica perdida quando a mulher acha que tem algum tipo de dever conjugal, que não tem o direito de dizer não ao parceiro, que precisa estar sempre disponível para o sexo. "Ninguém é obrigada a nada", afirma.
Também contribui para esse tipo de agressão outro conceito machista de que os homens sempre têm de forçar algo para "se dar bem" com as mulheres. "No primeiro encontro tem que beijar, e se beijar precisa ir além do beijo. Não tem nada de errado em tentar, mas é preciso saber qual o limite, e o limite é o 'não'", diz Ana. E esse limite vale tanto para o primeiro encontro quanto para o casamento.
Violência contra mulher
Uma em cada três mulheres já sofreu algum tipo de violência física e/ou sexual. Na maioria das vezes, a violência é cometida pelo parceiro, segundo as estatísticas da Organização das Nações Unidas (ONU). A incidência desse tipo de agressão, considerada subnotificado pela maioria dos especialistas no tema, aumentou durante os últimos 12 meses, sobretudo por causa do confinamento exigido na pandemia. Nesse período, 243 milhões de mulheres e adolescentes de 15 a 49 foram submetidas à violência sexual e/ou física por um parceiro intimo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
*O nome foi ocultado a pedido da personagem
Para saber mais
- Série: I May Destroy You (HBO)
- Filmes: Effie Gray (Richard Laxton, 2014) ; Grandes Olhos (Tim Burton, 2015); O Homem Invisível (Leigh Whannell, 2020).
- Livro: "Da dor no corpo à dor na alma", Isadora Vier Machado (Editora D'Plácido); "Estupro Marital", Breno Rosostolato e Carlos Jose Teles (editora Metanoia)
- Documentário: Escola de homens (Universa )
- Cartilhas: Manual Universa para jornalistas; "Sexualidade não é violência" (cartilha em PDF disponível na internet)
Acompanhe o Sexoterapia
Violências nos relacionamentos é o tema do trigésimo nono episódio do podcast Sexoterapia. A quinta temporada do programa será dedicada a refletir sobre dilemas masculinos. Nesse episódio, as apresentadoras Marina Bessa, jornalista, e Ana Canosa, sexóloga, recebem o sociólogo Túlio Custódio.
Sexoterapia está disponível no UOL, no Youtube de Universa e em todas as plataformas de podcasts, como Spotify, Apple Podcasts, Google Podcasts e Castbox.
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