As histórias de quem está por trás das comidas de rua em São Paulo
De quantas estrelas Michelin é feito um grande restaurante? Se depender da cada vez mais popular comida de rua, sai de cena o glamour dos chefs renomados e entram os sabores e perfumes das modestas e disputadíssimas barracas ao ar livre. O segredo do sucesso e das enormes filas nas ruas? As receitas acessíveis e autênticas que são geralmente passadas de geração em geração de famílias por muitas décadas.
Veja também:
Esses cursos em SP vão te ajudar a preparar seu café da manhã orgânico
Nomade Orquestra traz quatro vozes para seu som instrumental. Veja teaser!
Costurando momentos: o renascimento do bordado em tempos tecnológicos
Esse é o mote central da série documental Street Food, da Netflix, que leva os espectadores a uma viagem gastronômica ao redor do continente asiático, apresentando receitas populares locais. Mas para além das criações culinárias, cada episódio traz relatos e histórias de quem está por trás dos pratos, revelando quem são esses personagens urbanos que encaram diariamente as dificuldades do ofício de alimentar as pessoas que se movimentam pelas cidades.
Das inúmeras séries e programas de TV às prateleiras de livrarias, com as mais variadas publicações dedicadas ao tema que pipocaram nos últimos tempos, a comida de rua vem ganhando com o tempo mais espaço de destaque. E claro, o estômago e o coração de quem busca pelo tempero único que só se encontra nas ruas.
São Paulo, capital da comida de rua
Assim como as cidades retratadas em Street Food, a metrópole paulistana também não deixa nada a desejar nesse quesito. Não à toa São Paulo tem fama de capital gastronômica: do guioza disputado aos domingos, nas ruas da Liberdade, aos famosos pastéis de feira da Dona Maria e do "Seu" Zé, a comida de rua se faz presente em São Paulo em seus terminais, prac?as, parques, mercadinhos, barracas de vendedores ambulantes e por toda a cidade.
Com a fama da comida de rua, São Paulo não apenas consolidou de vez suas feiras tradicionais, como passou a receber as mais diferentes feiras gastronômicas. No último sábado (8) e domingo (9), a cidade sediou sua primeira edição do festival Smorgasburg, a maior feira de rua do mundo, que acontece semanalmente em Nova Iorque.
O evento superou a expectativa de 50 mil visitantes em dois dias de festival, atraindo gente de toda a cidade em busca de receitas inusitadas, como o sanduíche de sorvete, o espetinho de rã e a farofa de formiga. O Urban Taste esteve por lá para ver de perto os chefs em ação. Confira:
O hambúrguer sem frescura dos amigos do Vinil (Vinil Burger)
Um dos sabores mais esperados do Smorgasburg foi o diferentão ramen burger, preparado pelo Vinil Burger, dos sócios Andre e Stefano Tarantino e Marco Magri. Mas o que agrada mesmo no dia a dia os fiéis visitantes da hamburgueria é a receita simples, mas preparada com muito sabor pela casa. A proposta é descontraída: a um valor fixo, o próprio cliente escolhe seus ingredientes e acompanha o hambúrguer em um grelha redonda giratória, remetendo à experiência da comida de rua de bairros alternativos de Nova Iorque. A hamburgueria que começou também na rua, cresceu, assim como a concorrência nos últimos anos, quando pipocaram muitas outras hamburguerias e food trucks dedicados a uma das comidas mais queridinhas dos paulistanos. Mas nada que desanime os amigos que comandam o lugar, que fazem questão de continuar ocupando as ruas. "Estamos pensando até em montar uma equipe fixa só para eventos de rua", conta André Tarantino.
Vai lá:
R. Padre Carvalho, 18, Pinheiros
R. Lemos Monteiro, 206, Butantã
R. Dr. Melo Alves, 445, Jardins
Domingo a Sábado, das 12h à 0h
Mais informações no Instagram.
O império peruano do ex-camelô Edgard Villar (Rinconcito Peruano)
Fundador do consagrado restaurante Rinconcito Peruano, o chef Edgard Villar começou como muitos outros cozinheiros: vendendo comida na rua. A busca por uma vida melhor foi o que o trouxe ao Brasil, no início dos anos 2000. Na época, Edgard preparava comida em seu próprio apartamento e vendia marmitas para seus conterrâneos, até surgirem os contratempos com o síndico do prédio. ?Eu estava muito bem na rua, mas com o problema com o síndico, decidi abrir o Rinconcito em uma sobreloja. Tinha mesa, cadeira, já tinha tudo." Não demorou muito para que a comida peruana de qualidade a preços justos ganhasse o boca a boca e fizesse os paulistanos se deslocarem para a rua Aurora, no Centro, para experimentar as delícias do país andino. "O ceviche, os frutos do mar e os peixes são os pratos que mais cativam o público brasileiro", diz. Quase 15 anos depois e 11 restaurantes abertos na capital, Edgard, que se diz um apaixonado pela comida de rua, continua no batente comandando sua equipe em feiras gastronômicas. "Eu amo vender comida na rua, você encontra e conversa com todo tipo de pessoa. Muitos não conhecem e não podem ir ao restaurante, mas na rua têm a oportunidade de provar a nossa comida", conta emocionado.
Vai lá:
R. Aurora, 451 - Santa Ifigênia
Segunda-feira, das 12h às 17h
Terça-feira a Sábado, das 12h às 22h
Domingos e Feriados, das 12h às 21h
Mais informações no Instagram.
Das pâtisseries para as ruas com os macarons da Daniela (D`Macarons)
Muito se fala sobre a democratização da gastronomia com a comida de rua. Com a D`Macarrons, da chef mineira Daniela Diniz, não foi diferente. Os sabores e as cores que antes só poderiam ser provados em uma fina pâtisserie - ou a uma viagem à Paris -, ganharam as ruas da capital paulistana em 2012. O sucesso vem da receita original, a mesma do macaron parisiense feito com farinha de amêndoa e recheio de ganache. "Um dos maiores desafios que têm na gastronomia, principalmente na pâtisserie, é conseguir acertar o macaron", diz Nilton Diniz, esposo da chef. A receita certeira garantiu que no primeiro ano de existência fossem produzidos mais de 80 mil macarons, a maior parte sendo vendida em feirinhas como a Benedito Calixto e o extinto Butantan Food Park, onde fica atualmente a Vila Butantã. E das ruas, os macarons de Daniela foram para a inauguração da Le Courdon Bleu em São Paulo, o mais renomado instituto francês de culinária. Hoje a loja tem ponto fixo, em um casarão em Perdizes, onde os doces que dão nome à casa saem em sabores como baunilha, limão-siciliano e cereja amarena.Vai lá:
Rua Itapicuru, 551 - Perdizes
Segunda a sábado, das 10h às 18h30
Domingo, das 10h às 17h30
Telefone: (11) 3596-3779
Mais informações no Instagram.
Outros chefs e criações culinárias para conhecer em SP:
Barraca do Zé, um patrimônio do Pacaembu
José Hiromi Mori é o Zé, da Barraca do Zé da feira do Pacaembu, onde está desde o início dos anos 90 - ao lado da dona Maria (Pastel da Maria). Foi com os pais, aos 15 anos, que aprendeu a amassar, fritar e montar manualmente os pastéis sem economizar no recheio. Sempre às terças, quintas, sextas e aos sábados, ele monta duas tendas em frente ao Estádio do Pacaembu, onde fregueses se amontoam em volta para disputar um dos seus mais de 40 sabores.
Vai lá:
Feira do Pacaembu
Praça Charles Miller - Pacaembu - São Paulo - SP
Terça, quinta, sexta e sábado, das 5h30 às 14h
As Zunigas e as saltenhas
Aos domingos, a barraca mais concorrida da feira boliviana Kantuta, no Pari, é a Los Caporales, comandada pelo brasileiro Wilson Ferreira, marido de Mirian Zuniga. Mirian é nascida em Cochabamba, e de lá, trouxe a receita de saltenhas da mãe, Florencia Zuniga, dona dos segredos do molho e da massa das "empanadas da Bolívia". Em mais de 20 anos, a família criou nada menos que 45 receitas e vendeu 65 mil salgados. A maioria do público que freqüenta a feira é de bolivianos, mas os brasileiros já começaram a descobrir os sabores e o artesanato vendidos no local, um pedacinho colorido e saboroso do país em plena São Paulo.
Vai lá:
Feira Kantuta
R. Pedro Vicente, 700 - Pari (próximo a Estação Armênia do Metrô)
Domingo, das 11h às 19h
Mais informações no site.
Família Nakamura e a barraca de guioza
O guiozá é um pastel de carne moída com legumes, que pode ser frito ou cozido no vapor. Quase todo restaurante japonês possui este prato em seu cardápio, mas existe uma receita que é referência na cidade: o guiozá da Família Nakamura, uma das primeiras a chegar no Brasil durante a 2ª. Guerra. A matriarca Nakamura começou na então pequena Feira da Liberdade com uma clientela básica, os japoneses que moravam no bairro. Mas com a volta de grande parte dos descendentes para o Japão, acabou adaptando sua receita para o público brasileiro, que pode até hoje ser degustada, sob o comando do filho Frank Nakamura.
Vai lá:
Pça da Liberdade s/n metrô - Liberdade
Domingo, das 10h às 19h
Mais informações no Facebook.
Uma paixão antiga dos paulistanos
Ainda nos séculos 19 e 20, a chegada de estrangeiros dos mais diversos países trouxe para a cidade uma variedade imensa de comidas, que não tardaram a chegar às ruas também. Desde essa época, a comida de rua passou a fazer parte da memória paulistana.
Nos últimos anos, a cidade registrou um novo boom da gastronomia urbana e o movimento ganhou ainda mais adeptos. Quem se lembra de quando Alex Atala e um grupo de cozinheiros se reuniu no Minhocão para realizar o "Mercado Chefs na Rua", em plena Virada Cultural em 2012? A proposta, até então inédita, era oferecer a oportunidade de saborear pratos simples feitos por chefs famosos a preços módicos - uma versão tupiniquim do festival Smorgasburg. No fim, a procura foi tão grande que a estrutura montada não deu conta de atender a tanta gente e o caos foi inevitável. Sinal de que havia um público ávido pelos sabores da rua.
Apesar de toda a procura, a comida de rua ficou por muito tempo marginalizada e só foi regularizada na cidade em 2016, na gestão do então prefeito Fernando Haddad. Em maio, o atual prefeito Bruno Covas sancionou a lei que regulariza a atividade de pequenos e micro empreendedores que trabalham com alimentos. Antes das medidas, só vendedores de cachorro-quente tinham autorização para trabalhar nas calçadas da cidade, além de alguns comerciantes que atuavam em feiras.
Mais recentemente, o aumento do desemprego e a dificuldade de conseguir um trabalho formal levou muitos outros brasileiros para a profissão. Hoje, estima-se que haja mais de 100 mil trabalhadores de comida de rua na cidade.
Para registrar os principais pontos de comida de rua na cidade, a ACOR-SP (Associação de Comida e Bebida de Rua de São Paulo) criou o guia "Onde tem comida de rua hoje?". A iniciativa mapeia as regiões da Bela Vista, Centro, Santo Amaro e Jabaquara e é um bom ponto de partida para descobrir por conta os verdadeiros tesouros gastronômicos da cidade.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.