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36 Horas em Salvador: Vida noturna, candomblé e acarajé na capital da Bahia

SETH KUGEL<BR><br>New York Times Syndicate<br>

26/04/2009 07h15

Fora a semana do Carnaval, quando a ênfase claramente está no presente, a cidade de Salvador parece quase obcecada pelo seu passado africano. Em nenhum outro lugar no Brasil a profunda influência de três séculos e meio de escravidão é tão óbvia, da cor da pele das pessoas à cor de seus alimentos (frequentemente laranja, devido ao uso ubíquo do óleo de dendê); da profunda influência das tradições religiosas de origem africana do candomblé aos ritmos musicais do axé e do samba. No bairro do Rio Vermelho, lar da vida noturna mais agitada desta cidade na Baía de Todos os Santos, até mesmo os garotos descolados evitam os bares e restaurantes mais chiques em prol das praças públicas, bebendo cerveja e comendo o tradicional acarajé, uma massa frita de feijão fradinho de origem africana.



Sexta-feira


15h - Arte nova, ambiente colonial
O público Museu de Arte Moderna da Bahia, ou MAM (Avenida Contorno; 71-3117-6141; www.mam.ba.gov.br), exibe artistas contemporâneos, mas ainda assim está inseparavelmente ligado ao passado baiano. O MAM fica localizado ao longo da costa no Solar do Unhão, um complexo colonial do século 17 que agora abriga instituições culturais e eventos. A coleção do museu inclui artistas brasileiros proeminentes do século 20 como Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti.

18h - Guerra das baianas
Passe sua primeira noite no bairro do Rio Vermelho, onde a ação começa no happy hour. Escolha uma praça e pegue uma das mesas servidas por garçons dos bares próximos. Então envie um amigo para esperar na fila nas barracas onde mulheres vestindo os trajes tradicionais de baiana preparam o acarajé, bolinhos de massa frita em óleo de dendê até ficarem crocantes, e que então as partem no meio e recheiam de molhos, camarão e pimenta malagueta (R$ 4). As barracas são conhecidas pelos nomes de suas fundadoras: a barraca mais agradável é onda a famosa Dinha foi mestre do acarajé até sua morte no ano passado. Felizmente, a barraca que leva seu nome prosseguiu sem ela (Largo de Santana; 71-3334-4350).


  • Lalo de Almeida/NYT

    Baiana prepara acarajé na região de Rio Vermelho



20h - África via Brasil
Perto do Largo da Cira fica o adorável restaurante baiano Dona Mariquita (Rua do Meio, 178; 71-3334-6947; www.donamariquita.com.br). O interior é decorado como um terreiro de candomblé (onde as cerimônias religiosas são realizadas), com telhado de palha, paredes brancas e toques de cor distribuídos de forma parcimoniosa. Leila Carreiro, a proprietária, encheu o cardápio com pratos tradicionais com influência africana que estavam sendo esquecidos, como o arroz-de-hauçá (R$ 36), uma porção de arroz de coco, charque desfiado e molho de camarão defumado com azeite dendê e cebola.

22h - Beco do França
A menos que esteja chovendo, seria tolice ficar sentado no interior do Boteco do França (Rua Borges dos Reis, 24A; 71-3334-2734); em vez disso, encontre uma mesa vazia no beco estreito entre o bar e a igreja evangélica vizinha, conhecido afetuosamente como Beco do França (um dos proprietários do bar). Os transeuntes se desviam das mesas para usar o beco como um atalho entre as duas ruas principais.

Meia-noite - Troca de pneu
Há um velho ditado baiano: "Me mostre uma borracharia e eu lhe mostrarei a casa noturna mais bacana da cidade". Ok, não é um velho ditado, mas poderia ser. A Borracharia (Rua Conselheiro Pedro Luís, 101-A; 71-9142-0456) é literalmente uma borracharia de dia, como seu dono sem camisa e barrigudo pode provar. À noite, os pneus são empilhados, o bar abre, o D.J. chega e a festa começa.



Sábado


11h - A cidade velha
É muito fácil passar toda uma tarde nas ruas íngremes e de paralelepípedos do bairro do Pelourinho. Ele foi recuperado de sua reputação decadente, de prostituição e criminalidade, nos anos 1980, se transformando na atual versão turística, mas ainda assim irresistível. Circule pelo impressionante interior barroco revestido de ouro da Igreja e Convento de São Francisco (Terreiro de Jesus; 71-3322-6430), compre um coco de um vendedor ambulante ou, se tiver sorte, se depare com o ensaio ensurdecedor ao ar livre dos jovens percussionistas da escola de música Olodum.

16h - Estampas afro-brasileiras
Há muitas lojas de artesanato e design de qualidade variada no Pelourinho. Uma com a qual você pode contar é a Didara Design by Goya Lopes (Rua Gregório de Matos, 20; 71-3321-9428; www.didara.com.br) que exibe as famosas estampas de temas africanos de Lopes - pessoas, animais, abstratos - em camisetas, vestidos, aventais, travesseiros e tecidos comprados por metro. De luxo, mas com preço não inacessível (tops elegantes para mulheres custam a partir de R$ 42), seu trabalho é tão soteropolitano quanto o acarajé.

17h - Café com vista
É fácil esquecer que você está na Cidade Alta, mas você logo se lembrará ao caminhar até o Cafélier (Rua do Carmo, 50; 71-3241-5095; www.cafelier.com.br), no bairro de Santo Antônio do centro histórico. O café, que mais parece uma loja de antiguidades, oferece uma vista impressionante da baía. Tire uma foto; você pode remover depois com o Photoshop qualquer navio de cruzeiro intrometido.

19h30 - Manobras defensivas
O Forte Santo Antônio Além do Carmo (no final do Largo de Santo Antônio; 71-3117-1488), um ex-forte e presídio, atualmente é conhecido como o Forte da Capoeira, um centro para a forma de dança e artes marciais que nasceu das tradições dos escravos africanos. É possível realizar nos dias úteis uma visita mais completa (R$ 3), mas na noite de sábado às 19h30, entre gratuitamente e siga o ritmo até a sala de aula, onde mestre e alunos praticam.

21h - Jantar no jardim
O caos do Pelourinho desaparece assim que você ingressa no jardim do Maria Mata Mouro (Rua da Ordem Terceira, 8; 71-3321-3929; www.mariamatamouro.com.br) e se senta sob um florido jasmim-manga. O cardápio é tão internacional que você pode ficar tentado a ignorar a tradicional moqueca de peixe. Mas certifique-se de que pelo menos alguém de seu grupo peça (o cardápio diz que a porção é para dois -a R$ 76- mas é possível pedir meia porção); o restaurante prepara uma versão mais leve do prato do que a maioria e o executa com perfeição.

22h - Hora da saideira
O Pelourinho não é um Rio Vermelho no que se refere à vida noturna, mas é possível parar para uma cerveja e música ao vivo em quase toda parte, ou tomar a saideira no O Cravinho (Terreiro de Jesus, 3; 71-3322-6759), um bar escuro de mesas de madeira pesadas que serve cachaça, o licor de cana-de-açúcar brasileiro, e infusões. A infusão que lhe dá nome leva cravo, mas há algo para todos - casca de laranja ou gengibre, por exemplo. Há momentos que exigem cautela no Pelourinho - ele pode ser perigoso à noite - mas os táxis na praça central ficam à espera para levar você para casa.



Domingo


Meio-dia - Saindo da cidade
Vale a pena fazer a viagem de táxi de 20 ou 30 minutos até Boca de Galinha (Rua da Estação, 58; 71-3398-1232) para conferir a receita de sucesso descoberta pelo proprietário, Nilton Souza: Encontre um imóvel decadente. Monte algumas mesas na sacada com vista para a baía. Escreva o cardápio diário de moquecas e peixe frito à mão em cadernos escolares. Para evitar a espera, chegue ao meio-dia.

14h - Sobremesa e milagres
Não é preciso pegar um táxi para voltar à cidade. Se informe onde fica a balsa próxima que levará você até o outro lado da baía, para o bairro da Ribeira. Pare na Sorveteria da Ribeira (Largo da Ribeira, 87; 71-3316-5451) e tente descobrir qual fruta exótica misteriosa dá o melhor sorvete: Siriguela? Graviola? Umbú? Cupuaçú? Então tome um táxi rápido (ou caminhe cerca de dois quilômetros) até a igreja mais famosa de Salvador, Nosso Senhor do Bonfim (Praça Senhor do Bonfim; 71-3316-2196), onde réplicas de partes do corpo deixadas como agradecimento estão em exibição na Sala dos Milagres.



O básico


Como chegar lá
Várias companhias aéreas fazem a viagem de São Paulo a Salvador. Uma viagem de táxi do aeroporto até a cidade custa pelo menos R$ 60, nos carros brancos com a inscrição "Táxi Comum".

Onde ficar
Aqueles que querem ficar próximos do Pelourinho podem experimentar a Casa do Amarelindo (Rua das Portas do Carmo, 6; 71-3266-8550, casadoamarelindo.com.br), um pequeno hotel aconchegante. As diárias custam a partir de R$ 259 (R$ 345 na alta temporada). As opções de hotel no Rio Vermelho variam de quartos com vistas extraordinárias no Pestana Bahia (Rua Fonte do Boi, 216; 71-2103-8000, www.pestana.com), à partir de R$ 260 a noite, a quartos à partir de R$ 161 no Hotel Catharina Paraguaçu (Rua João Gomes, 128; 71-3334-0089; www.hotelcatharinaparaguacu.com.br), um oásis repleto de arte no meio da vida noturna agitada do Rio Vermelho.

Tradução: George El Khouri Andolfato