Etarismo: vídeo do Porta dos Fundos trata geração 50+ como incapaz
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Você consegue imaginar que alguém com visibilidade na mídia hoje poderia fazer piada impunemente tratando como incapaz uma pessoa negra, trans ou obesa, por exemplo? Mesmo quem faz humor e defende a liberdade de expressão sabe que certos preconceitos não cabem mais e não deveriam ter graça nenhuma.
Pois foi exatamente isso que o grupo Porta dos Fundos fez há alguns dias ao lançar um vídeo em seu canal chamado "Responsável", em que Fábio Porchat interpreta um homem numa reunião online que é interrompido pela mãe. Como se estivesse falando com uma criança, ele diz: "Toma o celular aqui, vai brincar com ele. Brinca aí com ele, bonitinho, que eu vou trabalhar aqui."
Quando suas colegas na reunião o questionam sobre ele deixar a mãe ficar no celular sozinha. "Supervisão pra quê? Uma mulher adulta, de 57 anos." Uma delas rebate: "Exatamente, nessa idade que é muito perigoso, largar o celular nas mãos deles. Você não sabe o que ela está acessando, pode estar recebendo fake news de um estranho."
Me chamou atenção que até mesmo o grupo de humor que se esforça tanto para combater preconceitos em seus vídeos tenha tratado o público 50+ de maneira tão equivocada. Esse tipo de atitude e de pensamento tem nome: etarismo (ou ageísmo), que é toda forma de estereótipo, preconceito e discriminação baseado em idade.
Ele está em todos nós e é tão comum que quase não nos damos conta. Como bem disse em um artigo recente a antropóloga Miriam Goldenberg, autora do livro "A Bela Velhice": A gente precisa combater esse preconceito dentro de nós mesmos.
Se você já passou dos 40, 50 anos, quantas vezes já ouviu ou repetiu a frase: "Não tenho mais idade para isso"? Quantas vezes questionou se certas atividades seriam adequadas para você? Quantas vezes ouviu que não poderia mudar de emprego ou, pior, teve uma vaga negada por "ser velho demais para ela"?
O vídeo do Porta dos Fundos é errado porque perpetua esse preconceito. Porque reforça que depois de uma certa idade somos incapazes, precisamos de tutores, somos um estorvo.
E aí, eu conto ou vocês contam para a turma do Porchat o que é ter 50 anos hoje?
Geração X tem 56% mais renda que os millenials
A geração X (dos nascidos entre 1960 e 80) representa, hoje, 1/4 da população e é responsável por mais da metade da renda gerada no Brasil. Comparada aos millennials, cuja faixa etária são de pessoas nascidas entre o início dos anos 1980 e o fim da década de 1990, a renda da geração X é 56% superior, de acordo com as informações do estudo Dynamic Big Data, que possui informações de renda estimada de mais de 48 milhões de brasileiros com vínculo empregatício.
A geração X também é a mais empreendedora: das 2,6 milhões de empresas criadas no país em 2018, 34,2% delas têm por trás pessoas acima dos 50 anos.
A geração X é a que mais consome uma série de conteúdos online, como sites de notícias, finanças e automotivos, segundo dados da ComScore.
E antes que alguém diga: "Ah, quanto mimimi, é só uma piada", vale lembrar que a piada vem carregada de estigmas que moldam nossa maneira de encarar a maturidade.
A única certeza que temos na vida é que todos nós vamos ficar velhos (menos quem morrer antes, obviamente). E ainda assim é algo que a gente se esforça muito para negar. Mas está na hora disso mudar.
E certas coisas só mudam se a gente falar sobre elas. Se a gente colocar o assunto no meio da sala, na TV, na mídia, na conversa de bar. Mudança de cultura passa, sim, por a gente aprender a não fazer piada preconceituosa.
Eu tenho 50 anos e não sou a "velhinha incapaz" de quem o Porta dos Fundos riu (imagino que não se deram conta do erro). Estou aqui para gritar isso aos quatro cantos!
No meu Instagram (@silviaruizmanga) recebi muitas mensagens de pessoas se sentindo da mesma forma. Um vídeo da escritora Cris Guerra sobre o assunto teve quase 2.000 comentários de pessoas maduras que apenas querem ser respeitadas em qualquer idade. É fácil, Fabio Porchat, tenho certeza que você consegue.
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