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Alexandre da Silva

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Que todos possam envelhecer com mais saúde mental e menos sofrimento

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

19/09/2022 04h00

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As notícias nem sempre são boas para começar um dia:

- Uma mulher de 55 anos acaba de saber que foi demitida do local onde trabalhou a vida toda!
- Neto está desaparecido e avó relata estar há mais de três dias acordada!
- Um senhor de 65 anos caiu na calçada por não enxergar direito! E frustrado por não ser a primeira vez, desaba de tanto chorar por não se sentir tão independente para sair de casa sozinho!

Outras notícias não deixam pessoas mais velhas dormirem bem:

- O som das balas ou das motos só não atrapalha o sono de quem não mora ali, naquele bairro onde se podia ficar sentado até muito tarde, sem qualquer violência, relata uma senhora mais velha!
- Hoje mais uma criança chorou de fome no portão daquele casal de pessoas idosas, comenta um vizinho.
- Mais um filho mais velho que ficou desempregado! A senhora já não tem lágrimas para lamentar tanta desgraça em um único ano, reforça a assistente social que trabalha naquela comunidade há mais de 15 anos!

Esses exemplos, ainda que pareçam fictícios, podem ser histórias reais de muitas pessoas que envelhecem no nosso país. Poderia trazer números sobre a violência, sobre as altas taxas de desemprego, sobre o número de crianças de 8 ou 10 anos que ainda não sabem ler, e também sobre o tal processo da aposentadoria que nunca é concluído.

Tudo isso para contextualizar a dificuldade que muitas pessoas têm para manter uma boa saúde mental. Na verdade, parece ser muito mais fácil encontrar possibilidades para o adoecimento mental.

Pessoas idosas e aquelas já não tão jovens experimentam situações muito desagradáveis relacionadas aos agravos ou sofrimentos mentais. Há sintomas depressivos que, erroneamente, são confundidos com um caráter típico de velhos e velhas, marcando mais uma característica da discriminação e do estereótipo negativo criado nessa atual cultura.

Há um julgamento precoce e injusto, causando sofrimento por décadas a muitas pessoas, já que são mal compreendidas por familiares e amigos.

Essa pessoa que está sofrendo é considerada chata e ponto. Ninguém se preocupa em olhar para trás e lembrar que quem hoje não tem vontade sequer para sair da cama, trocar de roupa ou tomar banho, já foi a pessoa mais animada.

Perceba que é um comportamento estranho que necessita de uma melhor observação e, muitas vezes, de um acompanhamento profissional, como geriatra, psicólogo, médico da família ou psiquiatra.

E os sofrimentos mentais vêm de várias formas. Em algumas situações que envolvem a aceleração de batimentos cardíacos, sudorese, suor na testa e tantas outras repercussões corporais notam-se reflexos da epidemia de ansiedade que afetou a sociedade mundial.

Já se acorda com a preocupação com o que não foi possível fazer ontem e de que hoje o dia já é curto para se fazer tudo que é necessário.

Assim, pessoas vão envelhecendo sem respirar direito, tensionando ombros e dentes. Fábio Ferrari, um dentista especialista da área da gerontologia, relata que casos como o bruxismo, que tem o ranger dos dentes como uma das manifestações dessa desordem funcional, aumentou consideravelmente nos últimos anos. E assim quebram-se dentes por tanto sofrer.

E outros sofrimentos causam tensões musculares ininterruptas, obrigando o uso descontrolado de analgésicos e outros medicamentos similares. A raiva resultante desse sofrimento mental, diminui a tolerância de muitas pessoas para o convívio social e, com isso, há mais brigas, toda hora e por qualquer coisa, até pelo não respeito à escolha do voto alheio.

E assim pessoas mais velhas ficam sem viver o presente, seja o seu, o da família ou de amigos. É uma eterna preocupação que, quando sem controle, necessita que essas pessoas procurem profissionais da saúde ou alguma liderança religiosa. A busca sempre é por uma solução ou alívio.

Há também aquelas situações nas quais a dor, o vazio, a falta de esperança e de propósito de vida chegam de forma avassaladora ou muito sorrateira. Elas se fingem de sombra, para sempre estar por perto, ou se transformam em um copo d'água e um certo comprimido, para ser algo de consumo diário ou, na pior das situações, imitam o oxigênio e são consumidos 24 horas por dia.

Um consumo ruim, já que faz com que os pulmões não sejam utilizados na sua totalidade. É, muitas vezes, uma respiração rápida, quase que superficial. Outras vezes, é uma respiração profunda, mas sem tanta conexão com a alma.

E, diante de tantas situações desconfortáveis e causadas pela maldade presente na sociedade, é também necessário pensar nos problemas que culminam na ideação suicida que, muitas vezes, acaba com a concretização do fato e, na minha opinião, quando ocorre, reflete o fracasso de uma sociedade em manter viva uma pessoa, seja ela quem for.

Durante a pandemia, houve um aumento de 9% das mortes por suicídio entre as pessoas idosas, sendo mais preocupantes as mortes ocorridas na região Norte (com uma alta de 53%). Para o psicólogo Felipe Ornell, uma das explicações foi o isolamento social que afetou duramente esse grupo.

Felipe questiona se a falta de oxigênio que ocorreu na região Norte tenha sido um dos motivos para o aumento dos casos nessa região do país. Além disso, entre mulheres também houve um aumento dos casos.

Esses dados podem ainda aumentar, pois o período pandêmico continua e ainda há muitas pessoas sofrendo, estejam essas com 40, 50, 60 anos ou mais. Mais desemprego, mais violência doméstica, mais sobrecarga de trabalho, dentre outros fatores, podem afetar muita gente ainda.

Se você está sofrendo ou já tem algum diagnóstico de algum problema que afeta sua saúde mental, continue a se tratar. Não pare precocemente. Na medida do possível, procure introduzir boas práticas que te façam ficar bem.

Se alguém que conhece está sofrendo, mas não compreende ou aceita a gravidade do problema, não a abandone. Tente ajudar, de alguma forma. Deixe pistas de que você quer ajudar, peça para outras pessoas, também queridas dessa que está sofrendo, que tentem também ajudá-la.

Nesse momento de tantas adversidades e problemas sociais e pessoais, vale lembrar a frase de que ninguém larga a mão de ninguém! Cada vez mais essa conexão precisa existir entre nós!