Taise Spolti

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Opinião

Quais os benefícios da cannabis para atletas? Uso é considerado doping?

Você já deve ter percebido que o uso de medicamentos à base de canabinoides vem aumentando. E o tratamento atualmente é muito utilizado não só para condições que o CBD tem eficácia reconhecida (epilepsia, esclerose múltipla, depressão etc.), como também por quem busca bem-estar e até melhora da performance esportiva.

Mas como a cannabis pode ser útil para pessoas que não têm o diagnóstico de doenças que a planta ajuda a tratar?

No esporte, muitos atletas se beneficiam do uso de isolados da erva especificamente para reduzir dores, acelerar a recuperação e aumentar a potência.

Nos distúrbios alimentares, pacientes conseguem resultados no controle do apetite, na diminuição da ansiedade —causa típica da fome emocional— e na redução de marcadores bioquímicos relacionados à síndrome metabólica. Outros casos incluem aumento do foco, memória, cognição, redução de dores articulares e musculares crônicas, controle de processos inflamatórios, síndrome do intestino irritável. Algumas referências ainda indicam controle das crises e inflamações decorrentes de doenças inflamatórias intestinais, acne, sono etc.

Para que você possa compreender melhor os efeitos da cannabis no esporte e na saúde, antes preciso explicar os ativos encontrados na erva —lembrando que o foco aqui é a planta medicinal com fins terapêuticos, não o seu fumo. Não entraremos nesse assunto nem em palpites políticos ou culturais.

Quais são os ativos encontrados na cannabis?

CBD (CANABIDIOL)

  • Efeito: não psicoativo, possui propriedades anti-inflamatórias, analgésicas, anticonvulsivantes e ansiolíticas.
  • Usos medicinais: epilepsia, ansiedade, dor crônica, inflamação, entre outros.

CBG (CANABIGEROL)

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  • Efeito: não psicoativo, o ativo é considerado "célula-tronco" dos outros canabinoides. Pode ter efeitos analgésicos, antibacterianos e anti-inflamatórios.
  • Usos medicinais: glaucoma, inflamações, doenças intestinais. É a principal substância usada no esporte.

CBN (CANABINOL)

  • Efeito: levemente psicoativo, a substância é conhecida por suas propriedades sedativas e para ajudar no sono.
  • Usos medicinais: insônia, dor, estimulação do apetite. Esse isolado é o mais indicado para quem tem problemas relacionados ao sono, mulheres na menopausa e também no desmame de medicamentos que induzem o sono.

THC (TETRAIDROCANABINOL)

  • Efeito: psicoativo, responsável pelo "high". Pode ter efeitos analgésicos, estimulantes do apetite e eufóricos.
  • Usos medicinais: dor crônica, náusea, transtornos alimentares, esclerose múltipla.

THCV (TETRAIDROCANABIVARINA)

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  • Efeito: Psicoativo em doses altas, mas em pequenas doses pode ser um antagonista do THC. Pode suprimir o apetite.
  • Usos medicinais: obesidade, diabetes, transtornos de ansiedade.

Estes são os ativos mais comuns e de fácil prescrição e compra, afinal as empresas do mundo todo já se concentram em produtos à base dessas principais substâncias.

Muitas empresas vêm usando isolados de terpenos para potencializar o tratamento inclusive de outras drogas alopáticas, um componente que confere aroma nas plantas (todas as plantas possuem!), e são através dos terpenos que a aromaterapia vem se destacando a nível mundial (sim, as gotinhas famosas).

O uso no esporte na prática

Conversei com o atleta Fernando Paternostro (@atleta.cannabis) e com o fisioterapeuta Tiago Zamberlan sobre o uso da cannabis principalmente na atividade física.

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Fernando contou que faz o tratamento com cannabis voltado para performance esportiva desde 2018, quando começou a praticar triatlo. "De lá pra cá, vi meu desempenho evoluir de um atleta amador iniciante para o que eu chamo de categoria semi-pro. Atualmente, disputo o circuito brasileiro de Ironman 70.3, que tem cinco etapas (Florianópolis, Fortaleza, São Paulo, Aracaju e Rio de Janeiro)."

O Ironman 70.3 é uma competição de longa distância, com 1,9 km de natação, 90 km de ciclismo e 21,1 km de corrida. Fernando diz que seu tempo médio em cada prova é de 5 horas e o desgaste físico é altíssimo, com o gasto energético ultrapassando as 6.000 calorias.

"Utilizo os fitocannabinoides antes, durante e depois da competição, com diferentes objetivos. O CBD, por exemplo, costumo utilizar para controlar a ansiedade e melhorar a recuperação muscular. O CBG uso para aumentar o foco e a clareza mental. O CBN uso à noite, para maximizar a qualidade do meu sono. E o THC utilizo de forma pontual, para melhorar a bronquio e vaso-dilatação, além da gestão da dor e do desconforto", explica o atleta amador.

Como a canabbis ajuda no controle da ansiedade?

Segundo Fernando, muitos atletas, inclusive os que estão disputando as Olimpíadas, adotam a terapia com cannabis para controlar o estresse e a ansiedade relacionados ao desempenho esportivo.

"A cannabis possui comprovações científicas no controle da ansiedade e gestão do estresse, trazendo um equilíbrio maior para atletas em período pré-competitivo. Um dos pontos que acredito ser interessante ressaltar é a questão do sono. A ansiedade pre-prova pode gerar um nível de insônia alto, que prejudica o atleta dias antes do momento onde precisa estar mais centrado."

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Sendo assim, ao fazer o tratamento com cannabis, o atleta pode ter uma noite de sono de qualidade e, consequentemente, performar melhor no dia da competição.

Um atleta que usa CBD pode ser pego no doping?

Fernando Paternostro afirma que o fácil acesso que os atletas têm aos produtos gerou muita confusão sobre a permissão da utilização de substâncias da planta dentro do esporte profissional, com a preocupação de uma eventual penalidade por doping.

Em 2018, a Wada (Agência Mundial Antidoping) removeu o CBD (cannabidiol) da lista de substâncias proibidas, permitindo que atletas façam uso do componente não-psicoativo da cannabis. Agora, mais recentemente, o THC também sofreu uma revisão da política de proibição.

Quais são os efeitos da cannabis sobre a inflamação e as lesões esportivas?

De acordo com o fisioterapeuta Tiago Zamberlan, os fitocannabinoides agem nos receptores do sistema endocannabinoide espalhados pelo corpo, provocando um equilíbrio (homeostase) no organismo. "Isso inclui, mas não se limita, às inflamações decorrentes da prática de atividade física e inclusive lesões decorrentes do esporte. Sendo assim, esses fitocannabinoides acabam por modular a inflamação e controlar esse processo inflamatório, otimizando a recuperação, acelerando o processo e permitindo que atletas consigam performar melhor em curtos espaços de tempo."

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Além disso, o uso para quem tem dores crônicas não relacionadas ao esporte é amplamente indicado.

Cannabis na gestão da dor

Zamberlan explica que a principal questão relacionada à gestão da dor está no deslocamento do desgaste neuro-motor —que é a mensagem que o cérebro manda para os músculos avisando que existe um processo inflamatório ocorrendo e, consequentemente, a dor se torna perceptível.

"Quando o paciente faz uso de fitocannabinoides (em especial o THC), esse deslocamento acontece de forma generalizada e a tolerância aumenta para a dor. O que, por um lado, é muito positivo, pois permite empurrar os limiares para além dos níveis costumeiros. Por outro lado, a dor é um importante sinal do corpo de que o esforço está já passando dos limites, o que pode gerar uma eventual lesão se já houver uma pre-disposição ocorrendo."

Para saber ainda mais sobre usos e indicações destas substâncias, fale com um especialista. "Hoje, médicos e dentistas são os profissionais aptos a prescrever receitas, e demais profissionais capacitados podem acompanhar o tratamento de forma a otimizar outras terapias, como no caso da fisioterapia, nutrição, psicologia", diz Zamberlan.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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