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Dante Senra

Vivemos mais, ganhamos menos e gastamos mais com a saúde

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

11/01/2020 04h00

O envelhecimento da população está associado a um aumento dos custos de saúde em todo o mundo. Em qualquer época da vida os gastos com medicamentos fazem diferença no orçamento familiar, mas na população idosa atuam como componente prioritário das despesas domiciliares.

Exames, medicamentos, planos de saúde e tratamentos médicos consomem a renda familiar e não há como cortá-los. Há situações em que os custos com saúde chegam a ter uma participação de quase 60% do orçamento familiar. Segundo pesquisas, nesta população o segundo maior gasto é com alimentação (20% da renda) e depois com a habitação (15,2%).

Obviamente existem desigualdades socioeconômicas, de idade e de gênero no comprometimento de renda com a compra de medicamentos, com piores condições para os mais pobres, os de maior idade e para as mulheres. Mas considere que a prevalência do uso de medicamentos na população acima de 60 anos é de 80% e a prevalência da polifarmacia (definida arbitrariamente pelo uso de 4 ou mais medicamentos) na literatura varia de 31,5% a 76,5% (achei até que era maior) e veja o impacto que isto representa.

De acordo com a Pesquisa Nacional de Domicílios realizada em 2012, 64,2% pessoas acima dos 60 anos eram consideradas as referências em suas famílias tendo como principal fonte de renda a aposentadoria ou pensão (66,2%), sendo que para o grupo acima de 65 anos a participação dessa fonte de renda aumenta para 74,7%.

Para piorar, o SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) e a CNDL (Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas), conduziram um estudo junto a 1.500 moradores das capitais brasileiras com o objetivo de medir os impactos das despesas com saúde no bolso do brasileiro que revela que 69,7% não possuem plano de saúde, seja ele individual ou empresarial, percentual que é ainda maior entre pessoas das classes C, D e E (77,0%).

Quando essas pessoas precisam de atendimento, 44,8% utilizam o SUS (Sistema Único de Saúde) —principalmente os entrevistados das classes C, D e E (51,4%), e o restante (24,9%) prefere pagar as despesas com dinheiro próprio.

O estudo mostra ainda que quatro em cada dez entrevistados (39,5%) já tiveram plano de saúde, mas atualmente não possuem mais.

Isso ocorreu por vários motivos: 32,3% alegam ter saído da empresa em que trabalhavam, que era a responsável pelo pagamento do plano; 25,3% porque não tinham mais condições de pagar as mensalidades, e 12,6% por acharem que por utilizarem pouco não valia a pena mantê-lo.

Mesmo assim, um levantamento do Datafolha de 2018 aponta que somente a casa própria para os entrevistados é mais importante que ter um plano de saúde para viver bem. Metade cita a compra da moradia e 26% o plano de saúde como conquistas mais valorizadas. Para 17% dos entrevistados, essa conquista seria a chegada ao curso superior. Viajar (7%) e ter um carro (menos de 1%) aparecem em seguida.

O fato é que a renda é baixa e poucos têm plano de saúde, sobretudo na fase da vida em que mais é necessário.

Existem alternativas?

Os meios de adquirir os medicamentos variam de acordo com o poder socioeconômico das pessoas. Os idosos da classe socioeconômica A adquirem seus medicamentos, principalmente, em estabelecimentos privados (e preferem os medicamentos referência —erroneamente).

Já as classes C e E têm acesso direto a medicamentos gratuitos distribuídos pelo sistema público brasileiro de saúde, embora a proporção de pessoas que tenham que comprar medicamentos após tentativa fracassada de obtenção pelo SUS não seja pequena (estima-se 11%).

Considerada uma ótima alternativa, o Programa Farmácia Popular, criado pelo Governo Federal em 2004, tem como objetivo subsidiar medicamentos para algumas das principais doenças. Além de redes próprias, o programa possui parcerias com farmácias e drogarias privadas espalhadas por todo o país. É tido como um dos programas de saúde pública mais bem-sucedidos do país, pois oferece uma lista de mais de 1.000 medicamentos diferentes sendo muitos gratuitos ou com grande desconto.

Pesquisar em varias farmácias e pedir desconto na medicação é sempre preciso. Difícil entender, mas se você se cadastrar no laboratório (alguns permitem) procurando programas de fidelidade, avaliar desconto através dos planos de saúde e através do CPF os preços podem variar bastante. Tal atitude pode parecer pouco constrangedora, mas infelizmente é necessária e a diferença é enorme.

Óbvio que a concorrência no livre mercado deve existir e é saudável, mas fazer o idoso perder horas na farmácia para avaliar a melhor forma de pagar menos pelo medicamento é sim constrangedor e desnecessário. Deveriam custar o menor preço possível e pronto.

Outra grande alternativa é a utilização dos genéricos. No Brasil, a Lei dos Medicamentos Genéricos (nº 9.787) foi implementada em 10 de fevereiro de 1999. Assim como a farmácia popular, os genéricos estabeleceram um marco na saúde pública do Brasil. Precisamos ser justos e louvar tais iniciativas.

O preconceito quanto a esses medicamentos, tanto por parte da população como por parte da classe médica, é absolutamente injustificável. Isso porque contêm o mesmo princípio ativo, dose e forma farmacêutica do medicamento de referência, porém sem um nome comercial.

Além disso, deve ser ao menos 35% mais barato que o medicamento de marca, apresentando eficácia e segurança equivalentes à do medicamento de referência. Outro grande benefício da chegada dos genéricos é que conseguiram pela concorrência, reduzir os preços dos medicamentos de referência.

Ao contrário do que se possa imaginar, medicamentos genéricos não são coisa de países pobres. Eles já somam 72% das prescrições nos EUA, quadro que tende a crescer a cada ano. Na Alemanha 61%, e no Canadá 59% das prescrições médicas são de medicamentos genéricos. No Brasil, representam apenas 33,7% do mercado de medicamentos. Em nosso país, das dez maiores empresas farmacêuticas do país, oito comercializam genéricos.

Infelizmente os remédios comprados na farmácia, ainda que de uso contínuo, não podem ser abatidos do cálculo do Imposto de renda, mesmo nossos formuladores de políticas publicas sabendo que na luta para organizar as finanças quase metade da população abre mão de alguma coisa para equilibrar suas contas e conseguir pagar a mensalidade do plano de saúde e comprar sua vital medicação.

Outra medida que seria bem-vinda para baratear o custo dos medicamentos seria vender o número exato de comprimidos prescritos pelo médico como no caso de uma infecção por exemplo, evitando-se o desperdício.
Mais uma preocupação é não conseguir planejar o futuro.

A pesquisa de 2018, realizada pelo SPC e pela CNDL, indica que oito em cada dez brasileiros (78%) admitem que não estão se preparando financeiramente para a hora de se aposentar. Orçamento apertado é principal justificativa.

Do ponto de vista físico, é sim possível percorrer outro percurso neste caminho sem volta, até porque envelhecer saudável é economizar recursos financeiros com tratamentos e medicamentos.

Tanto do ponto de vista físico ou de recursos financeiros é preciso uma consistente construção ao longo da vida porque como dizia Millôr Fernandes "Qualquer idiota consegue ser jovem.(...) É preciso muito talento para envelhecer".