Topo

Edmo Atique Gabriel

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O corpo humano está gritando, mas ninguém escuta

ESTADÃO CONTEÚDO/Cris Faga
Imagem: ESTADÃO CONTEÚDO/Cris Faga

Colunista do UOL

20/08/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

A preocupação com o fatídico choque térmico —exposição ao frio e ao calor num intervalo curto de tempo— quase sempre acarreta problemas de saúde.

Quando lembramos dos sábios conselhos de mãe e avó, sobre não abrir a geladeira quando estiver transpirando, ficará bem mais fácil avaliar os possíveis malefícios de um choque térmico, como uma paralisia facial —boca torta e rosto deformado por um bom tempo.

O grande desafio tem sido lidar com frequentes variações da temperatura; o inverno com dias muito quentes, dias de praia e piscina, mas também dias de temperaturas que se aproximam do zero. Como o corpo humano pode suportar isso, sem que haja repercussões negativas na saúde como um todo?

Nos dias quentes do inverno, praticamos esportes ao ar livre, usamos roupas mais leves, ligamos o ar-condicionado para trabalhar e para dormir. Nos dias frios do inverno, usamos aquela blusa do último inverno totalmente frio, saímos de casa com mais cautela, ligamos o aquecedor e tomamos banho com água bem quente.

Falamos tanto que o "efeito sanfona", que se refere a emagrecer e engordar, não é saudável para o coração e para o corpo. E esse "efeito sanfona" térmico?

Precisamos lembrar que, em dias muito frios, nosso corpo produz mais calor interno, exige mais nutrientes para tal finalidade. Nossa pressão arterial pode subir no frio, inclusive com risco acentuado de um infarto do coração e um derrame cerebral. Aí, de repente, no dia seguinte, o calor é tão intenso, um clima tão abafado, que nossa pressão arterial cai, ficamos mais indispostos, precisamos de mais água e cansamos mais.

O corpo humano funciona melhor quando suas funções seguem um certo ritmo. Quando essa confusão térmica se estabelece, e se acrescentarmos ainda os agravantes da poluição atmosférica, não seria exagero inferir que estamos morrendo mais rápido. Uma das mais tristes realidades é saber que essa confusão térmica e a própria poluição podem ser atribuídas às atitudes hostis do ser humano contra a natureza.

As novas gerações não sabem o que irão enfrentar daqui para frente. Invernos extremamente rigorosos de outrora passam a incorporar dias tórridos de calor. Verões de sol abrasador que permitem aos mais "friorentos" dormirem com cobertas e mantas.

Vivemos uma grande contradição. Queremos viver mais, buscar a longevidade saudável. Aplaudimos aquelas pessoas que se aproximam ou ultrapassam as idades nonagenária e centenária. Ficamos curiosos e incomodados até descobrir o que essas pessoas privilegiadas fizeram, ao longo da vida, para vencer as barreiras do tempo com tanta lucidez. A ciência não para de pesquisar acerca do elixir da juventude.

No entanto, quase que simultaneamente, os próprios seres humanos lançam detritos nos mares, fumaças na atmosfera, sofás nas lagoas, produtos tóxicos no solo, destruímos nascentes, desmatamos e incendiamos florestas, derretemos geleiras.

Isso tudo não parece estranho? Aquele que pretende viver mais, aquele que é concebido como o mais intelectual e racional entre todos os seres vivos, também se autoaniquila.

Por fim, deixo aqui uma reflexão. Vamos nos colocar na posição do corpo humano, como se déssemos voz aos nossos órgãos e estruturas vitais. Nosso corpo já deve estar rouco, talvez afônico, de tanto gritar pedindo socorro. São gritos incessantes, sendo que quem poderia ouvir seria uma outra pessoa, um outro corpo humano. A tragédia é que tanto quem grita como quem escuta são autores solidários do mesmo crime contra a natureza.

Resta a humanidade se conformar, pois a natureza está sendo cada vez mais violada e esse crime hediondo tem um autor bem conhecido.