Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Shortinho, bermuda e moletom: por que esses adolescentes se vestem assim?
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"Um calorzão de 40 graus e aquele grupo de adolescentes não tira o moletom."
"Um baita frio e aquelas meninas saem de casa com shortinho curto."
"E aquele menino com a bermuda no meio da bunda? Por que não usa um cinto?"
Essas são algumas frases ditas por pessoas adultas sobre o modo como adolescentes se vestem, muitas vezes, destoando da temperatura do tempo. Sim, existem momentos em que o sol está escaldante e vemos adolescentes usando calça e agasalho de moletom, ou na época de frio, um grupo com shorts bem curto ou bermuda mostrando metade da roupa íntima.
Por que isso acontece? Será que, ao chegar na adolescência, as pessoas perdem a noção do clima? Será que essas roupas são uma forma de chamar a atenção?
Se você já leu outros textos meus aqui no VivaBem, já deve entrado em contato com reflexões que trago sobre como a adolescência é um período de intensas mudanças e o quanto é difícil para adolescentes, familiares e comunidade se adaptarem à velocidade dessas mudanças.
Imagine você, que em um dia está penteando os cabelos da criança e amarrando seus sapatos, e no outro essa mesma pessoa teve um estirão, ficou mais alta que você, quer pintar o cabelo de roxo e usar meias até a canela. Você fica sem entender e sente que tudo está acontecendo rápido demais e, pior, caminhando para um lado que não o agrada em nada.
Você sente que precisa de um tempo para digerir esse crescimento repentino e mudança de comportamento da criança que está se tornando adolescente. Você quer desacelerar o tempo, mas o tempo está passando e aquela criança fofa virou "uma pessoa sem noção" que usa moletom no calor e shortinho no frio. Você se irrita e até tenta incentivar o uso de roupas que julga mais confortáveis e bonitas, mas não tem jeito, a pessoa já transformou aquele jeans novinho em uma bermuda com uma perna maior que a outra, barra desfiada e trechos de "músicas deprê" escritas no tênis com caneta de tinta azul. Não é fácil!
Quando adolescentes crescem, é um processo difícil para seus familiares, mas precisamos nos atentar ao fato de que é complexo para adolescentes também, talvez até mais do que para nós, pessoas adultas, afinal, é no corpo delas que as mudanças estão acontecendo e por mais que tentem, não conseguem fugir de si ou dar um tempo se afastando do próprio corpo.
As transformações da puberdade e adolescência são difíceis porque acontecem num período muito curto de tempo. É muito hormônio atuando, muito pelo crescendo, pés calçando tamanho adulto, seios, pênis com novo formato, masturbação, menstruação, tudo isso pela primeira vez e, em alguns casos, adolescentes se tornam chacota no ambiente familiar e comunitário, tendo seus corpos como alvo de comentários constrangedores.
É comum ouvir homens e mulheres adultas referirem-se a sobrinhas, afilhadas e vizinhas com comentários do tipo: "Fulaninha cresceu, está com o corpão bonito!" ou "Fulana é tão pequenininha, nem parece que tem 14 anos", ou ainda "Tá comendo demais hein, fulano, vai ficar gordo igual ao seu pai".
Esse tipo de comentário impacta no olhar que adolescentes têm sobre si. E é possível que, diante de tal constrangimento, eles se cubram com moletons, mesmo fazendo 40 graus lá fora, e talvez a touca sirva como esconderijo simbólico dos assédios sobre seus corpos. Contudo também é possível pensar que esses mesmos comentários no ambiente familiar e comunitário façam com que adolescentes pensem que só receberão elogios a partir da sua estética e comecem a usar roupas que mostrem o corpo como forma de sentir reconhecida pelas outras pessoas.
Obviamente é possível que adolescentes usem moletons e shortinhos simplesmente porque essa é a roupa com a qual se sentem bem, mas cabe a nós, pessoas adultas, sempre refletirmos que a adolescência é um período complexo para todo mundo e, às vezes, nossos comentários só dificultam o processo de construção de autoestima de pessoas que estão se sentindo inseguras com suas próprias mudanças.
A ideia desse texto foi propor um breve mergulho nas questões das adolescências e pensar —ainda que de forma sucinta— sobre como a sociedade lida com as transformações da puberdade, seja ela no próprio corpo (quando se é adolescente) ou nos corpos alheios (quando se é pessoa adulta) e acolher adolescentes em sua difícil tarefa de se aproximar da própria existência com potência e autocuidado.
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