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Elânia Francisca

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Nós, pessoas adultas, amamos, toleramos ou odiamos adolescentes?

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

18/11/2022 04h00

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A adolescência é uma fase da vida em que a pessoa está construindo sua identidade, e sua forma de perceber o próprio corpo é constantemente repensada. Tudo está mudando rapidamente e as demandas que a sociedade deposita sobre adolescentes também se intensificam. O que é tolerado no comportamento infantil é inadmissível na adolescência.

Nós, pessoas adultas, por vezes somos inflexíveis com qualquer erro ou tropeço de adolescentes, sem considerar que essas pessoas ainda estão em fase peculiar de desenvolvimento e precisam de suporte e muito amor.

Estou falando de amor na perspectiva trazida pela autora negra norte-americana bell hooks [a grafia está correta, esse nome próprio é escrito com letras minúsculas por indicação da autora].

Foi com a professora bell hooks que pudemos entender que o amor é uma ação, que não há amor sem justiça e que o amor cura. Então quando eu digo que adolescentes precisam de amor, estou dizendo que precisam que sejamos pessoas justas e olhemos para essa fase da vida com as delicadezas que ela merece. Estou dizendo que precisamos agir em defesa de uma adolescência saudável e bem informada sobre seus corpos e direitos, e que é nosso dever promover amor como uma forma de promover saúde.

O caso é que nós, pessoas adultas, somos rígidas e duras ao tecer críticas sobre a adolescência e pouco nos dedicamos a compreendê-la para acolhê-la. Com crianças temos avançado um pouco (obviamente há muito que avançar), mas com adolescentes ainda alimentamos uma ideia punitivista.

Nas microrrelações em casa e na comunidade ainda validamos agressões com castigos físicos (surras, empurrões), pressão psicológica (xingamentos e humilhação pública), negligência (proibição de fazer as refeições alegando que adolescentes estão gordas ou gordos demais, privação de sono) ou até mesmo violência patrimonial (jogar objetos de adolescentes fora sem consultar antes e menosprezar a importância daquele item).

No momento da formulação de políticas públicas para adolescentes, somos a sociedade que de um lado considera as pessoas nessa fase como capazes de responder penalmente por suas ações, e do outro tratamos adolescentes como incapazes de pensar suas vidas sexuais, por exemplo, e os privamos do direito à informação sobre saúde sexual e reprodutiva no ambiente educacional.

E aqui estou falando especificamente dos discursos e práticas sobre as adolescências pretas e pobres. Afinal, os argumentos utilizados para a redução da maioridade penal e para a proibição do diálogo sobre sexualidade nas escolas é atravessado não só pelo adultocentrismo, mas sobretudo pelo racismo e machismo.

Nós, pessoas adultas, precisamos repensar o modo como lidamos com as adolescências sem narcisismo e com autocritica.

Se o conceito de amor trazido por bell hooks se refere à justiça social, ação de respeito e proteção e compreensão do amor enquanto forma de cura, nossas atitudes com adolescentes têm sido justas, curativas e protetivas?

Responder, sinceramente, a essas perguntas é o primeiro passo para avaliar se nós amamos, odiamos ou apenas toleramos adolescentes no Brasil.