Primeiro namoro de adolescentes: como construir combinados em casa?
Quando o assunto é namoro na adolescência, pessoas adultas podem ficar um pouco desconfortáveis e resistentes para acolher essa nova etapa da vida. Mas mesmo sendo desafiadora, essa fase precisa de seu acolhimento.
Muitas pessoas adultas me procuram perguntando como construir combinados com adolescentes sobre o que podem ou não fazer enquanto estão namorando.
Embora, muitas vezes, o desejo da pessoa adulta seja dizer "o combinado vai ser assim porque eu que mando aqui em casa", é importante saber que esse caminho é ineficaz e só afastará adolescentes do diálogo com você.
É interessante construir combinados coletivamente, junto à pessoa adolescente pela qual você é responsável. E isso vale para construções com adolescentes que moram com pais e/ou mãe, com outros familiares ou em Serviços de Acolhimento Institucional de Crianças e Adolescentes.
O que conversar na construção de combinados?
1. Valorize o namoro: namoro na adolescência é algo saudável, desde que seja com alguém de idade aproximada e que o respeito mútuo aconteça. Comece a conversa agradecendo por receber a informação do namoro. "Obrigada por me contar sobre seu namoro."
2. Entenda o relacionamento: você pode pedir que a pessoa adolescente te conte um pouco sobre como o namoro começou, como se conheceram. Obviamente, você não transformará isso num interrogatório, mas num dialogo fluído. "Bacana, me fala mais sobre essa pessoa. Como se conheceram?"
3. Não julgue: essa parte é bem difícil, mas precisaremos exercitar. Durante o diálogo, é possível que adolescentes nos contem algo com que não concordamos. "A gente se conheceu no Centro de Juventude", em seguida a mãe diz "É pra isso que eu te matriculei lá? Ali é lugar para estudar ou namorar?". Não julgue. Escute a história toda e observe o modo como ela é contada. Você vai perceber os sentimentos que aquela narrativa traz, acolha.
4. Queira conhecer e se interesse pela pessoa: abra-se para conhecer a pessoa. Proponha marcar um dia para isso, um café da tarde, um almoço ou um passeio. Sempre que possível, veja se a família ou responsáveis pela outra pessoa adolescente pode estar nesse encontro também. No momento de sugerir esse encontro, tente não usar frases batidas que não fazem muito sentido, como: "Traz a pessoa aí pra eu ver quais as intenções dela com você". Essa frase não faz sentido porque as intenções são de namoro, e é só isso.
Também não é legal usar frases que tenham a conotação de que você vai constranger adolescentes ou ameaçar —ainda que você acredite que isso seja brincadeira. Por exemplo: "Vou mostrar suas fotos de infância. Aquela que você tá chorando com medo de barata" ou algo como "Se chegar um menino com calça rasgada aqui, eu vou mandar colocar uma roupa decente". Você é a pessoa adulta da história e essa atitude não condiz com uma postura madura, não é mesmo?
5. Não espalhe a notícia na família: algumas pessoas adultas tendem a querer expor adolescentes em grupos (ainda que não façam isso por mal). Não coloque a notícia de namoro em grupos de WhatsApp, nem comente com outras pessoas. Deixe que adolescentes escolham o melhor momento para dizer isso. "Maria do céu, você acredita que Larissa acabou de me dizer que está namorando?". Vamos recordar: você é a pessoa adulta e essa postura de espalhar notícias que não são suas não é madura.
6. Proponha a criação de combinados: agora sim, você pode propor a criação de combinados de namoro, explicando que namorar é algo saudável desde que seja vivenciado de forma cuidadosa e respeitando os limites individuais e coletivos de adolescentes.
Você pode dizer ao adolescente que há horários e dias adequados para o casal se ver, que é importante ver a pessoa amada, mas também é importante estudar, sair com amizades anteriores ao namoro e praticar o autocuidado. Pergunte: "Quais dias e horários você acha que são possíveis de ver a pessoa com quem está namorando?". Você pode perceber que adolescentes têm bom senso e, caso não tenham, você pode sugerir: "Acredito que após às 22h seja melhor a pessoa estar de volta à casa dela. Durante a semana, vocês podem se ver menos, não acha?".
7. Esteja por perto, mas não invada o espaço: namorar, em muitos casos, pressupõe contato físico como beijos e abraços, e ninguém quer fazer isso na frente de adultos. Então proponha que o namoro ocorra em ambientes coletivos (na sala, por exemplo), mas permita que algumas saídas para passeios ocorram.
Também fique fora da sala por alguns momentos. Deixe o namoro acontecer e confie que os combinados serão cumpridos.
8. Fale sobre sexualidade e ato sexual: é difícil, muito difícil, mas você precisará conversar sobre "proteção do prazer" —eu gosto mais desse termo do que "prevenção à IST e gravidez". Proteger o prazer é aprender formas de viver o prazer sexual de modo seguro e responsável. Adolescentes, quer você queira, quer não, farão sexo, se desejarem, então que tenham informação para fazer isso de forma protegida. Fale de camisinha, de métodos contraceptivos (independentemente do gênero e orientação sexual de adolescentes). Informe-se sobre os recursos disponíveis no SUS (Sistema Único de Saúde) e divulgue para adolescentes em casa.
9. Fale sobre namoro saudável: converse periodicamente com adolescentes sobre como anda o namoro e observe também. Mantenha por perto, mas não invada (como dito no item 7), mostre que se algo acontecer no namoro e não for legal, você pode ajudar a lidar com a situação.
10. Cuide-se: quando adolescentes decidem namorar pela primeira vez, é comum que algumas pessoas adultas sintam medo do que pode vir, seja um relacionamento abusivo, IST ou gestação indesejada. Por isso, cuide-se, tenha espaços onde você pode trocar com outras pessoas adultas que estão no mesmo momento, escreva um diário ou busque psicoterapia. A psicoterapia não serve somente para falar de dores e traumas, mas também para organizar as ideias e refletir sobre um momento desafiador da vida.
Desejo que você e os adolescentes com quem você convive e é responsável tenham um percurso bonito nessa nova fase onde o namoro pode aparecer.
Com respeito e construção coletiva, vai dar tudo certo!
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