Elânia Francisca

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Opinião

Conviver com adolescentes exige que você seja 'ex-tudo'

Não, eu não escrevi o título errado.

Conviver com adolescentes exige "ex-tudo". Com isso quero dizer que para conviver com adolescentes é importante que tenhamos a potência e humildade para nos deslocarmos do lugar de quem sabe de tudo, abandonando esse posto de falsa sabedoria e permitirmo-nos ocupar o lugar de quem desconhece, não sabe, não entende, mas que deseja conhecer, entender e saber algo.

Conviver com adolescentes, de forma genuína, é se propor a mergulhar em estudos teóricos, conhecer experiências difíceis e exitosas de outras parentalidades ou profissões, mas é também desnudar-se do lugar de "eu sou adulto, eu que sei o que é melhor!".

Às vezes, temos mesmo mais acúmulo de experiências que fazem com que consigamos desenvolver melhor um raciocínio que nos ajuda a sair de uma situação difícil, mas isso não quer dizer que sabemos mais ou menos que adolescentes. Nossas experiências de vida não são receitas que podem ser reproduzidas, gerando o mesmo resultado.

Nossas vivências querem dizer apenas que estamos em momentos diferentes de vida que podem se somar, sem anular ou impor a adolescentes o que nós sabemos

Realizar o movimento de ex-tudo é abandonar o lugar de "sei de tudo" e abraçar —ainda que com medo— o lugar de "talvez, dessa vez, quem saibe me falar sobre esse tema seja a própria adolescente".

Podemos estudar sobre sofrimento emocional e nos instrumentalizar para acolher demandas de saúde mental na adolescência, mas, diante de adolescentes em sofrimento, é preciso ser ex-tudo, é preciso escutar. Porque a dor daquele menino é tão dele que só conseguiremos acolhê-lo se escutarmos o que ele tem a dizer sobre o cenário em que sua dor se apresenta.

Dia desses, uma estudante de graduação me contou que, durante uma atividade em seu trabalho, "perdeu a cabeça" com um adolescente que atrapalhava a aula. Então, a estudante (que trabalha como educadora) ordenou que ele "calasse a boca", pois ela queria aplicar uma oficina e o menino estava desconcentrando o grupo.

Refletimos juntas sobre hipóteses do que o menino poderia estar querendo comunicar ao "atrapalhar" aquele encontro. Será que o tema era desconfortável para ele? Será que ele estava testando a paciência da educadora? Se sim, porque ele quis testá-la?

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Esse movimento de ficar curiosa com o comportamento do menino, ao invés de apenas taxá-lo como mal-educado, é o processo que estou chamando de ex-tudo.

Praticar o "não sei, mas quero aprender com você" é um caminho de amor e acolhimento com adolescentes. Vamos tentar mergulhar no ex-tudo?

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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