Elânia Francisca

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Opinião

Aproximações com a sexualidade e o (re)encontro com a psicanálise

Quando eu estava no início da adolescência, por volta dos 11 ou 12 anos, lembro-me de ter assistido a um programa de televisão chamado "Programa Livre", apresentado por Serginho Groisman. As sexólogas Marta Suplicy e Rosely Sayão eram constantemente convidadas para um quadro chamado "Fala, garota! Fala, garoto!", no qual jovens e adolescentes poderiam fazer perguntas sobre sexo e receber respostas e aconselhamento sobre prevenção, afetividade e outros assuntos relacionados ao tema.

Decidi naquele momento que eu gostaria de ser sexóloga e trabalhar auxiliando adolescentes em suas descobertas sobre sexualidade. Em minha mente infantojuvenil, acreditava que ser sexóloga seria passar o dia respondendo perguntas sobre sexo.

A todas pessoas que me perguntavam sobre o futuro: "O que você quer ser quando crescer?", eu prontamente respondia: "Sexóloga, como a Marta". E gostava de ter aquele foco determinado para o futuro, mas também gostava de ver a expressão de espanto das pessoas adultas com o tema escolhido para trabalhar.

Eu sempre gostei bastante de frequentar bibliotecas e aos 16 anos trabalhei na biblioteca comunitária de meu bairro. Foi lá que aprendi a fazer pesquisas na enciclopédia Barsa —para as pessoas mais jovens, Barsa era uma espécie de Google, só que de papel.

Certa vez, enquanto procurava algum tema de trabalho escolar na Barsa, deparei-me com o nome de Freud. Recordo de poucas coisas que estavam escritas, mas, para mim, destacavam-se as palavras psicanálise, fase anal, retenção de fezes e prazer.

Eu achei curiosa a junção da palavra fezes e prazer, mas ao mesmo tempo, pensava que, embora eu tivesse 16 anos e o texto se tratasse de crianças pequenas, eu mesma gostava de reter as fezes porque sentia algo gostoso ao adiar o momento de defecar. Meu próprio corpo me ajudava a dar sentido àquilo que eu lia na enciclopédia, com meu pouco conhecimento de menina frequentadora de uma biblioteca comunitária.

Esse encontro tímido com Freud na biblioteca ficou guardadinho num lugar da memória que nem eu mesma recordava. Até que entrei na graduação em psicologia no ano de 2008.

Fato curioso é que eu adorava ler sobre psicologia comportamental e cheguei até a ser aluna monitora no laboratório, porém no último ano de graduação, ao iniciar o estágio clínico, comecei a atender um menino de 7 anos e fui supervisionada por uma professora psicanalista que, com suas reflexões e sugestões de leitura, contribuiu para que eu me apaixonasse pela psicanálise e recordasse aquele encontro com Freud na adolescência.

Desde aquele período, tenho me dedicado à cultivar o respeito e a aproximação com o percurso psicanalítico, e assim me autorizar a ser uma psicanalista.

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De 2012 —ano de minha conclusão do curso de graduação— até o momento, meus estudos em psicanálise se baseiam em análise pessoal, estudos com algumas colegas de profissão e amigas e atendimentos clínicos a adolescentes.

Atuo como psicóloga especializada em sexualidade e recentemente conclui a especialização em sexualidade humana, que me dá o título de sexóloga.

Durante a formação em psicanálise, deparei-me com os textos de um cara chamado Jacques Lacan, que diz que o inconsciente está entre a carne e a pele, isso quer dizer que o nosso inconsciente está no corpo todo. Desde que entendi isso, fico pensativa, pois sempre acreditei que nosso inconsciente era um conteúdo da mente, e a mente teria como um lugar exclusivo na cabeça.

"O aparelho mental não necessariamente é o cérebro", disse-me uma professora, e essa aula que me marcou tanto!

Me marcou porque entendo que nosso corpo todo pensa, nosso corpo todo reflete sobre nossas vivências e não é só na cabeça que ficam as inteligências, os desejos.

Estudo para ser uma boa psicóloga e educadora, para ser ética e comprometida com as adolescências e parentalidades que acompanho. E é a psicanalise que está comigo nesse caminhar.

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Compreendendo que o inconsciente é o corpo todo e que ele não tem tempo (presente, passado, futuro). Ele me ajuda a desanuviar as ideias e perceber que aquela menina que queria ser sexóloga mal podia imaginar o universo que é a psicanalise e, consequentemente, a potência de escutar outras vivências.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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