Covid-19: o comportamento é que define a pandemia
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Nas últimas semanas, o Brasil tem assistido a um aumento preocupante do número de casos e de mortes pelo novo coronavírus. Independentemente de se tratar de "repique" ou de "segunda onda" (há divergência entre especialistas), o fato é que, se nada for feito, arma-se uma bomba-relógio que pode explodir nas grandes festas de final de ano, e impactar profundamente o começo de 2021 no país.
Enquanto nesta semana o Reino Unido e a Rússia começaram a vacinar as parcelas mais vulneráveis das suas populações, o Brasil não deve dar o pontapé inicial nesse processo antes da virada do ano.
Nossa realidade
Do ponto de vista prático, o que podemos fazer é tentar evitar ao máximo novas infecções antes da chegada da vacina, com as medidas clássicas de proteção que todos estamos carecas de saber. Mesmo que a vacina chegue por aqui já em janeiro, vacinar uma população de mais de 200 milhões de habitantes não é um processo que acontece da noite para o dia. Com um bom planejamento logístico (que não está nem perto de ser anunciado por aqui), devemos enfrentar alguns meses até que 60-70% da população esteja protegida.
Até lá, o ritmo de evolução da pandemia vai ser regido basicamente pelo comportamento das pessoas e pelas medidas de contenção determinadas pelas autoridades responsáveis. Na última semana, alguns estados já decretaram, por exemplo, toque de recolher, limitação no horário de abertura de lojas e centros de compras e restrições para as festas de Réveillon. Na direção oposta, com o calor chegando ao Brasil, bares e praias têm ficado apinhados de gente sem máscara, e ruas de comércio em várias cidades estão abarrotadas para as compras de final de ano.
O que é preciso?
Mas, afinal de contas, o que poderia definir um comportamento mais ou menos comprometido com cuidado e proteção?
1. Orientação clara
Diferente da forma objetiva que a importância do confinamento foi trabalhada inicialmente junto à população, as estratégias para o "desconfinamento" e a possibilidade de novas medidas restritivas não tiveram o mesmo sucesso. As eleições municipais e a falta de uma coordenação central no Brasil atrasaram a tomada de decisões importantes. Com o cenário pouco claro para boa parte da população, valeu a regra do cada um faz o que quer.
2. Resiliência ao isolamento
Nos países europeus que enfrentaram nas últimas semanas um segundo lockdown, parte da população afirmou que o segundo processo foi mais difícil do que o primeiro, basicamente porque as pessoas já estão esgotadas. No Reino Unido, por exemplo, um quarto da população teve mais dificuldade em enfrentar o segundo confinamento, mas, ainda assim, 82% seguiram as regras estabelecidas, de acordo com pesquisa recente do King's College, de Londres.
3. Liderança empática
A resiliência da população em lidar com as restrições e a qualidade de resposta à pandemia encontram relação direta com o perfil de liderança de cada país. Líderes com quem a população se identifica e que inspiram confiança, cooperação e senso compartilhado de identidade, como é o caso da primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, tendem a obter melhores resultados.
Onde essa identidade nacional não está presente, o risco de parte da população não seguir regras e não colaborar coletivamente é maior. Essa é uma das principais conclusões do seminário "Comportamento baseado em valores sob o covid-19", realizado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) no início de novembro.
Adesão comprometida
Fake news, polarização política, individualismo exacerbado e a dificuldade de enxergar um projeto comum para o país (e não um jogo de: "nós" x "eles") são fatores que atrapalham a adesão às iniciativas de saúde pública que visam conter o crescimento da pandemia por aqui. Tudo isso dá caldo a descalabros sanitários com uma consequente maior circulação do vírus, que pode colocar em risco a vida de muita gente, mesmo daqueles que permanecem firmes e fortes seguindo as recomendações.
É importante que se pense nesses fatores que impactam o comportamento da população, não só nesse momento das restrições de contato social, mas também na chegada da vacina. Corre-se o risco de se cair novamente na mesma armadilha do "cada um decidir se quer ou não se vacinar", o que pode comprometer o alcance da cobertura, deixar muito mais gente suscetível ao coronavírus, prolongar a pandemia e elevar ainda mais o já inaceitável número de vítimas da covid-19 no país.
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