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Será que o Brasil vive crise de ansiedade coletiva antes do segundo turno?
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Nas últimas semanas, tornou-se comum encontrar pessoas que dizem estar esgotadas, tensas, ansiosas e "à beira de um ataque de nervos" à espera do próximo dia 30 de outubro. Alguns dizem experimentar, inclusive, momentos de taquicardia, falta de ar, medo, entre outros sintomas que poderiam caracterizar uma crise aguda de ansiedade. Será que essa reta final da eleição presidencial, tão radicalmente polarizada, poderia estar gerando uma espécie de ansiedade coletiva no Brasil?
Para começar seria interessante definir o que é ansiedade coletiva e pensar em como esse momento atual da saúde mental dos brasileiros se relaciona com os fenômenos da psicologia social ou da psicologia das massas.
Como diferenciar o que tem acontecido nos quatro cantos do país do que se passa em eventos agudos e episódicos em algumas escolas por aqui e mundo afora? Será que o que muitos brasileiros têm vivido e compartilhado é uma reação individual a um momento difícil ou uma espécie de catarse coletiva?
Episódios em escolas
Em agosto de 2019, uma garota de 17 anos em uma escola de Kelatan, nordeste da Malásia, teve a impressão que um vulto tocava seu corpo e começou a gritar. Em uma reação rápida e assustadora, o pânico invadiu outras salas de aula e fez com que 39 alunos vivenciassem momentos de medo e ansiedade extremos. Alunos se trancaram, gritos se espalharam pelos corredores, professores correram desesperados, sem entender o que se passava.
Em abril de 2022, em Recife, um episódio similar aconteceu em uma escola estadual e afetou 26 alunos. Crises de choro, tremores, palpitações e falta de ar foram os sintomas mais comuns.
Dois meses depois, em um único dia, outras duas escolas de Recife voltaram a apresentar situações semelhantes. Um tiroteio nas proximidades de uma delas levou cerca de 20 jovens a apresentarem crises de ansiedade. Na outra, 23 alunos tiveram um episódio de pânico depois que um garoto desmaiou dentro da escola e gerou uma reação de desespero na irmã, que "contagiou" os colegas, levando a uma reação em cadeia.
O retorno às aulas no pós-pandemia, o isolamento, a perda de habilidades sociais e o medo constante de contaminação expuseram os jovens a níveis extremos de ansiedade, o que pode ter contribuído para as crises coletivas mais frequentes no início desse ano.
Fenômeno raro
Mas esse tipo de situação é considerado bastante raro. Em escolas, onde jovens mais sugestionáveis e menos experientes em lidar com situações de estresse convivem o tempo todo, o risco parece ser um pouco maior. Em algumas condições extremas como grandes catástrofes, desastres naturais, guerras e momentos de grandes mudanças sociais, os episódios também podem ser mais comuns.
Alguns manuais de psiquiatria classificam esse tipo de fenômeno como "histeria coletiva" ou "doença psicogênica em massa". Ela se caracteriza como um rápido contágio de sintomas de hiperventilação, taquicardia, medo irracional e desmaios em um grupo relativamente grande de pessoas, em um curto intervalo de tempo, sem haver uma causa orgânica clara e definida. Trata-se de uma reação grupal a uma ameaça real ou imaginária, geradora de um pico de ansiedade e estresse, que se alastra por causas psicológicas e sociais.
A Associação Americana de Psicologia (APA) prefere empregar o termo ansiedade coletiva, que seria uma situação induzida por uma crença comum em relação a uma ameaça iminente. O temor dessa ameaça se espalharia rapidamente, intensificando o medo e distorcendo a percepção dos indivíduos quanto ao risco real da situação. Esse espalhamento do medo levaria a um aumento de estresse dos indivíduos, que acaba gerando os sintomas físicos observados.
E o Brasil?
Em teoria, a experiência comum vivenciada por milhões de brasileiros às vésperas da escolha da próxima liderança presidencial, em um momento histórico particularmente sensível, poderia favorecer uma crise de ansiedade coletiva. Mas faltam aqui a questão aguda, o contágio e alastramento do episódio e o aumento simultâneo dos sintomas, como na situações vividas pelos grupos de alunos dentro das escolas.
O mais provável e que essa onda de cansaço, ansiedade e tensão observada por muitos tenha mais a ver com a piora progressiva da saúde mental que os brasileiros vêm enfrentando nos últimos meses, em função de dois anos da pandemia, da situação política, econômica e social bastante delicada do país, da incerteza acerca do futuro e da escalada de um processo eleitoral violento e desgastante para a população.
Agora, é esperar o final dessa jornada para que cada um de nós possa fazer os ajustes (individuais e coletivos) necessários para viver os próximos quatro anos. E, fica a lição de que um processo de sucessão mais "limpo", em que ideias e pontos de vista distintos e até opostos possam ser discutidos, debatidos e respeitados —não destruídos e atacados— pode contribuir para a melhora da qualidade de vida e saúde mental dos brasileiros.
Tomara que nós e os próximos candidatos possamos aprender um pouco com esse caminho tão difícil que foi 2022.
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