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Jairo Bouer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Será que o jovem brasileiro está mais conservador?

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Imagem: iStock

Colunista de VivaBem

07/11/2022 04h00

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Saúde e família são hoje as duas maiores preocupações dos brasileiros de 15 a 29 anos. Em seguida aparecem estudo, trabalho, lazer, dinheiro, amigos e religião. E, nas últimas posições, sexo, beleza e casamento. Esse é o resultado de uma pesquisa divulgada no final de outubro pelo Datafolha, com mil jovens em 12 capitais do país.

Os pesquisadores ofereceram uma lista com esses 11 itens e pediram que as pessoas classificassem o grau de importância de cada um deles. É curioso notar que saúde e família não aparecem classicamente nas pesquisas com jovens como suas principais preocupações. Já estudo, trabalho, dinheiro, beleza e sexo são pontos que tendem a chamar mais atenção deles.

Seria essa, então, uma nova tendência de comportamento dos jovens das gerações Z (nascidos entre 1990 e 2010) e Alfa (nascidos a partir de 2010), ou apenas mais um reflexo dos últimos anos da pandemia, com importante impacto nas emoções dos mais novos, o que aumentaria as preocupações com saúde em geral e com o suporte da família?

É importante tentar entender para onde caminha essa faixa etária, já que ela representa hoje quase um quarto da população brasileira (mais de 50 milhões de pessoas), e estará em breve "dando as cartas" em diversos setores da nossa sociedade.

Furar bolhas

Mais alguns números da pesquisa: as bandeiras mais defendidas pelos jovens são educação e saúde públicas, com mais de 98% de aprovação. Mas temas da dita "pauta de costumes", como adoção de crianças por casais homossexuais (com apoio de 83%) e casamento entre pessoas de mesmo sexo (com apoio de 73%) têm boa aceitação também, o que pode apontar que eles não são tão conservadores nessa área do comportamento.

Já a questão das cotas raciais é apoiada por apenas 69% deles, o que mostra que esse tema, apesar do avanço nos últimos anos, ainda ocupa uma posição intermediária. Outros assuntos sensíveis como descriminalização da maconha e do aborto, posse de armas e pena de morte dividem ainda mais a opinião dos jovens. Nessas pautas, a orientação política surge como um forte fator de influência nos resultados, com números bastante distintos quando se olha para esquerda e direita.

Esse é outro ponto interessante: entender que a polarização que aconteceu no Brasil, sobretudo nos últimos quatro anos, está influenciando desde cedo a posição do jovem em relação a temas como racismo, drogas, aborto e armas, o que mostra que discutir esses temas hoje dentro da escola, principal espaço de convivência e interação social deles, é essencial.

Para furar as "bolhas" que podem se formar tanto dentro de casa (já que família ocupa uma posição central na escala de preocupação deles e deve ser uma forte influenciadora do comportamento e atitude dos jovens), como podem se proliferar nas redes sociais, a sala de aula aparece como um forte contraponto e um importante espaço de reflexão.

Os radicalismos e condutas antidemocráticas que tomaram conta de alguns grupos nas ruas do país depois das eleições estão chegando também às escolas. Cabe, então, medidas pedagógicas proporcionais para evitar que alunos se tornem alvos de agressões e violências.

Os riscos do radicalismo

Se eles "copiam" a atitudes dos pais e das redes, ou se eles se organizam em torno de ideias próprias, potencializadas pelo seu grupo social, não faz diferença. De toda forma, a escola deve se posicionar, ensinando respeito, convivência e tolerância. Aqui não deve ser esquerda x direita, mas sim direita com esquerda. Tudo bem pensar diferente, desde que essas diferenças sejam respeitada, não agredidas ou desqualificadas.

Na última semana, o que aconteceu em uma tradicional escola privada de Valinhos, cidade próxima a São Paulo, atesta que polarizações e radicalismos estão muitos vivos entre alguns grupos de alunos, trazendo questões complicadas de racismo, homofobia, sexismo e xenofobia para dentro do ambiente escolar e para as redes sociais dos seus alunos. Esse não é um caso isolado, mas é sintomático de um momento que exige uma intervenção mais séria.

O assunto veio a público pelo posicionamento corajoso de um aluno de 15 anos, que foi vítima dos preconceitos e violências dos colegas. Em artigo recente citei o caso de uma aluna de uma outra escola da mesma região, que ao perceber o intenso sofrimento emocional dos colegas, organizou uma pesquisa sobre saúde mental e apresentou os resultados à direção, que nada fez a respeito.

Importante ver que os alunos estão se mexendo e cobrando posicionamentos. Um educador costuma dizer que em boa parte do Brasil já temos um aluno do século 21, professores ainda no século 20, e escolas que lutam para sair do século 19. Será?

Não adianta ignorar esses assuntos ou apenas dizer que a escola repudia qualquer ação ou comentários racistas e não admite preconceito e discriminação. Racismo, homofobia, incitações nazistas são crimes. Palestras, orientação educacional e projetos sobre diversidade são apenas a ponta do iceberg.

O grande desafio é usar o espaço escolar para realmente promover uma cultura de prevenção e respeito, independente dos alunos serem mais ou menos conservadores.