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Jairo Bouer

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Reduzir a gravidez na adolescência deve ser foco do próximo governo

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Imagem: iStock

Colunista de VivaBem

21/11/2022 04h00

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Quase 1 em cada 5 meninas que engravida na adolescência volta a repetir uma segunda gestação antes da idade adulta, segundo um novo estudo que avaliou 4.500 adolescentes grávidas entre 12 e 19 anos.

A pesquisa foi feita pela Ufes (Universidade Federal do Espirito Santo) com base no inquérito "Nascer no Brasil", da Fiocruz, que investiga a saúde da mulher, da criança e do adolescente em 465 hospitais no país.

A gestação na adolescência segue como uma questão importante de saúde pública e deveria merecer uma atenção muito especial do próximo governo. Não faltam exemplos, mundo afora, de ações sistêmicas de educação, saúde e aumento de renda que conseguiram reverter esse cenário. A estratégia do Reino Unido, um caso recente de sucesso, reduziu as taxas pela metade em cerca de 10 anos, de 2000 para 2010.

Um em cada sete bebês tem mãe adolescente

Segundo o estudo da Ufes, a taxa de reincidência de gestação nas garotas é de 18,6%, e ela é pior entre as garotas com baixa renda e escolaridade. Só para se ter uma ideia da dimensão desses números, dados do Sinasc (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos) do SUS, apontam que um em cada 7 bebês brasileiros que nasceram em 2020 tinha mãe adolescente.

Em 2020, foram 380 mil partos em mães adolescentes, sendo que 18 mil deles aconteceram no grupo de meninas entre 10 e 14 anos. Outra conta rápida: mais de mil garotas se tornam mães todos os dias no Brasil, 44 a cada hora. Dessas mil, usando o coeficiente da Ufes, quase 200 vão engravidar novamente ainda na adolescência. É preocupante!

Apesar de a gravidez na adolescência poder acontecer em qualquer garota que tem vida sexual ativa, ela é claramente mais frequente nos grupos mais vulneráveis do ponto de vista social. Nesse sentido, o índice elevado de gestações nessa fase da vida funciona como um importante indicador social do país.

Outros países da América Latina, como Argentina, Uruguai, Peru e Chile, têm hoje taxas de gestação na adolescência de 30% a 50% menores do que as do Brasil.

Estratégias combinadas

Investimento em educação sexual continuada (projeto que evaporou na maior parte das redes públicas e nas escolas privadas nos últimos anos), políticas de incentivo para permanência dos jovens na escola, maior facilidade no acesso e na distribuição de métodos contraceptivos, combate à violência sexual e viabilização da construção de projetos de vida para as meninas são algumas das estratégias que podem reduzir esse impacto.

Uma questão é clara: quando as garotas conseguem encontrar melhores condições sociais (escola, renda, suporte familiar) e enxergar melhores perspectivas no futuro (estudar mais, ter um trabalho, construir relações), elas tendem a adiar o projeto de maternidade.

Assim, por tabela, para reduzir a reincidência da gravidez na adolescência, melhorar as informações e o acesso aos insumos de saúde reprodutiva (camisinha, pílula, consultas ginecológicas regulares, etc.), manter a garota na sala de aula (sabe-se que a gestação precoce é uma das principais causas de evasão escolar) e possibilitar condições de renda que permitam que ela construa seu projeto de vida são pontos centrais.

Reduzir essas taxas é um grande desafio para o próximo governo, que vai enfrentar quatro anos difíceis do ponto de vista econômico. É uma tarefa que possivelmente vai exigir o compromisso de pelo menos uma década de investimento contínuo das futuras administrações do país, independente da sua orientação política. Mas é uma certeza que o investimento e a melhoria nas condições sociais das camadas mais vulneráveis da população podem ter um impacto certeiro nessa questão. Politicas públicas em educação, saúde, suporte social e renda tem que estar combinadas para que o Brasil possa encarar de vez essa virada.