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Estudo levanta a questão: devemos voltar a usar máscara na academia?
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Embora ninguém esteja vendo a mesma tragédia dos primeiros anos da pandemia de covid-19 graças às benditas vacinas, a recente alta de casos provocados pelas subvariantes de ômicron faz com que a orientação volte a ser usar máscaras em lugares fechados. Não é a coisa mais agradável do mundo, eu sei e você sabe. Mas é o que temos para a virada do ano.
No transporte público e até mesmo voando de avião, por exemplo, gostando ou não gostando ninguém se esquece disso. E nas academias de ginástica? Ora, são locais fechados também. Mas, nelas, a maioria malha como se o suor na camisa fosse repelente de Sars-CoV-2. E, no entanto, o coronavírus não se intimida com tamanho de bíceps.
Um estudo australiano que acaba de sair na revista científica Heart, Lung and Circulation lembra que, fazendo exercício, a gente libera pelo nariz e pela boca gotículas de montão, com 0,2 a 1 milésimo de milímetro de diâmetro. Solta mais, mas muito mais esses aerossóis do que o sujeito fazendo calmamente compras na loja ou no supermercado.
Portanto, em tese, a situação das academias mereceria maior cuidado. É flutuando dentro dessas bolhas microscópicas que o coronavírus pode entrar em quem está na bike ou na esteira ao lado.
Os pesquisadores da Universidade de Melbourne, cientes de que a covid-19 é transmitida pelas partículas vaporosas que liberamos com a expiração, resolveram analisar o quanto o exercício seria capaz de aumentar a produção desses aerossóis que, no azar de a pessoa estar infectada, carregariam o vírus.
Isso porque, no passado recente, foi checada essa história em situações como a de uma criatura falando na cara de outra, tossindo e espirrando. Mas treinando pra valer, dizem, é a primeira vez que se faz uma investigação do gênero.
Os australianos instalaram uma verdadeira parafernália nos quatro cantos do laboratório onde colocaram bicicletas ergométricas para medir tudo o que estivesse no ar. A ideia era observar o aumento dos aerossóis na medida em que a respiração dos participantes se tornasse acelerada, medir a sua quantidade e o seu tamanho.
Também resolveram ver até que ponto essas partículas se dispersariam durante um treino e se a distância entre as pessoas ou se o uso de máscaras faria alguma diferença. E as duas coisas fazem diferença, sim, especialmente quando combinadas.
Os cientistas repararam que, quando simplesmente mantinham os indivíduos um pouco mais longe um do outro, a concentração de gotículas não caía muito a uma boa distância, como todos esperavam. É que elas, durante do exercício vigoroso, eram lançadas para fora com um bocado de força.
Como foi o estudo
Foram apenas três voluntários e nem critique o número pequeno porque o objetivo ali não era comparar as reações do organismo de uma grande quantidade de pessoas, mas ficar de olho no ar. Só pense que uma academia tem muito mais gente.
Todos os três, no caso, eram saudáveis e bem acostumados a malhar — um detalhe interessante porque, se fossem fora de forma, provavelmente despejariam muito mais aerossóis quando ficassem esbaforidos.
"Por outro lado, o estudo mirou um treino que, apesar de curto, tinha uma intensidade bastante alta. Quando é assim, as pessoas respiram de maneira igualmente intensa, muitas vezes de boca aberta, impulsionando as partículas com velocidade a até 3 metros de distância, como mostrou esse trabalho", nota o médico Antônio Bandeira, membro da diretoria da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), infectologista do Hospital Aeroporto e professor Uni-FCT em Salvador, na Bahia.
Ele tem razão: os três rapazes pedalaram por cinco minutos em 80% da capacidade respiratória máxima, algo que não é para qualquer um. Na vida real, a maioria das pessoas se exercitaria de maneira mais moderada e daí, a rigor, não geraria tanto aerossóis. Mas, além da quantidade, há a questão da dispersão. "Para você ter ideia, quando alguém fala, essas partículas não vão muito além de 1 metro", informa o doutor Bandeira.
Os pesquisadores analisaram a nuvem invisível de aerossóis a 35 centímetros, a 1,5 metro e 3 metros dos participantes, tanto bem de frente de cada um deles quanto nas laterais. "Normalmente, essas gotas microscópicas tendem a se precipitar mais na frente da pessoa, para onde o fluxo de ar é direcionado quando ela expira", explica o infectologista.
Mas, nesse caso, os voluntários treinaram, primeiro, sem nada lhes tapando a boca e o nariz. Depois, vestiram a máscara cirúrgica. O acessório, de fato, segurou boa parte das gotículas que seriam lançadas à sua frente, mas as deixou escapar um pouco pelos lados.
"A gente sabe muito bem que a máscara cirúrgica não veda lateralmente", diz o médico. "E, se o indivíduo está botando o ar para fora de forma intensa, ofegante em cima de uma esteira, de uma bike ou de um elíptico, parte dessa expiração irá bater na máscara e sair pelos lados."
Daí a recomendação do trabalho de combinar o seu uso com uma certa distância entre as pessoas treinando. Isso, repararam, diminuiu mais a concentração de aerossóis no ambiente do que uma medida ou outra isoladamente.
No caso da covid-19
O estudo, como lembra o doutor Antônio Bandeira, não afirma que, se alguém estiver infectado e usando máscara cirúrgica, irá transmitir a covid-19 só por causa das gotículas que escapolem pelos lados. Não dá para dizer se elas seriam suficientes para a transmissão.
"Só saberíamos disso com um experimento envolvendo alguém com diagnóstico positivo e é claro que ninguém colocaria um indivíduo sabidamente infectado para correr, ainda mais com outras pessoas por perto", explica o médico.
Na sua opinião, o estudo australiano é uma espécie de aviso, especialmente na onda atual, quando muitos frequentadores desses espaços podem estar contaminados e sem a mínima desconfiança disso.
"Para impedir a transmissão, todos ali deveriam vestir a máscara cirúrgica" opina o médico, que costuma treinar em uma academia em Lauro de Freitas, município baiano que estendeu a obrigatoriedade das máscaras nesses estabelecimentos. "As pessoas até reclamam, mas usam. E eu acho uma medida muito positiva."
O acessório para treinar
A máscara N95 não deixaria aerossóis escaparem pelos lados, é verdade. "Mas ela seria complicada nessa situação, porque realmente dá uma sensação de sufocamento", reconhece o doutor.
"Já a cirúrgica, não. Esse estudo, aliás, deixou muito claro que ela não reduz em nada a capacidade aeróbica das pessoas", comenta. "E consegue conter as gotículas que seriam lançadas à frente, mais concentradas e que, por isso, teriam maior potencial para infectar, se por acaso a pessoa estivesse com o vírus." Ou seja, resolvem.
Apesar da vacina
Professora da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), no interior paulista e consultora da SBI, a infectologista Raquel Stucchi concorda. "Na academia, eu ainda não tiro a máscara nem para beber água", brinca. Mas emenda falando bem sério: "Pessoas com maior risco de adoecimento grave deveriam manter as máscaras em ambientes fechados, mesmo se estão adequadamente vacinadas."
Ela explica que, nessa altura, em especial aqueles indivíduos acima dos 50 ou 60 anos já perderam um pouco a proteção conferida pelos imunizantes, aplicados há quatro ou seis meses. "Infelizmente, as vacinas bivalentes, capazes de proteger contra as variantes de ômicron que estão por aí, vão demorar um pouco para chegar. Talvez a gente só as tenha em final de janeiro ou em fevereiro", estima.
Até lá, segundo a professora, máscaras cirúrgicas são necessárias em locais como cinema, exposições... "E na academia, então, nem se fale, porque o número de gotículas expelidas é maior durante o esforço físico, como esse estudo confirma", diz ela, que deixa a dica: "Descarte a máscara que usou para treinar, trocando-a para sair dali."
A gente até se sente um E.T. levando o acessório junto com o squeeze cheio d'água, fazer o quê?! Legal não é. Mas é a hora de todo mundo reconsiderar a máscara para continuar forte em todos os sentidos.
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