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Quem deve tomar reforço da vacina de covid? Entenda a recomendação da OMS
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Telefone sem fio é uma brincadeira perigosa quando se trata de saúde. E, no caso, na ponta final quase ninguém entendeu as conclusões do SAGE sobre o futuro próximo da vacinação de covid-19. Tem gente que até agora está sem saber se, pelo que foi divulgado, terá de tomar reforço neste ano ou não.
Traduzindo, SAGE é o Grupo Consultivo Estratégico de Especialistas em Imunização, criado para ajudar a OMS (Organização Mundial de Saúde) a estabelecer suas recomendações.
Foram quatro dias de discussão intensa que terminaram há exatamente uma semana, no dia 23. E anteontem, quando foram divulgados os highlights do encontro, saltou aos olhos a notícia de que nem todas as pessoas precisariam de mais doses da vacina contra o coronavírus. Pra quê! Armou-se a confusão.
De um lado, a turma carcomida de ignorância ou maldade que, enquanto a ciência aponta lá adiante, prefere engatar a marcha à ré, proferindo pérolas como "finalmente reconheceram que a vacina não adianta". E não é nada disso.
Digo mais: nem sequer haveria a recomendação atual, liberando algumas pessoas de tomar o reforço, se a vacina não tivesse nos tirado de um apuro que, só no nosso país, enterrou mais de 700 mil pessoas.
De outro lado, gente que, diante da perspectiva de não receber uma nova dose do imunizante, fica com medo de terminar desprotegida, correndo risco de vida. E não é nada disso também.
Aliás, houve até quem fantasiasse que estaria acontecendo algo muito diferente para o grupo de experts se reunir a pedido da OMS. Isso não tem pé, nem cabeça: vacinação é coisa tão séria e importante que esse grupo historicamente se reúne pelo menos duas vezes por ano. Surge uma doença nova ali, diminuem os casos de uma infecção acolá, é lançada uma vacina contra determinada infecção e tudo é revisto por esse grupo de aconselhamento. Desde sempre.
E, não, o SAGE não discutiu apenas a situação da covid-19, como se houvesse algo perturbador sobre ela sendo velado. A pauta incluiu a vacinação de sarampo, de tuberculose, de pólio e de malária. E, de quebra, os especialistas refletiram sobre quais seriam os agentes causadores de doenças que mereceriam novos imunizantes.
Portanto, menos. Respire. A coisa é muito mais simples — e, cá entre nós, é aquilo que sempre desejamos ouvir. "Aparentemente, pelo retrato que temos hoje, a pandemia está acabando e a doença está assumindo um caráter endêmico", diz o infectologista Renato Kfouri, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), que esteve na tal reunião representando o Brasil.
A transição acontece porque boa parte da população mundial já tem anticorpos nessa altura do campeonato. Muitos ganharam imunidade porque receberam a vacina. Outros, infelizmente, ficaram doentes. Outros tomaram a vacina e pegaram o vírus — porque, você já sabe, o imunizante não evita a infecção, mas previne o agravamento da doença.
"Esse cenário justifica migrar para um modelo de vacinação parecido com o da gripe, o que implica entender quem faz parte dos grupos mais vulneráveis", explica Kfouri. "Não existe no momento evidência científica de que seja necessário reforçar a vacina na população inteira."
Por isso, em princípio a OMS está dividindo as pessoas em três grupos — o de alto, o de médio e o de baixo risco de ter complicações da covid-19 e até de morrer por causa dela. É preciso entender quem é quem e alguns detalhes a mais.
Se você tem mais de 60 anos
Então, você se encaixa no grupo de alto risco para a covid-19 ter complicações. Aliás, como acontece com a gripe. Portanto, a recomendação é para tomar o reforço da vacina no máximo a cada 12 meses daqui em diante.
Sem importar a idade, se você é uma pessoa imunossuprimida
"Aí, não tem o que discutir: o reforço também deverá ser aplicado, estourando, a cada 12 meses", explica Kfouri. Não se pode confiar que a resposta das defesas seja mais duradoura do que isso nesses pacientes. Daí a necessidade de estimulá-la novamente de tempos em tempos.
Se você tem uma comorbidade capaz de aumentar demais o risco de a covid ficar grave
Crianças, adolescentes ou adultos com menos de 60 anos nessa condição tomam reforço anual. Mas a questão, aqui, é refinar o conceito de quais comorbidades elevariam pra valer a probabilidade de o Sars-CoV-2 fazer grandes estragos. Vale notar que o documento final do SAGE sairá apenas na primeira semana de junho. Paciência.
Se você é profissional de saúde
Então faz parte de mais um grupo cuja recomendação é de reforço a cada 12 meses. Em primeiro lugar porque, cuidando de pessoas doentes, corre maior risco de se infectar. Em segundo, para não faltar profissionais na linha de frente se ocorrer um surto de covid-19 em determinada localidade — o que, atenção, sempre poderá acontecer daqui para frente. Ela veio para ficar.
Se você está grávida
Deve tomar uma dose de reforço se a última vez que se vacinou contra a covid-19 já completou seis meses. Além de gestantes serem grupo de risco, um bom motivo é que os anticorpos da vacina passarão da mãe para o recém-nascido, protegendo-o por tabela.
Se você é saudável e tem menos de 60 anos
Está no grupo de risco moderado. Segundo a recomendação, uma vez que tenha completado o esquema inicial e um reforço — ou seja, que já tenha tomado pelo menos três vezes a vacina —, está dispensado de doses adicionais.
Qual o espanto? "Com a gripe é assim: a gente não faz campanha para vacinar adulto jovem e saudável", compara, mais uma vez, Renato Kfouri. "É claro que ninguém quer ficar gripado e seria bom se todo mundo tivesse a chance de se imunizar contra o influenza. Mas priorizamos quem hospitaliza e morre mais por causa dele, que são cerca de 80 milhões de brasileiros. E, com o Sars-CoV-2, será a mesma ideia", prevê.
Ninguém disse para você não se vacinar!
Este é um ponto que precisa ficar muito claro: o que se debateu a respeito da vacinação de adultos foi a necessidade de reforço ou dose adicional, de acordo com o risco de cada um.
Ninguém colocou um pingo de dúvida sobre a necessidade — repito — das três primeiras doses para quem não pertence a qualquer grupo prioritário, nem questionou a efetividade e a segurança dos imunizantes aprovados.
E como ficam crianças e adolescentes entre 6 meses e 17 anos?
Conforme cada país, essa faixa etária poderá ser até mesmo dispensada da vacinação. Forma, pelo olhar do SAGE, o grupo de baixo risco, mas com a ressalva da própria OMS de que isso é relativo. Teremos, então, de aguardar para ver qual será o posicionamento do Brasil depois de um balanço cuidadoso da nossa situação.
"Não é fácil estabelecer uma recomendação única para os mais diversos países que, afinal, têm realidades muito diferentes", comenta Renato Kfouri. "O risco de uma criança ou de um adolescente morrer de covid-19 no Brasil é entre 10 e 15 vezes maior do que nos Estados Unidos ou no Reino Unido."
Vários fatores são capazes de aumentar esse perigo conforme a região do globo — de acesso ao tratamento e a hospitais ao estado nutricional do jovem, para ficar em poucos exemplos.
A decisão sobre o que será feito em um país ou em outro irá considerá-los, bem como analisar a disponibilidade de vacinas e a carga da doença em cada localidade. Portanto, onde houver poucos casos de covid-19, será mais fácil dispensar a criançada da injeção.
Terei problema se tomar a vacina porque não estou em um grupo prioritário?
Do ponto de vista médico, nada contra. Recomendações como as do SAGE são feitas pensando em saúde pública — por exemplo, no risco de a infecção se espalhar e na questão de custo-benefício — e não na saúde individual,
"Comparando com a imunização da gripe uma última vez, no futuro quem não faz parte de grupos prioritários sempre poderá ir à rede privada se vacinar", explica Renato Kfouri. Evitará, no mínimo, o mal-estar da infecção.
Será que a nova recomendação da OMS valerá para sempre?
Nem todos os experts do SAGE reunidos têm bola de cristal para saber se será assim para sempre. O vírus não irá desaparecer do mapa e ele, como a OMS afirma, "está em constante evolução".
É bastante plausível que, vez ou outra, exploda um surto de covid-19 em determinada região do globo. Então, naquele momento, as autoridades de saúde podem enxergar a necessidade de doses adicionais do imunizante para quem mora ali e estava de fora dos grupos prioritários, por que não?
Entenda que as recomendações são baseadas em um momento congelado no tempo — no caso, no retrato de um mundo com muita gente carregando anticorpos e uma variante que parece pegar um pouco mais leve. Se o vírus mudar, tudo muda.
Para não dar moleza, é preciso fazer o mínimo. As recomendações da OMS são exatamente isso: o "básico 1" para proteger a humanidade da covid-19.
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