Cirurgia de ombro: como um GPS vem guiando a colocação de próteses
O corte de uns dez centímetros na parte da frente do ombro permite ao cirurgião alcançar o osso da escápula e é bem ali que ele irá fixar um dispositivo —que é um navegador, ou seja, um GPS.
Pronto: agora, o médico já pode seguir com a operação para instalar uma prótese no ombro, um procedimento cheio de manobras nas quais, sem saber qual a sua localização exata a cada instante, é possível bater onde não devia. No caso, em nervos ou em vasos mais importantes, existentes aos montes por ali, o que causaria complicações.
"Ou eu poderia, sem isso, colocar a prótese em um ângulo que, por causa de uma diferença milimétrica e difícil de ser percebida sem a ajuda do GPS, faria com que ela se soltasse e saísse do lugar com maior facilidade depois. E ninguém quer isso, claro", diz o cirurgião ortopedista Giovani Manhabusqui Pacífico Jr.
A artroplastia do ombro por GPS começou a ser feita só agora no Brasil. O Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, foi o primeiro a usar essa tecnologia que se baseia em inteligência artificial, segundo Pacífico Jr., que é de lá. Mas logo em seguida, como ele mesmo me conta, outros serviços no Rio Grande do Sul e no Espírito Santo também trouxeram a novidade.
"Tudo começa antes, quando peço para o paciente fazer uma tomografia", explica o ortopedista. "Um software, então, pega as imagens e planeja toda a cirurgia em 3D: o tamanho correto do implante e dos parafusos que eu devo usar, o ângulo exato em que eles precisam ficar e tudo mais."
Quando chega a hora de entrar no centro cirúrgico, Giovani Pacífico Jr. consegue seguir a rota planejada pela inteligência artificial e direcionar seus instrumentos olhando para uma tela que, por sua vez, graças aos sinais do GPS instalado na escápula, mostra exatamente onde está cada coisa. O navegador será retirado assim que tudo estiver no lugar certo. "E, aí, o procedimento termina como qualquer outra cirurgia de ombro", diz o doutor.
Brinco que ele parece fazer balizas naqueles carros em que o painel indica se o motorista, ao dar marcha à ré, está se aproximando demais do automóvel estacionado logo está atrás. Ele ri: "É quase isso." Na verdade, é muito mais complicado.
Não é nada fácil ajustar o lugar de uma prótese — bem menor do que a usada para substituir outras articulações — entre a glenoide, isto é, a pontinha da escápula, e a cabeça do úmero, que é o osso do braço. Ela pode escapulir por qualquer bobagem e, ainda por cima, esbarrar em nervos.
Quando é preciso operar o ombro
A osteoartrose você deve saber o que é: aquele desgaste no osso que começa quando a articulação inflama. É que então, aos poucos, ele degenera. "Nos ombros, o problema é menos comum", esclarece o doutor Pacífico.
Sim, a situação deles é bem diferente da de um joelho ou a de um tornozelo ou, até mesmo, a de um quadril, quando essas articulações inflamam e se desgastam. "No caso dessas outras, a sobrecarga do corpo, especialmente se existe obesidade, faz com que a pessoa sinta o problema mais depressa."
Já os ombros, sem carregar tanto peso, podem suportar o desgaste ósseo calados por um bom tempo. "Talvez por isso a gente não ouça falar tanto de osteoatrose neles", pondera o médico. "Até que chega um momento em que a dor vem com tudo e ela aumenta sempre que o indivíduo tenta movimentá-los." Os movimentos, aliás, vão se tornando a cada dia mais limitados — esta é uma grande queixa.
Não tem nada a ver com aqueles estalidos, que são outra história. E, sossegue, porque às vezes os movimentos encurtados resultam de uma falta de alongamento mesmo. "Mas, para saber se é apenas isso, é preciso passar por consulta", avisa Pacífico Jr.
Quando os médicos constatam um caso de osteoartrose, eles prescrevem sessões de fisioterapia antes de mais nada. "Só depois de três a seis meses tentando essa saída, se não houver resultados, iremos pensar na possibilidade de uma cirurgia", afirma Pacífico Jr.
As causas do problema
Por atrás de ombros que doem quando você mal mexe o braço — isto é, se a osteoartrose é a razão confirmada dessa dor —, pode estar simplesmente o envelhecimento. "Há um desgaste natural das articulações com o passar do tempo", lembra Pacífico Jr.
No entanto, a osteoartrose também pode aparecer em gente mais jovem. "Há uma série de outras causas, secundárias, que podem ser observadas bem mais cedo", diz o médico, que é especialista justamente em ombros e cotovelos.
Entre elas estão os traumas. "O abuso de corticoides também pode levar ao problema nos ombros", acrescenta o doutor. E, embora bem mais raro, outro gatilho seria uma infecção, em decorrência de uma contaminação durante a infiltração para aliviar uma dor, por exemplo.
Vida normal, doutor?
Na manhã seguinte à da cirurgia, o paciente já começa a fazer fisioterapia. E volta para casa depressa — no máximo em um ou dois dias.
Passados uns três meses — e boas sessões com o fisioterapeuta —, ele pode retomar a rotina. Quer dizer... O que não significa que estará liberado para levantar halteres gigantes, erguer objetos muito pesados e carregar o mundo nas costas.
"Em casos assim, nunca será bom forçar demais os ombros, apesar de que essa recomendação irá depender do tônus muscular de cada um. De novo, ao abusar, o risco é de soltura, isto é, de a prótese sair do lugar", avisa o doutor Pacífico, acrescentando, porém, que a nova tecnologia é um avanço enorme no sentido de minimizar a ameaça desse tipo de perrengue.
"Como a prótese e os parafusos são planejados para aquele indivíduo e colocados no melhor ângulo para aquela articulação específica, a qualidade do resultado é muito melhor e tudo se torna mais seguro." Ou seja, embora a cautela mande pegar mais leve, é improvável que surjam novos problemas adiante.
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